Conflito entre a Rússia e Ucrânia tende a complicar ainda mais o cenário econômico, causando reflexos na campanha eleitoral deste ano
Guerra afeta plano eleitoral de Bolsonaro (PL) | Foto: Alan Santos | PR
Sempre que ousamos avaliar algum cenário eleitoral incorremos no risco de ter, já no minuto adiante, reviravoltas, surgimento de novos atores ou impactos antes invisíveis. A eleição de 2022 vem sendo tratada desde que se encerrou a contagem de votos, em outubro de 2018. Muita coisa aconteceu nos últimos quatro anos – Nome que a justiça tirou da eleição agora lidera pesquisas, juiz que condenou político, agora é candidato, uma crise sanitária de proporções jamais enfrentada pela humanidade, e agora uma guerra. O ataque promovido pela Rússia a Ucrânia impacta globalmente todos os setores- não seria diferente com as eleições deste ano.
Tão logo o presidente da Rússia, Vladimir Putin, promoveu os primeiros ataques a Ucrânia, na quinta-feira, 24 de fevereiro, a pauta se tornou eleitoral no Brasil. Os analistas, pesquisadores e jornalistas estavam nas telas dos noticiários tratando dos impactos e dos posicionamentos do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (PL). A redes sociais também serviram para que pré-candidatos ao Palácio do Planalto dirigem críticas aos adversários ao comentar a violência sofrida pelos ucranianos. Além da postura do presidente Jair Bolsonaro frente ao conflito, o debate passou a abordar a política externa brasileira, assunto que usualmente recebe pouca atenção na campanha eleitoral. Mas essa é uma guerra que mexe muito mais do que as forças militares dos dois países envolvidos.
Os impactos serão grandes para Jair Bolsonaro, que agora vê a guerra na Ucrânia como ponto a ser explorado por seus adversários. Primeiro fato a ser explorado é a forma como o presidente lidou com o conflito. Dias antes do início dos ataques Bolsonaro visitou Putin, e disse ter “solidariedade” com o país, em meio às ameaças de violação à soberania da Ucrânia – o que se confirmou. A manifestação do presidente vai pesar sobre ele na campanha eleitoral. Seus adversários saberão usar essa fala para correlacionar aos impactos que a guerra trará para vida dos eleitores brasileiros.
Os impactos econômicos trazidos pela guerra é que podem colocar Bolsonaro em uma situação ainda mais delicada e ampliar sua rejeição frente ao eleitorado. Falamos do aumento de preços e das incertezas no abastecimento de produtos importados essenciais. A inflação já vinha dando dor de cabeça para os consumidores. Nos 12 meses encerrados em janeiro, o IPCA-15, prévia da inflação, fechou em 10,76%, segundo o IBGE. A guerra vai complicar ainda mais a situação e vai se refletir na campanha eleitoral.
O bolso do brasileiro, independentemente da classe social, vai sentir o impacto da guerra nos postos de combustíveis. Entre especialistas, há quem aposte que o barril do petróleo, usado como matéria-prima para produzir gasolina e diesel, vai ultrapassar a cotação recorde de US$ 147,50 por barril, de 2008. No Brasil, a disparada da commodity nos últimos dias, quando chegou a ultrapassar os US$ 105, pegou a Petrobras com seus preços inalterados havia 47 dias. Segundo a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), a defasagem entre a Petrobras e as principais bolsas de negociação já chega a 11%, no caso da gasolina, e a 12%, no diesel. Logo essa diferença precisará ser repassada para as bombas. E o brasileiro que já sofre com a inflação, terá mais motivos para reclamar, e a depender de quanto dure essa situação, ela vai se refletir nas urnas.
Os alimentos também vão sofrer reflexos. E claro, o eleitor vai ter mais um fator para pesar na hora do voto. Rússia e Ucrânia respondem por 17% das exportações mundiais de milho e 28% das de trigo. Empresas alimentícias, que dependem da importação de trigo, poderão ser mais afetadas. O Brasil produz pouco mais de 60% do trigo que consome; o restante tem de ser importado.
O preço do trigo subiu 8,91%, chegando ao maior valor em 13 anos, enquanto o milho avançou 6,06% – no caso do grão, o impacto vem em efeito cascata, pois ele serve como base para produtos industrializados e principalmente ração animal, que claro, terão aumento no custo, e logo o repasse chegará aos mercados.
Outro fator que pode impactar o agronegócio (onde se encontra uma grande fatia do eleitorado de Bolsonaro) é a importação de fertilizantes. Os preços já estão subindo devido a risco de oferta e à pressão de custos. Isso pode limitar a tecnologia no campo. A situação gera risco de médio prazo para as empresas do agronegócio listadas na B3, a Bolsa brasileira.
Tudo isso quer dizer que a tendência da economia do país piorar rapidamente, aumentando a pressão popular sobre os líderes políticos. A crise financeira e política vai aumentar e o eleitor ao sentir a inflação ainda pior tende a punir os políticos, em especial aqueles que estão no governo. Daqui até outubro muito ainda pode mudar, inclusive o curso da guerra na Ucrânia, mas o cenário atual não está mexendo na balança eleitoral.
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