Odebrecht e JBS “criaram” um sistema de financiamento público de campanhas eleitorais

27 maio 2017 às 11h22

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Clama-se pelo financiamento público, que reduziria o abuso do poder econômico, mas as delações premiadas revelam que, indiretamente, o governo está bancando as campanhas eleitorais

Há um aspecto das delações premiadas da Odebrecht e da JBS pouco ou nada realçado pela Imprensa e pela Procuradoria-Geral da República: o financiamento público, ainda que informal e indiretamente, havia sido instituído no Brasil, num conluio entre políticos e empresários.
A empreiteira Odebrecht, dirigida pela família de Emilio e Marcelo Odebrecht, e o grupo JBS, comandado pelos irmãos Joesley e Wesley Batista — sob o olhar do pai, José Sobrinho Batista, o Zé Mineiro —, cresceram à sombra dos governos, de maneira mais acentuada nos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, do PT. A primeira não é, porém, “neta” do petismo, pois ganhou dinheiro, até muito dinheiro, em vários governos, dos militares aos dos tucanos. As duas se tornaram altamente capitalizadas — com forte presença no exterior — devido às facilidades tanto no BNDES quanto na Caixa Econômica Federal.
Se o dinheiro que irrigou os cofres e as ações da Odebrecht e da JBS — e nem se está mencionando a Andrade Gutierrez, a OAS e a Delta Construções — era, em larga medida, público, pois o BNDES é propriedade do Estado e dos cidadãos brasileiros, e as duas empresas repassavam dinheiro para políticos patrocinarem suas campanhas eleitorais — e, no meio do caminho, enriquecerem-se —, o que se deve sublinhar, sem receio de equívoco, é que constituiu-se no Brasil um poderoso e dispendioso sistema de financiamento público de campanha.
Clama-se que, para conter o poder econômico, é preciso instituir o financiamento público de campanha. As planilhas da Odebrecht e da JBS indicam que políticos de vários partidos — até do espartano PC do B (cujos políticos não têm a tradição da desonestidade financeira e tendem a aplicar o que arrecadam nas campanhas de seus candidatos) — receberam dinheiro de seus cofres. O que está errado ou quase errado na frase? O pronome possessivo “seus”. Porque, na realidade, o dinheiro, ou a maior parte dele, trafegava do setor público para as empresas e destas para os políticos teoricamente organizarem suas campanhas eleitorais e, claro, locupletarem-se.
Numa avaliação decente, uma obra deveria custar 50 milhões de reais, mas, para beneficiar políticos de vários partidos — PT, PMDB, PSDB, PC do B, PP, PR, entre outros —, a obra passava a custar, sem ou com aditivos, cerca de 100 milhões de reais ou até muito mais. Das “sobras”, e não dos lucros da Odebrecht e da JBS, eram retirados o dinheiro para propinar políticos que, a rigor, eram (e são) também lobistas altamente profissionais. A rigor, as duas empresas propinavam políticos com dinheiro não delas — pois sua margem de lucro, sempre alta, era preservada —, e sim dos contribuintes.
No Brasil, os partidos são mantidos, em tese, pelo Fundo Partidário. Tal estrutura financeira não é leve para a sociedade e tem gerado uma onda de corrupções em alguns partidos, sobretudo nos médios e menores. Comenta-se que o Pros deveria ser chamado de Pró, quer dizer, Pró-família de Eurípedes Júnior, seu presidente. Os partidos são criados como negócios rentáveis e não apenas para disputar eleições e representar os cidadãos.
Pois, não contente com o Fundo Partidário, o deputado federal Vicente Cândido, do PT de São Paulo, propõe um fundo para financiar as campanhas eleitorais com dinheiro público. Noutras palavras, os políticos querem “sangrar”, sempre mais, os cofres do governo federal, dos contribuintes. Vale o que se escreveu acima: o financiamento público de campanhas eleitorais existe há muito tempo. É público, notório e corrupto. Como poderia frisar Emilio Odebrecht, misto de realista e Pangloss, só não percebe quem não quer. Os políticos, maliciosa e interessadamente, não querem. Mas, você, contribuinte e leitor deste Editorial, fique atento. Afinal, o dinheiro que torram nas campanhas eleitorais é seu, não é do governo, não é dos políticos, não é dos empresários. É de todos os brasileiros. Insistamos, é seu.