Carestia mostra fragilidade da política econômica, o que leva uma parte do governo a querer mudar método de calcular a inflação

Inflação de alimentos assusta  o governo: mudar o método de calcular não resolve o problema / Foto: Andre Porto - Assessoria Anteffa
Inflação de alimentos assusta
o governo: mudar o método de calcular não resolve o problema / Foto: Andre Porto – Assessoria Anteffa

É por demais conhecida a expressão que dá à economia peso preponderante em campanhas eleitorais. Foi engendrada pelo marqueteiro americano James Carville, numa bem-sucedida campanha de Bill Clinton. Na já deflagrada campanha eleitoral brasileira deste ano, a economia terá muito peso.

Ao contrário do que muita gente apregoa, o Brasil não está caindo pelas tabelas em termos econômicos, mas não há dúvida de que está muito aquém do que poderia estar. A ruindade de Dilma Rousseff e sua equipe, os sucessivos erros nos últimos anos têm deixado o país na rabeira entre os chamados emergentes.

O Brasil tem um dos piores índices de crescimento, e ao mesmo tempo perde investimentos externos mais consistentes — não perde mais por causa dos juros estratosféricos que atraem capital puramente especulativo.

Nos últimos meses, a inflação tem crescido paulatinamente. É consequência desses erros na condução da política econômica, e pela natural sazonalidade de alimentos. Houve um momento em que Dilma, sem nenhum traquejo político, chegou a dizer que não tinha problema “um pouco” de inflação.

Com a reação de economistas e analistas na imprensa, a equipe econômica teve de tentar “traduzir” o que a presidente tinha falado, que não era bem assim, que o controle da inflação é prioridade do governo, etc.

Explicaram para Dilma que os brasileiros têm trauma de carestia, lembrança do drama vivido no governo Sarney, o que só foi debelado com o Plano Real de Fernando Henrique Cardoso. Explicaram também que a inflação é mais prejudicial à classe trabalhadora. Mas Dilma Rousseff só entendeu mesmo quando lhe explicaram que os preços altos podem mandar sua reeleição para o buraco.

Pois bem, preocupados com o impacto da alta dos alimentos na inflação, técnicos do governo começaram a defender nos bastidores mudanças polêmicas na formulação da política econômica. É o que vem ocorrendo na Argentina, em que os índices negativos na economia são “maquiados”, escondidos, para não mostrar a real situação do país.

Os “gênios” do governo brasileiro, diante dos frequentes choques nos preços de produtos in natura por causa de problemas climáticos, defendem que esses itens deveriam simplesmente ser retirados do cálculo do Índice de Preços ao Con­sumidor Amplo (IPCA). A ideia já foi ventilada antes e tem a simpatia da equipe econômica, pois tornaria o indicador mais “realista”, ou mais interessante para o governo, que se mostra incapaz de tomar medidas sérias, mas que sejam impopulares num primeiro momento.

A ideia de expurgar preços no cálculo do IPCA ganha força quando os economistas do mercado financeiro estimaram, no início da semana passada, que, pela primeira vez, a inflação vai estourar o teto da meta do governo em 2014.

Nos últimos dias, analistas pioraram suas estimativas e esperam agora que a inflação oficial medida pelo IPCA encerre o ano em 6,51% — ante uma projeção de 6,47% na semana passada. Foi a sétima alta consecutiva na previsão para a inflação.

A inflação acumulada em 12 meses até março está em 6,15%, à beira do teto da meta de 6,5% fixada pelo governo para o ano. E grande parte dessa alta é resultado do aumento dos preços de alimentos. Só o preço do tomate já subiu 31,72% em 2014. A batata inglesa teve alta de 17,27% no mesmo período.

Em reportagem do jornal “O Globo”, os que defendem mudança na formulação da política econômica dizem que as altas de alimentos, como o tomate e o chuchu, por exemplo, não deveriam influenciar o IPCA total, uma vez que não são produtos insubstituíveis. O argumento é que os consumidores deixam de comprá-los quando os preços sobem demais em função do clima. Eles afirmam que inflação teria de ser medida por itens que não podem ser trocados por outros, como combustíveis ou alimentação fora de casa.

Os economistas do mercado financeiro afirmam que qualquer alteração no índice seria vista com muita desconfiança. Claro, seria mais um mergulho na “argentinização” do Brasil, que já sofre crise de credibilidade no mercado internacional por ter adotado medidas nesse sentido, como os malabarismos contábeis para garantir meta de superávit. Ex-diretor do Banco Central, Alexandre Schwartsman disse que não há nada de honesto no argumento e o classificou de “cretinice”.

Ainda bem que no próprio governo há quem pense assim também. O ministro da Agri­cultura, Neri Geller (PMDB), se disse contrário à expurgação dos preços dos alimentos do índice oficial de inflação, mesmo admitindo que a questão é da alçada do Ministério da Fazenda.

Diante das reações negativas, o ministro Guido Mantega negou que o governo esteja pensando na medida esdrúxula. “Não sei quem teve essa ideia, mas ela não procede”, afirmou o petista. Como se vê, até mesmo Mantega tem momentos de lucidez.

Eduardo x Marina 

Na quarta-feira, 23, o pré-candidato do PSB à Presidência, Eduardo Campos, confirmou que colocou em discussão, na equipe de elaboração das diretrizes para a campanha eleitoral, proposta de institucionalização da autonomia do Banco Central (BC), que hoje existe sem garantia legal. Campos defende que a medida daria um sinal positivo ao mercado financeiro e ajudaria a sustentar a credibilidade da política econômica.

O tema ganha relevância no momento em que a inflação no Brasil está em alta. Nos últimos anos, sucessivos governos deram ao BC liberdade para que ele adote as medidas que julgar necessárias para conter a inflação. Muitos economistas dizem que a credibilidade do BC seria maior se a autonomia da instituição fosse garantida por lei e se seus dirigentes tivessem mandatos fixos.

Pois bem, a vice de Campos, ex-senadora Marina Silva, diverge do “chefe”. Ela posicionou-se contra a institucionalização do Banco Central. Marina disse que não há necessidade de se institucionalizar o Banco Central ou de criar garantias legais para assegurar a sua autonomia no país.

A ex-verde disse desde 2010, defende a autonomia do Banco Central, mas pondera a questão da institucionalização. Afirma que compartilha com Eduardo Campos a defesa da autonomia do Banco Central, mas que ela entende que essa autonomia tem de ser efetiva, e não necessariamente institucionalizada, como ocorreu na Argentina.
E a campanha nem começou de fato. Há muito tempo ainda para Eduardo Campos “penar” com sua vice.