Jogo político para 2018 começou e é incontornável, mas recuperar a economia é mais relevante
11 março 2017 às 11h45
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Temer, Lula, Marina, Alckmin, Bolsonaro, Eliton, Daniel e Caiado estão de olho na disputa do próximo ano. Mas, para a sociedade, o crescimento da economia é mais importante
Quando as ideias estão fora do lugar é muito difícil recolocá-las. Por vezes, é impossível. No século 19, o dos luminares Machado de Assis e Joaquim Nabuco, o Brasil tinha políticos e empresários que, mesmo sendo liberais, tinham escravos ou ao menos não eram críticos enfáticos da escravidão (nos Estados Unidos, um dos mais importantes apóstolos da liberdade, o presidente Thomas Jefferson, mantinha escravos em sua propriedade). Como combinar a defesa da liberdade num sistema que é baseado na força de trabalho escrava? Resulta-se que, naquele século, o liberalismo, nos tristes trópicos, era uma ideia fora do lugar, ou deslocada. Mas o que se diz é uma condenação dos liberais ou de todos os liberais? De maneira alguma. Vários liberais eram contrários à escravidão e lutaram abertamente para aboli-la.
Pode-se dizer que a discussão das eleições de 2018, em proporção diferente, é uma ideia fora do lugar? Não exatamente. Mas não há nada mais importante, no momento, do que recuperar a economia do país, a retomada de sua capacidade de investimento — que começa a ocorrer, embora a imprensa ainda não seja pródiga em reportagens a respeito. Há quem torça contra a recuperação da economia porque supostamente pode beneficiar o presidente Michel Temer, do PMDB, e prejudicar um possível retorno do ex-presidente Lula da Silva, do PT. Ora, em termos de país, dos mais de 10 milhões de desempregados — que sofrem todos os dias, ao lado de suas famílias, sem saber a quem recorrer —, Michel Temer e Lula da Silva são gotas d’água no oceano. Como passarinhos, ambos passarão. À sociedade, que engloba do povão ao bilionário, o que interessa mesmo é um país com sua economia restaurada. Os que torcem pela queda de Michel Temer o fazem, em geral, não exatamente por seu suposto envolvimento com a Operação Lava Jato — há evidências, mas não inteiramente precisas —, e sim por uma questão ideológica. Depois da queda de uma esquerdista, Dilma Rousseff, do PT, a defesa da queda de um político de centro-direita, como Michel Temer, está na ordem do dia, como se fosse uma espécie de contrapeso. Em suma, não estão defendendo o esfolamento político de Michel Temer por causa da Lava Jato, e sim por uma questão ideológica e, portanto, para que se iguale o jogo político.
Posta a questão de que seminal mesmo é a recuperação do país, o que dizer da antecipação do processo eleitoral? Trata-se de uma ideia fora do lugar? Sim e não. Sim, porque pôr a ideia no lugar é propor o reordenamento da economia. Não, porque, contra a força da correnteza, às vezes não há como remar. O que se deve fazer, quando possível, é entender o quadro do que está acontecendo.
Tornou-se habitual sugerir que o desdobramento da Lava Jato vai decidir os nomes dos candidatos a presidente da República em 2018. Pode até ser, ao menos nos casos dos políticos mais comprometidos. Porém, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, disse que, mesmo se envolvido na Lava Jato, direta ou indiretamente, Michel Temer poderá ser candidato a presidente em 2018. Como?! Ora, respeitando-se a lei. Se o processo estiver em julgamento, ou em fase de recurso, não estará provada, em definitivo, a culpa. Suspeição e mesmo acusação não são sinônimos de culpa fixada.
O que o gabaritado Gilmar Mendes assinala a respeito de Michel Temer também serve para candidatos a governador, senador e deputado federal. Muitos políticos serão citados pela Operação Lava Jato e só por isso poderão ter suas histórias pessoais destroçadas, mas é provável que, ao final dos processos, alguns deles sejam absolvidos. Por isso, mesmo que se tenha ira contra a corrupção — há quase uma possessão coletiva —, é preciso ter cautela. Lula, por exemplo, não deve ser tratado como criminoso. Ainda não o é.
Quanto aos pré-candidatos a presidente da República, é possível sugerir, a partir de um quadro nebuloso, quais são mesmo os favoritos? Talvez não. Mas falemos um pouco a respeito de alguns deles.
Michel Temer anota que prefere ser impopular a ser populista. O presidente está dizendo que, para recuperar a economia do país, está adotando medidas que não são populares. Se quisesse ganhar votos, além do aplauso coletivo, bastaria divulgar medidas pró-consumo, como, durante algum tempo, os governos do PT, tanto os de Lula da Silva quanto os de Dilma Rousseff, fizeram sem cerimônia. Entretanto, se colocar a economia no eixo, iniciando a retomada do crescimento, tende a se consagrar? Talvez sim. Talvez não. Sim, se o país conseguir compreender o que está fazendo e o que terá feito ao final do mandato (considerando, claro, que suas medidas tenham resultado em expansão econômica, que, frise, começa a ocorrer, ainda que lentamente). A ética da responsabilidade num país impulsivo — em que as emoções são fortes e dominantes e os julgamentos são peremptórios, raramente nuançados — nem sempre tem acolhida razoável. Não, se a sociedade entender que, apesar da importância do que fez, ainda é pouco. A impressão que se tem é que os brasileiros estão exigindo de Michel Temer aquilo que nunca exigiram dos petistas.
O fato é que, se a economia crescer, com recuperação de empregos e geração de novos empregos, Michel Temer será um player político.
Na falta de alternativa, porque Michel Temer ainda não se tornou “confiável” para a maioria — trata-se de um democrata dos mais tolerantes, mas sua imagem bacharelesca desagrada a sociedade, e não só os jovens —, Lula da Silva é uma das alternativas político-eleitorais mais consistentes. Se não for “agarrado” pela Operação Lava Jato — seja com prisão ou com condenação com cumprimento da pena em liberdade —, o petista-chefe, lembrado pelos tempos de bonança do país, será um candidato que dará trabalho para todos os outros.
Marina Silva, da Rede, é outro nome, eleitoralmente, consistente. Porque é vista como, pessoalmente, incorruptível. Pode aparecer alguma coisa? Pode. Mas, diferentemente de Lula da Silva — com os simbólicos tríplex do Guarujá e o sítio de Atibaia —, não há nada de grave que manche sua imagem de maneira integral. Paradoxalmente, uma das pedras no seu caminho é Dilma Rousseff. Por que as duas são mulheres? Não. A queda da petista não tem a ver com fracasso feminino. Sublinhe-se a competência e a integridade de Cármen Lúcia na presidência do Supremo Tribunal Federal. O problema, se é um problema, é que Marina Silva, com seu estilo aparentemente avesso à negociação política, não difere da gestora que sofreu impeachment. Mas não é possível desconsiderar que a líder da Rede tem apelo eleitoral num período em que se cobra (mais) ética na política.
Se puder ser candidato, e do ponto de vista do quadro atual, o nome mais consistente do PSDB é o do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Porque faz um governo que, mesmo na crise, não permitiu que, ao contrário de Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro, o Estado mais rico do país soçobrasse. Há, claro, a incontornável Lava Jato. Se a operação tragá-lo, ao lado de Aécio Neves e José Serra — este, parece alquebrado, e não só devido aos problemas em sua coluna —, o que sobrará para contar a história? É provável que, sem Geraldo Alckmin, o tucanato tente emplacar o prefeito de São Paulo, João Dória — cujo perfil, a rigor, não é muito diferente do de Michel Temer, com uma ressalva: comunica-se muito bem. João Dória é um homem do século 21 que fala para o homem do século 21. Michel Temer é um homem do século 21 — sua paciência e tolerância são proverbiais —, mas com pose, corpo não flexível e fala do século 19. Parece mais um aristocrata empertigado do que um burguês charmoso. Pessoalmente, dizem, é cativante e, até, sedutor. O governador de Goiás, Marconi Perillo, é outra alternativa. Porque, a rigor, é um João Dória com experiência política e de gestão pública.
Ciro Gomes (PDT), com seu perfil de Fernando Collor de centro-esquerda, pode tentar representar um papel político — o de populista de matiz técnico. O “drummond” no meio de seu caminho talvez seja o vezo autoritário. Se ouvisse (num ensaio clássico, a historiadora Barbara Tuchman assinala que, a partir de determinando momento, os políticos não ouvem mais) experts, daria uma moderada no seu discurso e se tornaria mais empático. Jair Bolsonaro é o típico político que sempre será eleito para o Parlamento, mas dificilmente será eleito para presidente da República. O eleitorado patropi até vota num Fernando Collor, mas não é praxe, porque prefere políticos mais moderados e tolerantes para o Executivo. A maioria das pessoas não é revolucionária e eleger Bolsonaro para presidente seria uma revolução — uma mudança brusca.
Em Goiás
O quadro em Goiás é muito diferente do nacional? Não é. Com a ressalva de que há nomes postos e, até, mais definidos. O PSDB tende a bancar o vice-governador, José Eliton, para o governo em 2018. O PMDB vai apostar no deputado federal Daniel Vilela ou em seu pai, o ex-governador Maguito Vilela. Não há outro nome. O DEM vai lançar, possivelmente, o senador Ronaldo Caiado. A senadora Lúcia Vânia, se excluída da chapa majoritária bancada pelo PSDB, pode ser a alternativa do PSB para o governo. Pode surgir outro nome, como o de Thiago Peixoto, do PSD. Mas o quadro está praticamente definido.
O que não se pode dizer, dado o fato de que alguns dos pré-candidatos ainda são desconhecidos da maioria dos eleitores, é que os favoritos já estão definidos. Porque não estão. O que se pode dizer é que, no momento, todos os grupos estão fazendo seus jogos, pressionando como podem para ocupar papeis centrais, por exemplo, na chapa majoritária. Tencionar é um dos exercícios da política.