Num boteco qualquer da minha rua, eu conversava com um bom camarada sobre os dilemas de sempre: os rumos da esquerda desarmada, o estado da arte de umas tantas mulheres extraviadas, os termos da cronicamente vindoura reforma política.

De repente, Tom Jobim. Num ambiente tão prosaico, tão barzinho, tão goiano – no sentido pejorativo-cultural do gentílico –, aquela música era ao mesmo tempo improvável e imprópria.
Embalada por um violão preciso e por uma voz marcadamente feminina, a conversa seguiu bossa nova. (O rematado clichê me livra da indesculpável inconfidência, ressaltando a sólida e longeva cumplicidade masculina.)

De repente, Céu. Entre standards do Tom e um ou outro samba antigo, aquela cantora imprevista deu um jeito de evocar uma boa novidade do seu – do nosso tempo.
A paulistana Céu ganhou projeção internacional já em seu primeiro álbum, lançado em 2005. Ela faz o que se costuma chamar world music, que no seu caso é a velha e boa música brasileira temperada por influências estrangeiras notáveis.

No fundo, Céu refaz o caminho feito por Tom, Astrud e João Gilberto na década de 1960. Com um pé no moderno e outro no eterno, ela repõe o Brasil na cena musical mundial da atualidade.

Difícil é ouvir Céu – ou Tom, ou Astrud, ou João Gilberto — em Goiânia, e mais ainda, num boteco qualquer da minha rua. Só podia mesmo se chamar Gabriela a dona da voz que embalou minhas divagações de fim de noite.

E Gabriela Ventura, acompanhada por um certo Mateus — cujo sobrenome sucumbiu à minha imprecisão etílica — e seu violão preciso. Serão namorados? Como diz a canção, “do lado de lá tanta ventura / e eu a esperar pela ternura / que a enganar nunca me vinha”. Às vezes vem, até pensei.