Iris e Friboi podem ser os principais eleitores do tucano Marconi Perillo
17 maio 2014 às 14h37
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Iris Rezende está municiando o tucanato com críticas cortantes a Júnior Friboi. Este não pode contra-atacar, pois é refém da popularidade do líder histórico. Como convencer
Vanderlan Cardoso e Antônio Gomide a compor se o PMDB não tem um candidato?
“Nunca tive um amigo que não pudesse tornar-se um inimigo ou um inimigo que não pudesse tornar-se amigo.” Getúlio Vargas
A pressa do jornalismo diário não permite que se apreenda de maneira precisa ou ampla o que os entrevistados dizem. Na quinta-feira, 15, “O Popular” entrevistou o ex-prefeito de Goiânia Iris Rezende, que pretende ser candidato a governador pelo PMDB. Mas o editor e o repórter, se disseram que o peemedebista quer postular a eleição em 5 de outubro deste ano — óbvio tão ululante que até o “espírito” do dramaturgo Nelson Rodrigues sabe do que se trata —, não perceberam a fala mais decisiva do decano da política goiana: “Acho que, se um dia eu fosse disputar uma eleição marcando passo com alguém com dinheiro, estaria negando tudo que já preguei ao longo da minha vida”. O que Iris disse nas linhas e nas entrelinhas?
Não há dúvida de que, embora seja um mestre na manipulação das palavras, para que seja mantida a ambiguidade típica do político, Iris, no caso, é quase explícito. Ele está dizendo, mais do que sugerindo, que, se apoiar o dolarizado Júnior Friboi — o político que supostamente tem entre 250 milhões e 500 milhões para torrar na campanha — para governador, na eleição de 5 de outubro deste ano, estará “negando tudo que” pregou “ao longo da” sua “vida”. É um recado com endereço duplo. Primeiro, para o ambiente interno, que estaria grudado firmemente no “bolso” do empresário. O líder histórico recebeu informações, por certo, de que há pré-candidatos a deputado federal e a deputado estadual que dizem, às claras, que, se Friboi não for candidato a governador, também vão retirar suas postulações. Alega-se que não se trata de nada contra Iris. O que eles querem é a estrutura que Friboi promete proporcionar. Segundo, para o público externo. Iris está dizendo à sociedade que seu partido, o PMDB, não quer deixá-lo disputar, mas que ele quer, sim, ser candidato a governador de Goiás. É um recado direto, sem firulas, para as pesquisas espontâneas de intenção de voto.
Os luas-bois recomendaram que Friboi e aliados não se manifestem, pelo menos não de maneira agressiva e desrespeitosa, como se fosse um contra-ataque. Friboi não pode atacar Iris, porque, ao fazê-lo, estaria cometendo suicídio político. É muito melhor ter um Iris desmotivado do que ter um Iris como adversário, talvez até inimigo, na campanha. “Iris nunca esquece”, frisa um deputado. Mas pelo menos um deputado e um ex-deputado disseram ao Jornal Opção que estão coçando a língua para responder o que chama de “diatribes” de um político amadurecido que estaria se “comportando como prima donna” e “é o freguês eleitoral preferencial de Marconi”. Friboi e o deputado federal Pedro Chaves (PMDB) sempre pedem calma. Eles acreditam que Iris vai espernear, porém, como não tem mais o controle do partido — que, de fato, foi subjugado (e supostamente é subvencionado) por Friboi —, acabará por ceder, aceitando disputar o Senado. A aliados, aqueles que frequentam seu escritório político, Iris tem dito que não quer e não vai disputar o Senado. Ele não teria mais paciência para ficar o dia inteiro no Congresso Nacional — às vezes debatendo o “sexo dos anjos”. O peemedebista é objetivo e pragmático. É político vocacionado para o Executivo.
Friboi, com a cautela de empresário que está pisando em terreno minado e relativamente desconhecido, o da política, disse que vai ser candidato de qualquer maneira, exceto se perder na convenção. Noutras palavras, está dizendo que não tem qualquer receio de Iris e disputa com o líder histórico — mais de meio século na política — na convenção. Por que disputa? Porque tem certeza, não se sabe se dolarizada — não há, até agora, nenhuma evidência de que o empresário está “comprando” apoio, apesar das insinuações até de peemedebistas —, que vence Iris. Entretanto, embora seja um neófito em política, Friboi nada tem de bobo ou ingênuo. Sabe que derrotar Iris seria uma vitória de Pirro. Mesmo que o encanecido peemedebista decidisse apoiá-lo seria uma ajuda pro forma, desmotivada, sem alma.
Os jornais não estão dando publicidade ao fato, pelo menos não de modo explicíto, mas, enquanto Iris e Friboi mandam-se recados, tanto pela imprensa quanto por emissários, os recados que os eleitores estão assimilando podem não ser nada agradáveis, em termos políticos, para os dois contendores. Os eleitores percebem que há uma luta surda para ser candidato, mas ninguém sabe, para além das críticas que fazem ao governo de Marconi Perillo, do PSDB, quais são suas ideias para continuar a modernização de Goiás. O PMDB está trabalhando, do ponto de vista da sociedade, com duas agendas negativas — sem perceber que o eleitor quer conhecer muito mais a sua agenda positiva. A primeira agenda negativa é a briga interna. O que se está dizendo é: Friboi deve ser candidato porque tem dinheiro e Iris não será candidato porque, segundo um deputado do PMDB, tem uma cascavel no bolso em que guarda a carteira. A segunda agenda negativa é falar mal o tempo todo do governo Marconi e, ao mesmo tempo, de Goiás. Fica-se com a impressão de que tudo que se faz em Goiás é ruim — o que certamente choca, para ficar num exemplo, os empresários que investem no Estado porque o consideram progressista e cada vez mais avançado. A agenda positiva, que é a apresentação de propósitos críveis — a sociedade está cansada de diagnósticos empobrecedores sobre segurança pública, educação e saúde —, tem sido esquecida ou negligenciada.
Eu te veto e tu me veta
O que se depreende é que no PMDB há uma luta surda pelo poder, mas não é uma batalha de ideias e não tem como objetivo a melhoria do Estado. É o poder pelo poder. Não se está falando mal, e não haveria por quê, de Iris e Friboi. O que se está dizendo é que a sociedade está observando cuidadosamente o que estão falando um do outro. Aqui e ali, nos bastidores, escapa uma fala de um friboizista que considera Iris como “superado”, “velho”, “alquebrado” e “advogado de apenas dois projetos: o governo para si e um mandato de deputado federal para sua mulher, Iris Araújo”. “No PMDB é assim: é Iris [Rezende] e Iris [Araújo]. O resto é… o resto”, afirma um deputado que não se apresenta como anti-irista.
Se Iris veta Friboi para o governo e se Friboi veta Iris para o governo, o que pensar dos dois políticos? O óbvio: os dois peemedebistas não se aprovam. Um, Iris, avalia que o outro, Friboi, não está qualificado para gerir o poder público e que dinheiro não pode tudo. O outro, Friboi, embora não explicite isto em palavras públicas, avalia Iris como “superado”, como “um homem do passado”, uma espécie, como afirma um prefeito, de “bananeira que já deu cacho”.
Paradoxalmente, embora desconfiem das qualificações um do outro, Iris aceita Friboi como vice e Friboi aceita (e precisa de) Iris como candidato a senador. O recado subliminar, diria um publicitário ou um psicólogo é: para o governo, nenhum serve. Agora, ante as críticas, e se o eleitor acabar pensando o mesmo?
A quatro meses das eleições — apenas 120 dias, com o agravante da Copa do Mundo de Futebol, que vai tornar a disputa ainda mais curta —, embora não esteja morto (o partido é respeitado e forte no Estado), o PMDB está cristalizando a imagem, verdadeira, de que não tem candidato e, sobretudo, de que não consegue lançar e bancar um candidato a governador.
Na semana passada, numa nota, um repórter do Jornal Opção criou a seguinte imagem: “Pegue um pires de louça quebrado. Mande um especialista [um restaurador] colá-lo. O pires poderá ser usado, mas as marcas do quebrado — as rachaduras — permanecerão. Indeléveis ou não”. O PMDB não é nada diferente do pires. “Qualquer que seja seu candidato a governador — Iris, o nome da tradição, ou Friboi, o nome da renovação interna [vale ressalvar que o novo nem sempre é renovador] —, o partido irá dividido para o pleito de 5 de outubro deste ano. Unido, o PMDB não vence o grupo de Marconi há quatro eleições, desde 1998 — há praticamente 16 anos. Dividido, o PMDB terá imensa dificuldade de disputar de igual para igual com uma político habilidoso, metódico e que pesquisa exaustivamente os humores da sociedade. O presidente dos Estados Unidos que aboliu a escravatura e uniu à força o Sul ao Norte, Abraham Lincoln, disse, num discurso célebre: “Uma casa dividida contra si mesma não pode subsistir” (leia em http://bit.ly/1mAM0II). Fica-se com a impressão que, numa espécie de masoquismo involuntário ou inconsciente, o PMDB aprendeu a gostar de apanhar do PSDB do governador Marconi.
Digamos que Friboi seja o candidato a governador do PMDB. Na sua campanha, ao ser criticado pelo empresário, o tucano-chefe não precisará fazer muito esforço para se defender. Basta colher os depoimentos que Iris vem dando à imprensa. Algumas críticas podem ser veladas, mas outras nem tanto. O líder histórico está dizendo, às vezes apenas sugerindo, que Friboi, se for o candidato do PMDB, não o será por mérito, e sim pelo poder de convencimento do dinheiro. “Follow the money” (“siga o dinheiro”) — Iris poderá dizer, se lembrar do caso Watergate, que derrubou o presidente americano Richard Nixon. O Ministério Público, a partir de certo momento, certamente seguirá o “rastro do dinheiro”.
Um grupo do PMDB, irista, sugere que a chapa ideal para enfrentar e tentar derrotar Marconi inclui Iris para o governo, Friboi (ou Vanderlan) para vice e Gomide para senador (o PT está investindo na “política de senadores”). Jorcelino Braga tem sido convocado ao escritório de Iris Rezende e, como emissário, tem levado a proposta para Vanderlan: o peemedebista quer compor. O pré-candidato do PT, Antônio Gomide, também tem recebido recados, por meio de aliados do prefeito de Goiânia, Paulo Garcia (PT), de que Iris quer compor.
Mas como compor com um partido que, a 120 dias das eleições, nem mesmo consegue definir o seu candidato e, numa briga interna feroz, “suja” seus dois principais nomes? Vanderlan e Gomide ouvem os convites para uma aliança, mas, quando abrem os jornais, descobrem a realidade: o PMDB, se briga bem internamente, não tem candidato a governador. Tem-se a impressão de que, na falta de dinheiro, Iris está tentando usar Vanderlan e Gomide como trunfos para forçar Friboi a desistir de ser candidato, mas desconsiderando que os dois políticos têm projetos diferentes. Por que deveriam abrir espaço para Iris? Gomide, mesmo se perder, está jogando para o futuro, para o pós-Marconi — em 2018. Vanderlan, como candidato a governador, possibilita um palanque eleitoral para o candidato a presidente do PSB, Eduardo Campos, em Goiás. Sem contar que, ante a disputa de duas forças tradicionais, PMDB e PSDB, pode ser que, conforme os humores das ruas, um candidato “novo”, mesmo subestimado, inclusive pela imprensa, possa surpreender e ser eleito.
Marconi “olha” para a política de Goiás e comemora: o céu de brigadeiro sorri para o jovem líder. As oposições, caóticas e com interesses divergentes, podem contribuir para que o tucano-chefe seja eleito pela quarta vez. Mas é preciso dizer que Marconi, se reeleito, não o será apenas devido aos equívocos dos adversários. Ele, como gestor e político, tem méritos. Enquanto na maioria dos Estados, como no Rio Grande do Sul do petista Tarso Genro, impera o caos, em Goiás, mesmo com dificuldades, o governo está com suas contas relativamente organizadas. Não só. O governo inaugurou e vai inaugurar obras relevantes. Se a oposição continuar insistindo na tese do caos absoluto, e como o caos não é visível para as pessoas, a maioria do eleitorado vai apostar mais no que está vendo, de concreto, no que em discursos.