Ensino superior em pauta: docentes da UFG, UEG e IFG compartilham cotidiano nas salas de aula
23 outubro 2024 às 12h30
COMPARTILHAR
O acesso ao ensino superior representa mais segurança e estabilidade profissional para os brasileiros. Um diploma universitário simboliza uma formação específica mais sólida e garante acesso a espaços de trabalho mais bem remunerados. Existem centenas de instituições públicas e privadas em todo o país que oferecem formação nas mais diversas áreas do conhecimento, seja de forma gratuita, paga ou através de financiamento. Nesse sentido, o Jornal Opção conversou com docentes das instituições públicas de ensino superior em Goiás para entender um pouco melhor a realidade da formação dos novos profissionais do país.
Na UEG
O professor Bruno Moreno, que leciona na Universidade Estadual de Goiás (UEG), conta que houve uma recente valorização da categoria nas últimas negociações com o governo. “Após a aprovação do Plano de Cargos e Salários dos docentes houve a valorização destes trabalhadores”, afirma. Entretanto, esse aprimoramento contrasta com a situação dos servidores técnicos-administrativos, que ainda precisam de revisões nos respectivos planos de carreira. “Há ainda a necessidade de aprovação do Plano de Cargos e Salários dos técnicos-administrativos, bem como o concurso para provimento de novas vagas”, concluiu.
Pensando nos desafios que a instituição de ensino enfrenta, Bruno é categórico ao afirmar: “a universidade ainda não tem autonomia financeira”. A inconstância no orçamento direcionado à manutenção e expansão das atividades da UEG afeta diretamente sua capacidade de crescer. “Para que a instituição amplie seu papel, há a necessidade de maior investimento em pessoal e em estrutura”, afirma. O professor chega a sugerir reserva de parte do PIB do estado para implementação nas instituições de ensino superior estaduais, “como ocorre em outras UFs”.
Apesar dos obstáculos, Bruno se mostra convicto da importância da UEG em Goiás. “O compromisso com a qualidade de ensino e com a formação humana, ética e crítica é basilar da prática profissional dos servidores da instituição”, coloca. Em sua observação, o docente percebe “uma boa inserção dos egressos no mercado de trabalho, bem como o ingresso em programas de pós-graduação”, para além de boas avaliações nos mecanismos oficiais do Ministério da Educação (MEC).
Superando as questões orçamentárias, o professor coloca um segundo desafio diante da Universidade Pública: “há certamente um cenário de descredibilização da educação em diversos níveis de ensino”. Para ele, os ataques simbólicos que determinados grupos políticos fazem à produção das universidades brasileiras “impactam diretamente o papel das escolas e universidades na sociedade”.
No IFG
O professor Weber Tavares, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás (IFG), compartilhou parte de seu cotidiano nas salas de aula. Para ele, a rede federal de ensino superior conta com professores relativamente bem remunerados, com uma carga de trabalho “adequada”, e “bons estudantes”. Entretanto, quando o assunto é infraestrutura, ele aponta “uma série de déficits que foram muito agravados a partir do fim do governo Dilma”.
O docente coloca que, durante os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro, houve uma série de cortes no orçamento que impacta diretamente na qualidade da infraestrutura das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES). Além disso, focando especialmente no mandato de Bolsonaro, o professor denuncia uma prática declarada de ataques às universidades federais.
Leia também: UFG recebe evento com apresentações gratuitas de violino e piano na próxima semana
Com nota 4, UEG é recredenciada para oferecer cursos pelos próximos 10 anos
Weber relembra a passagem de cinco ministros da educação no intervalo de quatro anos, afirmando que todos eles tinham como programa “desconstruir a ideia de que a universidade pública, em especial a universidade federal, é uma boa escola”, reforçando o depoimento de Bruno da UEG. O professor chega a lembrar que, em certa ocasião, o então chefe da pasta, ministro Abraham Weintraub, chegou a dizer em rede nacional de televisão que nas IFES não se produzia nada, que as universidades estavam cheias de “Balbúrdia”.
“A maior parte da pesquisa que existe no Brasil é feita dentro da universidade federal”, lembra o professor, ao dizer que o principal desafio do ensino superior público brasileiro é “se posicionar junto à sociedade para mostrar seu valor”.
O professor comemora a troca de governo e o subsequente incremento no orçamento correspondente, mas diz que ainda há muita luta pela frente a fim de alcançar a situação ideal. “A partir de 2023, a gente percebe alguma recomposição dos orçamentos que têm impacto direto sobre infraestrutura, entretanto ainda está muito aquém do que é necessário”, lamenta.
Sobre a questão da aprendizagem, ele comemora o contexto das IFES. Elogiando a atuação dos estudantes, que passaram por rigoroso processo de seleção, ele afirma: “A gente tem bons estudantes e isso acaba impactando favoravelmente no desenvolvimento do processo ensino aprendizagem”.
Por fim, o docente rebate um mito que circula na comunidade geral sobre a queda na qualidade da produção acadêmica após a implantação do regime de cotas. “A quem diga equivocadamente que o advento da lei de cotas, que faz reserva de 50% das vagas para estudantes oriundos de escola pública, reduziu ou teve impacto negativo na qualidade dos estudantes, o que é uma grande bobagem”, afirma.
O professor Weber conta que o “altíssimo nível de concorrência” para ingressar no ensino superior público garante que, tanto nas instituições privadas de preparação para vestibular quanto nas públicas, só os estudantes mais capacitados e dedicados conseguem ingressar, garantindo qualidade na produção e formação acadêmica.
Na UFG
Da mesma forma que Bruno, o professor Glauco Gonçalves da UFG defende investimentos mais estáveis nas instituições de ensino como forma de aprimorar a produção de conhecimento nesses ambientes. “Desde 2016, o orçamento destinado às universidades federais e aos institutos federais de educação vem minguando ano a ano”, afirma. A certeza de um orçamento anual permite às universidades investir em pesquisas e laboratórios mais complexos, garantindo maior retorno à sociedade.
“O ensino público gratuito das universidades federais logra êxito inquestionável na formação de profissionais e devolve a sociedade brasileira com custos muito baixos profissionais muito bem qualificados”, sintetizou.
Para além da questão orçamentária, mais concreta, existe a disputa simbólica que envolve a universidade, que também se coloca como um desafio para toda a comunidade acadêmica.
Colega de Glauco, o docente Rafael Miloni Santucci traz de volta um desafio das universidades e institutos públicos perante a sociedade: reforçar a validade de sua atuação. Se referindo aos ataques proferidos às IFES nos últimos dois governos, ele afirma que se “há um terreno fértil para que as pessoas mal intencionadas levantem mentiras sobre o meio acadêmico, é porque deixamos isso acontecer trabalhando feito loucos dentro de laboratórios, em uma competição que não terá vencedores”.
Glauco lembra que a UFG foi extremamente atuante durante a pandemia de covid-19, possui atendimento direto ao cidadão no Hospital das Clínicas, trabalha com centenas de crianças da comunidade no colégio de aplicação da universidade, realiza dezenas de projetos de extensão em todo o estado, além de formar centenas de profissionais qualificados anualmente.
Seja para garantir a manutenção do funcionamento da instituição de ensino, seja para ampliar as pesquisas e produções na unidade, ou para aprimorar as políticas de permanência estudantil, tanto Rafael quanto Glauco reforçam a importância de uma estabilidade orçamentária. “Mais uma vez a gente está falando da garantia de recursos”, lamenta Glauco.