Marconi Perillo agrega e Júnior Friboi desagrega
03 maio 2014 às 09h56
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O empresário Júnior Friboi atropelou e humilhou Iris Rezende, líder histórico do PMDB, mas exige o seu apoio. Na situação, Marconi preocupa-se em preservar a base e em ampliar sua aliança
Não há nenhuma dúvida: o empresário Júnior Friboi, para se tornar candidato a governador de Goiás pelo PMDB, atropelou o líder histórico Iris Rezende pelo menos duas vezes. Primeiro, quando se filiou ao partido sem consultá-lo. O ex-sócio do grupo JBS, que detém a marca Friboi, chegou pelo “alto” — praticamente imposto pela cúpula nacional, quer dizer, pelo vice-presidente da República, Michel Temer, e pelo presidente nacional do PMDB, Valdir Raupp. Segundo, ao desafiar o ex-governador, apresentando-lhe evidências de que, controlando a maioria dos delegados, o venceria tanto numa prévia quanto na convenção. Isto fez com que Iris desistisse de tentar ser candidato a governador.
Dados os dois atropelamentos, Iris está “ferido”, assim como seus aliados mais próximos estão descontentes com Friboi, com o que chamam de “métodos pouco católicos” de conquistar apoio. Mesmo sabendo que Iris está “machucado” — porque está sendo “retirado” da política não por um adversário de outro partido, como o governador Marconi Perillo (PSDB), mas por um suposto aliado —, o friboizismo espalha, por intermédio de várias vozes, que, se for mesmo partidário, o ex-prefeito de Goiânia tem a obrigação ou dever de apoiar Friboi para o governo. Acredita-se, mesmo entre os friboizistas mais radicais, que Iris tem de ser candidato a senador, para impulsionar a candidatura do empresário. É a primeira vez que aquele que foi humilhado tem de “salvar” o responsável pela humilhação.
É improvável que Iris cruze os braços — até porque tem compromisso com alguns candidatos a deputado estadual e federal que lhe são leais. Porém, mesmo se apoiar Friboi, o que pode acontecer — há quem acredite que o pré-candidato do PT, Antônio Gomide, o entusiasma mais —, Iris não estará, possivelmente, motivado. Político já não transfere voto com facilidade mesmo quando motivado. Sem entusiasmo, a transferência é quase nenhuma. Sabe-se que as críticas de Iris a Friboi, as veladas e as mais objetivas, serão utilizadas na campanha contra o empresário. Ninguém deixaria de usá-las, porque Iris, mesmo atropelado e sufocado, permanece, no imaginário popular, como o principal político do PMDB. Paradoxalmente, Iris pode ser uma “arma” a ser utilizada por Marconi contra Friboi.
O que, de repente, entusiasmaria Iris? Ganhará seu voto aquele que fizer uma campanha crítica e dura contra o governador Marconi Perillo. Um de seus aliados mais fieis sugere que, no momento, o irismo tem percebido não Friboi como crítico mais contundente do tucano-chefe, e sim Vanderlan Cardoso. Porém, o candidato do PSB não entusiasma Iris nem política nem ideologicamente. Setores do irismo avaliam que Gomide, embora não esteja se posicionando com dureza em relação ao governante tucano, pode ser o nome para confrontá-lo. Não se acredita, aparentemente, que Friboi, dados os problemas do grupo JBS — dívidas, problemas com impostos, ações trabalhistas, cartel da carne (o que afeta maciçamente os pecuaristas goianos) —, tenha condições de enfrentar um debate cerrado com Marconi. Entretanto, numa das conversas, Friboi garantiu a Iris que vai fazer oposição “agressiva” ao líder tucano. Até agora, suas críticas têm sido vistas como cosméticas, pueris, panglossianas.
Não há prova material de que Friboi tenha “comprado” vários líderes do PMDB. Portanto, é temerário dizer, e até sugerir, que peemedebistas de proa — como Pedro Chaves, Leandro Vilela, Daniel Vilela, Sandro Mabel, Marcelo Melo, entre outros — “venderam” seu apoio ao empresário. Ao jornalismo cabe apresentar provas, mas, no caso, não há provas. Mas sabe-se que Iris teme, se hipotecar apoio a Friboi, ficar com a imagem de que “também” se vendeu. Concluir a carreira política, depois de ter sido governador de Goiás duas vezes e prefeito de Goiânia três vezes, além de senador e ministro do governo federal, como vassalo de Friboi nada acrescentará à biografia de Iris. Ao contrário, a deslustrará. Portanto, o decano peemedebista está numa encruzilhada. Se ficar “free”, mantém e preserva a bela biografia. No entanto, se ficar “boi”, para atender interesses imediatos, mais de aliados do que seus — Iris Araújo, para se eleger deputada federal, não precisa nem dos votos nem do dinheiro, supostamente farto e gordo, de Friboi —, tende a sair com a biografia, senão manchada, levemente arranhada.
Quanto a Friboi, depois de fazer o impossível para “aposentar” Iris, numa campanha devastadora nos bastidores, notadamente no interior do Estado, resta-lhe entender duas coisas. Primeiro, é muito mais difícil convencer os eleitores, cada vez mais independentes das forças políticas, do que militantes partidários, da cúpula ou da base. Aqueles são autônomos e críticos, abominando tentativas de controle político e “compra” de apoios e votos. Os militantes às vezes são regiamente pagos — uma legião mercenária, por assim dizer. Porém uma coisa é certa: ao retirar Iris de seu caminho, mesmo deixando feridas difíceis de cicatrizarem, Friboi provou que o político amador cedeu lugar a um político voraz e feroz — sem limites. O empresário não está para brincadeira — é o seu recado. Está disposto a jogar “pesado” para tentar se eleger.
Mas, se um político precisa vencer inclusive aliados, como Iris, para firmar-se, deve também, e sobretudo, saber agregar. Até agora, o empresário tem desagregado mais do que unido — que o digam Iris Rezende, Iris Araújo, Wagner Guimarães (que não vota em Friboi para governador), Ivan Ornelas (que não tem nenhuma simpatia pelo empresário) e muitos outros.
Marconi agrega
Se Friboi desagrega, afastando não qualquer um, mas o principal político do PMDB, Iris, o governador Marconi Perillo percorre o caminho inverso. O tucano-chefe comanda uma base ampla e, portanto, complicada. De longe, parece inteiramente coesa. De perto, há rachaduras evidentes. O que mantém a base unida, além do governo em si — que gera poder, cargos — é o próprio Marconi, que, ao longo do tempo, tornou-se um gestor e político que maximizou sua capacidade de agregar.
No momento, há conflitos na base, pois o vice-governador José Eliton, do PP, é contestado por alguns grupos, porém, mesmo assim, luta, com unhas e dentes, para manter-se na chapa majoritária. Aqui e ali, diz-se que é provável que seja candidato a governador — caso Marconi desista da reeleição, o que parece inteiramente impossível. Como, de repente, Eliton montaria uma chapa majoritária? Quem seria seu vice e quem aceitaria ser seu candidato a senador? Difícil até de imaginar. Portanto, Marconi disputará, sim, a reeleição; se não fizer, o tucanato pode perder sua base e, pior, o governo de Goiás.
Se José Eliton, advogado de rara competência e político de extremo valor, ainda que não amadurecido por lutas políticas reais — nunca disputou mandato de vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal, senador, governador, e nem mesmo concorreu a uma eleição para síndico de edifício —, desagrega, mais porque é rejeitado por setores da base e menos por ser político de baixa qualidade, Marconi tem procurado agregar os aliados atuais e conquistar novos aliados.
Governador pela terceira vez, Marconi poderia ficar no pedestal, cobrando apoio irrestrito de aliados que, de algum modo, foram beneficiados por suas gestões. Pelo contrário, o tucano tem procurado os aliados e possíveis aliados com humildade e largueza de visão. Ao mesmo tempo que, no governo, tem procurado ser mais gestor do que político — fala-se, aqui, do político tradicional, tipicamente populista — , Marconi está conversando, diretamente, sem intermediários, com políticos e integrantes da sociedade organizada. Até aliados que se afastaram, como o deputado federal Armando Vergílio (Solidariedade), têm sido procurados para conversas sinceras. Quando não há o resgate político, para manter a aliança, Marconi, falando como indivíduo, tem procurado resgatar e preservar a amizade ou a relação civilizada. O que se vê, nos bastidores, é um Marconi mais amadurecido e tolerante, evitando pugnas gratuitas e correndo de mexericos e picuinhas.
Quanto ao deputado federal Ronaldo Caiado, aliados de José Eliton, plantados em vários lugares, dizem que Marconi quer distância do presidente do partido Democratas. Não é bem assim. Na verdade, não se dispensa o apoio de um político como Caiado. O que Marconi não quer, se se aliar com o líder do DEM, é desagregar sua base. Porém, se for do agrado da base — se esta avaliar que a aliança com Caiado é importante para a obtenção de sua quinta vitória para o governo —, o tucano não vai hesitar em compor.
O que Marconi tem sugerido, mais do que dito, é que alianças precisam ser verdadeiras, conectadas. Uma aliança que não seja crível, com um político distante do outro, certamente será mal avaliada pelos eleitores. Caiado estaria disposto a uma união verdadeira, quer dizer, para ser apoiado para senador, na eleição de 5 de outubro deste ano, apoiaria, com firmeza, a reeleição do tucano-chefe? Apoio pela metade não é apoio e gera desconfiança. O eleitor quer que a política volte a ter grandeza e deixe de ser vista como um negócio. Por isso, Friboi deve ter muito cuidado, porque, na campanha, longe de “alvejar”, pode se tornar o grande alvo dos adversários e, essencialmente, dos eleitores.