Batalha pelo controle do PMDB esconde luta pra lançar candidato a governador em 2018
31 outubro 2015 às 13h09
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O PMDB “renascido” planeja bancar o “novo”, Daniel Vilela, para o governo de Goiás na próxima disputa. O velho PMDB, no qual pontifica Iris Rezende, pretende bancar Ronaldo Caiado como anti-Marconi Perillo
No dia 31 de dezembro de 2018, daqui a três anos e dois meses, o PMDB de Goiás terá completado 20 anos fora do poder. O partido perdeu cinco eleições consecutivas para o governo do Estado. O governador Marconi Perillo derrotou Iris Rezende três vezes — 1998, 2010 e 2014 — e Maguito Vilela uma vez, em 2002. Maguito Vilela perdeu para Alcides Rodrigues, em 2006.
Em 1998, o governador Maguito Vilela era extremamente popular (as pesquisas eram do Datafolha) e planejava disputar a reeleição. No entanto, Iris Rezende decidiu ser candidato de qualquer maneira. Como de hábito, convocou os iristas e pediu que proclamassem nos quatro cantos do Estado que o PMDB queria sua candidatura a governador. A tática era e permanece manjada. O peemedebista-chefe não desiste dela porque tem funcionado desde 1982, quando foi eleito governador pela primeira vez. Atropelado, Maguito Vilela disputou mandato de senador e foi eleito.
Naquele momento, apesar da popularidade inercial de Iris Rezende — ainda não havia um adversário definido —, Maguito Vilela tinha plenas chances de ser reeleito. Iris Rezende perdeu para Marconi Perillo (PSDB), então um jovem de 30 e poucos anos que não nunca havia disputado eleição para governador e senador. Pode-se dizer que Iris Rezende, embora não aceite isto, é o principal responsável pela ascensão do tucano-chefe.
Entre 2002 e 2006, Maguito Vilela disputou o governo, contra Marconi Perillo e Alcides Rodrigues. Mas não era mais o Maguito Vilela de 1998. Ao mesmo tempo, o tucano havia consolidado um projeto de modernização de Goiás que, se compreendido pela sociedade, que o aprovou, parece não ter sido compreendido pelos peemedebistas. Fica-se com a impressão de que enfrentam o governador do PSDB sempre com as mesmas armas, sem perceber que, a cada eleição, há uma espécie de novo Marconi Perillo. Um ser mutante que, ao não ser entendido de maneira ampla, acaba por devorar seus adversários, às vezes com relativa facilidade.
Rasteira do não-capoerista
Em 2010, aos 77 anos, Iris Rezende ressurge, depois de uma auspiciosa passagem pela Prefeitura de Goiânia, como candidato a governador. Peemedebistas chegaram a dizer, em algumas reuniões fechadas, que o velho cacique era um ótimo nome para perder mais uma eleição. Henrique Meirelles filiou-se ao PMDB e apresentou-se para a disputa. No entanto, na hora agá, mais uma vez Iris Rezende puxou o tapete de quem, por ser visto como “o” novo, teria alguma chance de enfrentar Marconi Perillo num patamar diferenciado. Inconformado e constrangido, Henrique Meirelles transferiu seu domicílio eleitoral para São Paulo. O engenheiro goiano (de Anápolis) servia para presidir o BankBoston e o Banco Central, mas não, na avaliação de Iris Rezende, para disputar o governo de Goiás pelo PMDB.
Peemedebistas pensaram: em 2014, depois de tantas derrotas, o PMDB vai renovar. O prefeito de Aparecida de Goiânia, Maguito Vilela, os deputados federais Pedro Chaves e Leandro Vilela, o deputado estadual Daniel Vilela e o prefeito de Jataí, Humberto Machado, além de outros líderes municipais, começaram a trabalhar o nome do empresário Júnior Friboi. Este visitou Iris Rezende em seu escritório — numa das visitas, fez-se acompanhar de seu pai, o bilionário José Mineiro — e perguntou, de cara, se o ex-prefeito de Goiânia seria candidato a governador
Com seu estilo camaleônico, pelo qual um sim parece não e um não parece sim, Iris Rezende sugeriu que não seria candidato. Júnior Friboi saiu de lá, pôs o bloco na rua e passou a conversar com os líderes do partido na capital e no interior. Em pouco tempo, dada sua capacidade de persuasão — sinônimo de estrutura —, havia se transformado no pré-candidato a governador pelo PMDB.
O que Júnior Friboi não sabia é que, embora nunca tenha lutado capoeira, Iris Rezende é campeão de rasteira. Pouco depois de ter sugerido que não seria candidato e que o empresário deveria colocar seu time em campo, o decano peemedebista começou a convocar peemedebistas para visitá-lo em seu escritório. A todos, com seu velho e eficiente estilo enviesado, perguntava, quase respondendo, se deveria ser candidato a governador. Vários peemedebistas, com espírito de servo, saíam dos encontros espalhando a boa nova: Iris Rezende seria candidato a governador. O próprio peemedebista disse, a mais de uma pessoa, que era uma espécie de nome ungido por Deus. Era uma missão. Por isso, para não contrariar a indução divina, nem mesmo era preciso consultar pesquisas para averiguar qual era o perfil do candidato que os eleitores goianos queriam para enfrentar o governador Marconi Perillo.
Como não é político, Júnior Friboi demorou para perceber o efeito da rasteira. Quando acordou de uma espécie de transe, estava no chão, não era mais candidato, não era mais pré-candidato e nem mesmo tinha importância para o PMDB. Iris Rezende confirmava aquilo que, no fundo, todos sabiam: era candidatíssimo a governador. Assim como será candidato a prefeito de Goiânia em 2016.
Iris Rezende não abre espaço. Pelo contrário, fecha portas inclusive para aliados — como Henrique Meirelles e Júnior Friboi. Isto para não falar de oponentes anteriores, como Mauro Borges e Henrique Santillo, dois dos mais respeitáveis políticos de Goiás.
Servindo a Ronaldo Caiado
Como o leitor sabe, Iris Rezende, depois da terceira derrota para o governo, ficou menor. Tornou-se um político não “goiano”, regional, e sim “goianiense”, municipal. Mas quer e luta para manter sua influência em termos estaduais. Não tem mais condições de disputar o governo, mas está pensando na sucessão de 2016 como passaporte para um novo aliado — o senador Ronaldo Caiado, do DEM — na disputa de 2018.
Por que Ronaldo Caiado? Porque Iris Rezende, no seu afã anti-marconista, quer bancar um candidato que seja frontalmente contrário ao governador de Goiás — em termos políticos e, mesmo, pessoais O peemedebista e o integrante do DEM disputam, possivelmente com um empate técnico, quem mais tem ódio de Marconi Perillo. Mal percebem que o ódio, espécie de raiva transformada em pedra, não permite que percebam quem de fato é o tucano-chefe. Eles combatem um fantasma e não o Marconi Perillo de carne e ossos, que é um político atentíssimo, agregador e moderno. O Marconi Perillo que combatem não existe mais — exceto na mente de Iris Rezende e Ronaldo Caiado, que parecem os célebres personagens de Miguel de Cervantes — e por isso não ganham dele há quase duas décadas.
Entre os iristas mais fanáticos corre a informação de que, se eleito prefeito de Goiânia, Iris Rezende vai trabalhar para filiar Ronaldo Caiado ao PMDB. Sua tese: no jogo de Brasília só tem poder quem tem mandato. No Congresso Nacional e nas batalhas entre o Parlamento e o Executivo um senador tem mais peso do que dois deputados federais. É um recado para os parlamentares peemedebistas Daniel Vilela e Pedro Chaves.
Quem leu os jornais na semana passada, sem o necessário espírito crítico, por certo saiu com a opinião de que estavam batalhando pelo comando do PMDB Nailton Oliveira — uma ficção mignon forjada por Iris Rezende para, se derrotasse Daniel Vilela, desmoralizá-lo publicamente —, José Nelto e Daniel Vilela. Era e é a aparência escondendo a essência. A guerra pela hegemonia deve ser vista de modo mais amplo. Iris Rezende queria massacrar Daniel Vilela, torná-lo menor do que Nailton Oliveira. Ele não queria disputar com o deputado federal, por isso pôs na lida um político inexpressivo que não conseguiu ser mais do que prefeito de uma cidade pequena.
A trama parecia perfeita, mas, como diria o jogador Garrincha, faltou combinar com os russos. Antes, Iris Rezende batia o pé e dizia: “Samuel Belchior, que nunca foi deputado federal ou senador, será o presidente do PMDB!”. Os peemedebistas, mesmo percebendo que se tratava de um político anódino, mais lembrado pelo relacionamento com a “pastinha” Luciane Hoepers, aclamavam o “príncipe dos loteamentos” como uma espécie de semideus irista. Em outubro de 2015, sob um calor de mais de 30 graus centígrados, mais uma vez Iris Rezende bateu o pé. Mas parece ter esquecido que não estava calçado de sapatos e seus tênis não fizeram muito barulho e, por isso, os integrantes do partido não ouviram o barulho da batida. Se ouviram, pelo menos ninguém, desta vez, correu.
As cartas estão marcadas. Iris Rezende queria eleição agora, neste momento, única e exclusivamente para massacrar Daniel Vilela. Mas o deputado federal mostrou capacidade de articulação, persuadiu políticos recalcitrantes, como José Nelto e Sandro Mabel, e, por intermédio do aliado José Essado, recorreu à Justiça — que, ao contrário do que pensa o pueril Samuel Belchior, é o fórum adequado para resolver certas pendências. O “problema” é que Samuel Belchior, assim como Iris Araújo, avalia que Iris Rezende é deus e, assim, está acima da Justiça.
Ao recorrer a Justiça, o grupo de Daniel Vilela não quer evitar a eleição. Quer apenas que sejam limpas, e não sejam usadas para massacrar “A” ou “B”, para reduzir a força de um peemedebista e para fortalecer um não peemedebista, Ronaldo Caiado. A Justiça deu ganho de causa à ação proposta pelo ex-deputado José Essado, antes visto como da cota do irismo, mas que, político perceptivo, entendeu que Iris Rezende é uma máquina multiplicadora de derrotas em disputas pelo governo do Estado de Goiás.
A Executiva nacional deve indicar uma comissão provisória para dirigir o PMDB goiano — a preferência é por um deputado federal, Daniel Vilela ou Pedro Chaves. Em 90 dias, a comissão provisória deverá convocar eleição para o Diretório Estadual. O detalhe que poucos perceberam, mesma na imprensa, é que o grupo de Iris Rezende perderá 180 mil reais mensais do Fundo Partidário e, sem tal “estrutura”, terá mais dificuldade de fazer política (Samuel Belchior ressaltou que há mais de 1 milhão de reais no caixa do partido). Então, se o irismo disputar o Diretório Estadual contra o grupo de Daniel Vilela, daqui a 90 ou 120 dias, será em igualdades de condições.
A ascensão de um jovem
O político e historiador britânico Winston Churchill dizia que as grandes vitórias começam com pequenas vitórias. E pequenas vitórias somadas se tornam, com o tempo, grandes. Ao impor uma derrota a Iris Rezende, ainda que pequena, Daniel Vilela mostrou que está atento e que não está brincando quando garante que, em 2018, não terá outro projeto a não ser disputar o governo de Goiás. O jovem, de pouco mais de 30 anos, provou que tem coragem. Aos aliados, dizia, na semana passada: todos criticam Iris Rezende, alguns anunciam que vão enfrentá-lo, mas depois correm da saia. “Daviel” Vilela não saiu da raia e o que se descobriu é que o rei “Goliris” Rezende estava, de fato, quase nu e alquebrado.
Nos enfrentamentos com o governador Marconi Perillo, Iris Rezende já havia se tornado uma espécie de Rei Lear patropi. Mas, internamente, permanecia como uma espécie de Stálin do Cerrado. Agora, como provaram alguns peemedebistas, Iris Rezende se tornou um Rei Lear também dentro do PMDB. O novo finalmente venceu o velho. Este ainda pode reagir? Pode. Mas ficou evidente que, depois de “morder” tanto, perdeu vários dentes.
A vitória de Daniel Vilela é simbólica e sugere um novo tempo? É mais do que simbólica. É um sinal, mais um, de que o tempo de Iris Rezende realmente passou. O peemedebista-chefe tem uma história respeitável, fez muito pelo Estado, mas é uma ideia fora do lugar. Não compreende a modernização de Goiás e, por isso, o Estado não o quer mais (três derrotas para o governo e uma para senador dizem tudo). Ao enfrentá-lo — derrotando-o, ainda que seja uma micro vitória —, Daniel Vilela enviou um recado para a modernidade goiana: “Sou o ‘novo’ e tenho coragem de afastar o ‘velho’”. O jovem deu seu primeiro grande passo para ser candidato a governador em 2018. Passará a ser observado com mais atenção pela sociedade, mas deve ficar atento para não repetir o discurso do ódio típico de Iris Rezende e Ronaldo Caiado. É contraproducente e, portanto, tolice rematada.
O PMDB mostrou que está vivo. Antes, com Iris Rezende, estava numa UTI confortável, mas, ainda assim, UTI. Agora, com Daniel Vilela, foi para o quarto.