Descrença da política e avanço da Covid-19 devem provocar uma abstenção histórica nas eleições municipais. TSE cogita anistiar multa para quem não votar este ano

Neste ano a construção de um candidato exigirá muito mais que discursos recheados de promessas. Esse será um pleito marcado pelo ineditismo de ocorrer em meio a uma pandemia, que dentre tantos efeitos, provocará uma grande abstenção na votação. Aqueles que colocam o nome como opção nas urnas vão sentir a necessidade de mudar o script usual para convencer o eleitorado de que é o melhor candidato. Desta vez, antes de pedir o voto, será preciso persuadir o eleitor a sair de casa para ir votar.

A pandemia exigirá adaptações de candidatos e eleitores, que vão protagonizar um pleito municipal marcado por muitas incertezas, além das já habituais. O cenário atípico pode ter impacto desde a fase de propagandas até os resultados. Quem busca ocupar a vaga de prefeito ou vereador precisará colocar na balança o peso que tem a abstenção.

A pandemia vai potencializar um fenômeno que já se apresentar de forma mais significativa a cada eleição. No último pleito municipal 702.943 eleitores goianos deixaram de comparecer às urnas. O número representou o total 15,75% do eleitorado. Só em Goiânia foram 199.407 eleitores que abstiveram-se de votar. No cenário nacional o percentual foi um pouco maior: 17,58% não compareceram às urnas em 2016.

Para se ter ideia da escalada da descrença do eleitorado, em 2018 a abstenção entre os goianos subiu para 20,20%. No Brasil quase 30 milhões de eleitores não compareceram às urnas (20,3%).

Além da descrença na política e a crise sanitária há outros elementos que precisam ser considerados neste afastamento dos eleitores das urnas, que certamente produzirá uma experiência única nas eleições deste ano. Entre eles está o fato de termos um presidente sem partido e que faz questão de se manter distante da política municipal –  até nos grandes centros como São Paulo e Rio de Janeiro. Outro ponto a ser considerado é que a campanha deverá ser ampliada na internet – onde o engajamento ganha força, gera debates e polarizações, mas não se materializa em votos com a mesma intensidade.

O aumento da abstenção previsto para as eleições municipais também trará um efeito em relação ao norteamento das campanhas. Dificilmente pesquisas eleitorais conseguirão fazer o recorte mais próximo da realidade em um cenário assim. Embora muitos eleitores possam apontar suas intenções de voto, parte não vai relatar a indisposição de ir até urna efetivar o apoio a seu candidato. 

14.9% dos eleitores goianos tem mais de 60 anos, e por isso compõe o grupo de risco na pandemia do coronavírus

A preocupação quanto a abstenção já chegou até o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O atual presidente da corte, ministro Luís Roberto Barroso, já sinaliza que a multa por não comparecimento poderá ser abonada. “Quando este ano começou, as minhas preocupações eram fakenews e recessão democrática pelo mundo afora, até que a pandemia veio e atropelou a todos com novas preocupações e novas iniciativas que se tornaram necessárias”, disse o ministro em uma recente encontro virtual de Presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais. 

A soma de todos esses elementos vai provocar um cenário experimental do voto facultativo no Brasil. Pois mesmo com a reabertura econômica e pessoas voltando a frequentar bares, restaurantes e pontos turísticos (formando aglomerações com frequência), o eleitor não demonstra a mesma  determinação ao chamamento das urnas. 

Com o aumento da abstenção certamente haverá reflexos nos quocientes eleitorais e as chamadas linhas de corte. Assim vereadores serão eleitos com muito menos votos do que precisaram obter em 2016.

Eleições 2020 não favorecem renovação

Na disputa pela reeleição, não cabe uma caixa de promessas. A gestão executada está em avaliação. No entanto as eleições deste ano estão mais favoráveis aos candidatos que buscam ser reconduzidos ao cargo.

Os candidatos à reeleição, que naturalmente largam na frente por fatores como conhecimento pelos cidadãos e facilidade para estruturar a campanha, criaram uma sombra ainda maior sobre os inexperientes, que não têm os mesmos benefícios, por conta do adiamento das eleições. Isso representa mais tempo para inaugurações, exposição na mídia, além do reforço da agenda do combate a Covid-19, que corretamente promoveu maiores repassas e investimento em setores da saúde pública e social. 

A crise sanitária causada pelo coronavírus não existisse, estaríamos em plena campanha. Candidatos a vereador e prefeito estariam promovendo  encontros com apoiadores e, participam de eventos para se tornarem mais conhecidos, além de ampliar suas bases.

No entanto a pandemia nos joga em um cenário de forte migração do contato interpessoal para as redes sociais.Daí um mais uma gama de dificuldades: realização de comícios, passeatas e visitas aos eleitores não condizem com o distanciamento social preconizado pela Organização Mundial de Saúde. Assim está reduzida a capacidade de novos candidatos se tornarem conhecidos.