O Natal de Iris é de presentes; o de Caiado, de pagar contas
24 novembro 2019 às 00h01
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Depois de passar anos lidando com a falta de recursos, emedebista toca obras; democrata ainda terá de passar pelos mesmos espinhos antes de ir às compras
O ano caminha para o fim e os dois políticos que ocupam os principais cargos em Goiás vivem momentos diferentes. Enquanto Iris Rezende (MDB), prefeito de Goiânia, tem um pacote de obras em andamento, o governador Ronaldo Caiado (DEM) caminha para concluir o primeiro quarto de seu mandato ainda concentrado na melhoria das condições fiscais que lhe permitam mudar a chave do governo para os próximos três anos.
Em que pesem as reclamações de motoristas e críticas ao que seria uma estratégia puramente eleitoral, o canteiro de obras em Goiânia marca uma reviravolta na gestão Iris – que pode muito bem se repetir no governo Caiado. Os dois primeiros anos do emedebista à Frente do Paço Municipal foram de falta de recursos, que paralisaram serviços públicos essenciais, como coleta de lixo, urbanização da cidade, manutenção do asfalto – problemas que ainda hoje deixam sinais pela metrópole.
Iris alega ter herdado uma dívida milionária de seu antecessor, Paulo Garcia (PT), que fora seu vice-prefeito de janeiro de 2019 a março de 2010, quando Iris deixou o cargo para disputar, e perder, o governo estadual. Os valores flutuam conforme a fonte e os petistas contra-atacam dizendo que o rombo já vinha do mandato anterior do próprio emedebista.
Versões e verdades à parte, o fato é que os dois primeiros anos da atual gestão foram abaixo da crítica. A equipe do prefeito justifica de que era hora de arrumar a casa. O emedebista enfrentou sérios debates, reformou a Previdência dos servidores públicos municipais e chegou a R$ 2018 anunciando um superávit primário (saldo entre receita e despesas, exceto pagamento de juros) de R$ 148 milhões.
Com o saneamento das contas – ou, ao menos, o controle delas –, o prefeito foi às compras. Retomou as obras do BRT Norte-Sul, começou um complexo viário na Avenida Jamel Cecílio, está concluindo uma trincheira no cruzamento da Rua 90 com a Avenida 136 e recentemente obteve aval para um empréstimo de R$ 780 milhões, em condições favoráveis de juros e prazos, que vai permitir a continuidade da Avenida Leste-Oeste e recapeamento de asfalto em toda Goiânia.
Com a máquina funcionando, até mesmo a relação com a Câmara de Vereadores mudou: de um foco de turbulências em 2017 e 2018 para um céu de brigadeiro em 2019 e 2020. Em entrevista ao Jornal Opção, o presidente da casa foi sincero: “É complicado ser oposição em uma administração que deslanchou e tem feito tanto”.
Com perdão do trocadilho, o que se espera no Paço Municipal é que todas essas obras pavimentem o caminho para a reeleição. Se vai dar certo ou não, só o tempo vai dizer. Mas é inegável que Iris chegará a 2020 bem mais forte do que terminou 2017 – primeiro ano do atual mandato.
A reviravolta na gestão municipal não deixa de ser um alento ao governador Ronaldo Caiado (DEM). O primeiro ano do democrata no Palácio das Esmeraldas é semelhante ao que Iris teve no Paço Municipal: falta de dinheiro, dívidas, fornecedores batendo às portas. Mas a situação do governo estadual parece mais desafiadora, por isso mesmo, exigirá de Caiado um jogo de cintura ainda maior – desafio que ganha grandeza diante do fato de que ele não tem a mesma experiência no Executivo que Iris.
De cara, o governador teve de lidar com uma folha de pagamento em cima de sua mesa. Há quem questione a forma como ele lidou com a questão, parcelando o débito, mas o fato é que o pagamento de dezembro foi quitado sem que houvesse atrasos nos salários de 2019.
Caiado renegociou contratos (especialmente com as Organizações Sociais que gerem os hospitais estaduais e com empresas prestadoras de serviços ao Detran-GO), cortou o número de comissionados (medida que tem mais simbolismo político que efeito prático, na medida que esses servidores pesam relativamente pouco na folha), comprou briga em relação aos incentivos fiscais e agora enfrentará uma dura queda de braço com o funcionalismo em torno da Reforma da Previdência e da adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF).
Todas as medidas, obviamente, trazem desgaste ao governador, mas são necessárias. Mesmo com as providências, a folha de pagamento tem um crescimento vegetativo perigoso. Hoje, ela está na casa de R$ 1,085 bilhão – R$ 43,2 milhões a mais que no mesmo período de 2018. Isso sem o governo ter dado nenhum novo aumento.
Os investimentos estão emperrados. Fazê-los com recursos próprios não é uma hipótese nesse comento de caixa completamente comprometido. As promessas do governo federal, até agora não foram concretizadas – os repasses da União até agora têm sido protocolares.
Diante do cinto apertado, a equipe econômica tem algumas conquistas. Segundo o Sindicato dos Funcionários do Fisco em Goiás (Sindifisco), a arrecadação do Estado cresceu mais de R$ 1 bilhão somente no primeiro semestre.
O dilema de Caiado é que, como gestor, precisa atuar de forma que nenhum político gosta: tomando medidas duras e impopulares. Em contraste com Iris, que abriu a carteira, o democrata agora faz o papel daquele que chama a família à responsabilidade e anuncia que estão cortados os passeios, o cinema e não haverá brinquedo no Natal. Porque é hora de pagar a conta – que herdou junto do cargo mais importante da política em Goiás.