O ex-presidente republicano dos Estados Unidos, Donald Trump, foi vítima de uma tentativa de assassinato enquanto fazia comício na Pensilvânia, na tarde do último sábado, 13. A equipe de segurança do candidato à reeleição precisou proteger o presidenciável com uma barreira humana enquanto os disparos seguiam. Um homem foi morto e outro ficou ferido. Trump sofreu um disparo de raspão na orelha direita. 

Momentos após o atentado, a imagem do ex-presidente com o rosto ensanguentado, cercado por seguranças, e com o punho cerrado diante da bandeira norte-americana circulou o mundo todo. No dia seguinte, a opinião pública já acreditava mais firmemente na vitória de Trump, enquanto a imagem do atual Chefe do Executivo do país, Joe Biden, vai abaixo devido às confusões do presidente. 

Dias depois, casas de apostas dos Estados Unidos registraram um aumento nas chances de vitória do republicano. Cálculos feitos pelo site RealClearPolitics mostram que, dois dias após o atentado, a porcentagem para vitória de Trump chegou aos 66%. Enquanto isso, as chances de reeleição de Biden alcançam apenas os 18,3%.

É nesse cenário que se desenvolve a disputa pelo cargo de maior importância em todo o planeta: o atual presidente sendo questionado por apoiadores de seu próprio partido, acusado de ser incapaz de ocupar o cargo, e seu concorrente, ex-presidente, sendo alvejado durante discurso de campanha. Independente do resultado do pleito, é lamentável que a disputa eleitoral da “maior democracia” do planeta se dê sob esses termos.  

A construção de uma narrativa de polarização (onde existe o bem e o mal), a criação de bolhas sociais através das redes digitais (evitando que informações variadas cheguem a todos) e os discursos de ódio que tomaram os palanques norte-americanos (principalmente ligados à imigração) são sinais claros de que o debate democrático não está no centro do jogo. 

Enquanto Biden tentou contato com Trump para expressar seus sentimentos quanto ao episódio de sábado, a cúpula republicana culpou a campanha democrática, que demonizou as atitudes de seu candidato, como um dos incentivos para o ataque.  

Histórico

Vale lembrar que outros atentados a presidentes ou candidatos à presidência estadunidense já aconteceram nos últimos anos. Em 1865, Abraham Lincoln foi morto a tiros por um simpatizante da causa da Confederação (contra a libertação de escravos). Em 1881, o presidente James Garfield sofreu um atentado e morreu em decorrência do ataque. Em 1901, o presidente William McKinley foi assassinado pelo anarquista Leon Czolgosz. Em 1963, John Kennedy foi morto enquanto desfilava em carro aberto pelas ruas de Dallas. Vale lembrar que o irmão de Kennedy, Bob, também foi morto enquanto disputava a presidência do país. 

Além dos políticos que foram mortos, houve tentativas contra vários outros. Ronald Reagan foi baleado em Washington, em 1981; Andrew Jackson, em 1835; Theodore Roosevelt, em 1912; Franklin Delano Roosevelt, em 1945; Harry Truman, em 1950; Richard Nixon, em 1974; Gerald Ford, em 1975; Jimmy Carter, em 1979, e Ronald Reagan, em 1981. 

A violência política marcou a construção da democracia nos Estados Unidos e cabe a nós aprendermos algo com essa trajetória para então pavimentarmos os caminhos da política no Brasil. 

Brasil 

Não raramente, o contexto estadunidense serve de inspiração para o Brasil. Sejam nas leis, sistema econômico, nas expressões idiomáticas, nos aplicativos, na moda, na culinária, no cinema e em tantos outros campos. Não por coincidência, muitas táticas usadas na campanha presidencial de Donald Trump em 2016, foram replicadas pelo então candidato de extrema-direita brasileiro, Jair Bolsonaro, em 2018.  

Coincidentemente, o então candidato à presidência no Brasil em 2018 sofreu um atentado durante uma de suas aparições públicas de campanha. Bolsonaro foi esfaqueado na barriga enquanto estava cercado de apoiadores e seguranças. O autor da facada foi preso e identificado como um militante de esquerda fanático. Neste ano, Bolsonaro foi eleito presidente do Brasil em meio a um discurso de polarização que deu início a uma nova era política no país. 

Os cenários brasileiro e norte-americano mostram mais semelhanças do que se gostaria. A polarização entre ex-presidentes representantes de espectros políticos divergentes, o uso massivo e restrito das redes digitais e a recorrente presença de discursos de ódio nas falas de ambos os lados são sinais de uma democracia minguante. Agora, se adiciona a série de semelhanças o episódio do atentado.  

Debates centrados e equilibrados entre concorrentes, planos de campanha sem ataques diretos a outros candidatos e a preocupação central com o bem estar social deixaram de povoar os palanques da disputa política. O que nos resta questionar é qual a democracia que se constrói sobre bases tão frágeis? Tanto no caso norte americano quanto no caso brasileiro, o poder dar ideias e da construção coletiva do diálogo perdeu espaço para narrativas unilateralmente criadas e propagadas àqueles que acreditam. Resta ao mundo buscar recursos para fortalecer o valor da política e o diálogo republicano entre os atores sociais, assegurando assim a manutenção da democracia tão duramente conquistada ao longo dos últimos séculos.