Mais impressionante do que um político eleito é um político relevante sem cargo
07 abril 2024 às 00h01
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O teste mais decisivo para o capital eleitoral de um político não a votação. Nas eleições, acordos partidários fazem com que figuras secundárias sejam puxadas para palanques e cargos importantes, e fazem também com que grandes estadistas percam votos por escorregões ao microfone e traições dos concorrentes. Na realidade, a melhor forma de medir o tamanho de um político é observar o que ele se torna quando fica sem cargo.
Sem poder, sua influência é reduzida à sua habilidade. O político que é ouvido sem orçamento ou alianças para oferecer deve possuir alguma qualidade que não está associada ao cargo, ou deve haver expectativa de que ele volte ao poder em breve. Mesmo que ocupe a direção de alguma estatal como forma de agradecimento por acordos do passado, ele precisa possuir algum valor inerente, caso contrário seria descartado do duro jogo da política após perder seu poder.
A base do governo fecha articulações para as pré-candidaturas duas maiores cidades de Goiás nesta semana. Nas duas cidades — Goiânia e Aparecida de Goiânia —, um player eleitoralmente importante, mas sem cargo, participou das decisões. Gustavo Mendanha (MDB) deixou a Prefeitura de Aparecida em abril de 2022 para disputar as eleições para governador, mas sua boa avaliação faz com que muitos aparecidenses ainda pensem que ele é o prefeito.
Vilmar Mariano (UB), como vice que assumiu a Prefeitura, deu prosseguimento ao plano de governo eleito em 2020 e manteve o secretariado de seu antecessor. Os aliados condicionam a chance de sucesso de Vilmar Mariano nas próximas eleições ao apoio de Gustavo Mendanha. Entretanto, conforme a data se aproxima e o atual prefeito luta para se viabilizar contra o primeiro colocado nas pesquisas, Professor Alcides (PL), a base começa a estudar alternativas.
Na tarde da quarta-feira, 4, Mendanha afirmou: “Leandro Vilela vai ser nosso candidato”, pois Vilmar havia se recusado a filiar-se ao União Brasil. Na madrugada da quinta-feira, 5, o prefeito recuou e filiou-se de fato ao UB, o que fez com que a base reafirmasse a união de Mendanha, Mariano, Leandro Vilela e outros. Uma demonstração da pressão que a base governista é capaz de exercer, veiculada por um político sem cargo.
Em Goiânia, Gustavo Mendanha possui menos influência direta. O principal player é o governador Ronaldo Caiado (UB), com 83% de aprovação na cidade. As políticas sociais e de segurança pública do governo estadual ressoaram fundo na Capital, onde a pobreza e violência tendem a ser maiores. Ainda assim, o ex-prefeito da cidade vizinha desempenhou um papel na escolha de Sandro Mabel (UB) como nome da base, dizem interlocutores ligados ao palácio.
Em março, Gustavo Mendanha acompanhou Ronaldo Caiado em viagem à Israel. Fontes que estiveram na comitiva afirmam que, ao longo da viagem, Mendanha argumentou que Mabel seria uma solução para o imbróglio da escolha de pré-candidato da base. Talvez, o interesse de Mendanha fosse indicar sua esposa, Mayara, como vice. Sandro Mabel já afirmou que o perfil de vice que ele busca é uma mulher e também que seja evangélica.
A chapa está congestionada e talvez o vice calhe de ser outro, mas, seja como for, chama a atenção nas articulações da Capital a participação de um ex-prefeito de cidade vizinha. Gustavo Mendanha participou inclusive da entrevista coletiva para oficializar o lançamento da candidatura de Sandro Mabel.
O que explica a retenção de influência do ex-prefeito? No caso de Goiânia e Aparecida, há o natural anseio pelo líder jovem, moderno, carismático, mas que não represente uma ruptura com o bem avaliado governo atual. O que o eleitorado dessas cidades quer é a garantia de continuidade das políticas sociais e de segurança em políticos que ainda permanecerão na vida pública por muitos anos.