Dois focos para Temer: recuperar a confiança no País e fazer a economia voltar a crescer
07 maio 2016 às 13h17

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Sem entrar em minudências de nomes para o futuro governo do vice-presidente, o cientista político Luiz Felipe D’Ávila dá a receita para que o peemedebista, mesmo com pouco tempo, acerte

Um dos mais aplicados estudiosos da realidade brasileira, o cientista político paulistano Luiz Felipe D’Ávila é formado em ciências políticas pela Universidade Americana em Paris e mestre em administração pública pela Harvard Kennedy School. Ele escreveu vários livros de história e de política.
Entre as obras de D’Ávila, está “Os Virtuosos”, cuja leitura neste momento de desilusão com nossos homens públicos poderia servir de alento aos brasileiros. O livro defende a tese de que embora a corrupção seja disseminada no ambiente político-administrativo do país, existem nessa área, como em outras, “ilhas de excelência”, os líderes políticos Prudente de Moraes, Campos Sales e Rodrigues Alves, que se destacaram pela operosidade sem perda da consciência e da postura ética, governantes que defenderam os princípios republicanos, os valores democráticos e as instituições dos ataques sistemáticos dos caudilhos e demagogos.
Na sexta-feira, 6, Luiz Felipe foi entrevistado pela Veja.com Vídeo. O cientista político falou dos desafios que Michel Temer deve enfrentar no comando do País e a forma de seu curto governo de transição dar certo. Segundo D’Ávila, são dois os grandes desafios de curto prazo que Temer terá de assumir: a retomada da confiança no País e a volta do crescimento da economia.
“As pessoas precisam acreditar novamente no País, os investidores precisam acreditar para investir os seus recursos, o trabalhador precisa acreditar para voltar a consumir, os investidores externos precisam acreditar para investir capital de longo prazo principalmente na área de infraestrutura. Ou seja, o resgate da confiança é o desafio número um”, afirmou.
O desafio número dois, segundo D’Ávila, será fazer a economia voltar a crescer, uma vez que estamos na pior recessão dos últimos 80 anos no Brasil. “No ano passado a economia recuou praticamente 7% do Produto Interno Bruto (PIB), estamos com mais de 10 milhões de desempregados, então precisamos rapidamente retomar o crescimento econômico.”
E quais seriam as medidas práticas para isso?
O cientista político diz que Michel Temer terá de focar em medidas que terão alto impacto e baixo custo político. Lembrando que será um governo curto, de transição, de pouco mais de dois anos, D’Ávila afirma que Temer poderia apostar quatro medidas importantes.

que a petista Dilma Rousseff produziu | Foto: ASCOM/VPR
A primeira, aponta, seria aprovar um fast track, ou via rápida em investimentos de infraestrutura no Brasil. O País precisa ter transparência nas regras, acabar com a estupidez de limitar o retorno sobre capital e criar os mecanismos de controle que já existem em obras de infraestrutura no mundo inteiro, exceto aqui, que é o uso de performance bonds, o seguro garantia.
“As pessoas que firmarem contratos públicos terão de entregar o serviço no prazo e no preço combinado, acabando com o mecanismo dos aditivos, que alimentam a indústria da corrupção nas obras públicas. Então, como simplificar as regras, fazer com que haja menos voluntarismo na interpretação das leis, criando esses performance bonds e os seguros necessários para que as obras sejam entregues no prazo e ao preço contratado”, resume.
Luiz Felipe D’Ávila diz que há dinheiro no mundo para investimentos em infraestrutura e o mundo está ávido para investir no Brasil. São investimentos de longo prazo que fazem mover a economia imediatamente, gerando principalmente empregos na base. “Como retomada de crescimento eu focaria nisso. Aliás, poderia até criar o Ministério da Infraestrutura para juntar toda essa parte de parceria público-privada, concessões, etc.”
A segunda medida apontada pelo acadêmico é o enfrentamento da reforma trabalhista. Mas ele adverte que se começar pela discussão da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) seria um debate sem fim, até porque isso é um vespeiro e não passa no Congresso. “Mas já há consenso, por exemplo, de que é preciso flexibilizar a legislação.”
D’Ávila lembra que o professor da Universidade de São Paulo (USP) José Pastore já sugeriu uma ideia fantástica, que seria uma emenda constitucional que rezaria: salvo comum acordo entre empregador e empregado, vale a CLT. “Então, não mexe na CLT, propõe uma PEC que permite a negociação livre entre patrões e empregados. Havendo essa negociação, ela prevalece sobre a CLT. Isso abriria um campo extraordinária para novos acordos trabalhistas, especialmente em áreas como na indústria de serviços e tecnologia.”
O cientista afirma que algumas categorias seriam mais beneficiadas por ficarem sem o engessamento que existe hoje e isso ajudaria a fomentar o emprego. “As pessoas querem voltar a trabalhar e se puder fazer acordo e isso ser impulsionador do emprego, acredito que os trabalhadores topam. Vamos abrir a livre negociação entre patrão e empregados e se houver divergência, que valha a CLT”, reforça.
Previdência

impacto e baixo custo político”
A terceira medida sugerida por Luiz Felipe D’Ávila é a reforma da Previdência. Ele lembra que o modelo está esgotado, que a conta previdência está crescendo a 13% do PIB e ainda temos uma população jovem. “Isso vai quebrar o Brasil, porque Já gastamos na Previdência “percapitamente” três vezes mais que a Alemanha. Quando tivermos a idade média dos alemães, a gente quebra.”
E mexer em Previdência sempre é um vespeiro. Mas o cientista político lembra que também aí há uma boa notícia, um consenso generalizado de que é preciso subir a idade de aposentadoria para 65 anos. “Essa conscientização já é uma vitória. Mas precisamos ir além.”
E como fazer para ter o apoio da população, no caso de mexer em algo tão espinhoso como Previdência? O cientista político afirma que o (futuro) presidente poderia fatiar a reforma e começar atacando a Previdência pública e não a privada.
“Na Previdência pública está 70% da conta. Para se ter uma ideia, 870 mil funcionários públicos aposentados consomem a mesma coisa que 28 milhões de trabalhadores da iniciativa privada. Se fatiar a reforma desse jeito, o novo governo mostra uma atitude, que está disposto a cortar na própria carne antes de pedir aumento de impostos para a sociedade. Com isso ele terá apoio do restante da população”, explica D’Ávila.
A quarta e última medida importante diz respeito à política externa. Um Itamaraty “turbinado” é muito importante, afirma D’Ávila. Lembrando que o senador tucano José Serra vem sendo dado como o futuro titular da pasta, que agregará mais poderes, tornando-se um “superministério”.
Segundo Luiz Felipe D’Ávila, o Brasil precisa voltar a ter papel relevante na economia global. “Nossas exportações é uma mola propulsora do crescimento e da geração de empregos. O Brasil, nos últimos 15 anos, fechou sua economia de forma brutal. Veja que absurdo: o Brasil é a 8ª economia do mundo e a 24ª exportadora. Exportamos menos que a ilha de Taiwan. Nosso comércio exterior nunca representou mais de 20% do PIB, sendo que a média dos países exportadores é de 50% do PIB. Representamos apenas 1% do comércio global.”
O caminho a ser percorrida na área de comércio exterior é enorme, aponta Luiz Felipe D’Ávila, no sentido de fazer abertura econômica, de concorrência e de foco no aumento das exportações. “Focando nisso, seremos mais produtivos, vamos atrair pessoas do mundo inteiro, cérebros para fazer com que a economia recupere parte do tempo perdido.”
Jornalista petista cai na real

Na quinta-feira, 5, na Argentina, o Nobel peruano de Literatura Mario Vargas Llosa disse que considera “muito saudável” que o Brasil passe pela crise política atual. “Acho que o que está acontecendo em Brasília é um protesto do setor mais saudável e criativo do país diante de uma democracia que estava gangrenada pela corrupção”, afirmou.
Segundo Vargas Llosa, “o mundo inteiro tinha santificado Lula, e logo os brasileiros são os primeiros a descobrir que o regime de Lula é a fonte de uma corrupção sem precedentes na história brasileira. O que está ocorrendo no Brasil é saudável, muito saudável, e demonstra a liberdade que permitiu que isso seja exposto”, comentou.
O escritor e jornalista peruano disse que o regime de Dilma Rousseff herdou uma corrupção que nasceu com Lula. “Então, é bom que o Brasil viva essa catarse e tire seus santos do pedestal.”
E um jornalista e escritor militante do petismo (não sei se é filiado) também parece estar tirando o santo do pedestal. Ricardo Kotscho, confesso admirador de Lula, na terça-feira, 3, publicou em seu blog (Balaio do Kotscho) o artigo intitulado “Dilma já monta o seu ‘bunker’, mas para quê?”, em que mostra que nem todos se deixam levar pela cegueira ideológica a ponto de obliterar a visão da realidade. Vale a leitura, mesmo porque Kotscho, dono de um dos mais brilhantes textos do jornalismo brasileiro, põe a nu um pouco do melancólico final do governo Dilma.

Na minha infância, ouvia muito falar nesta palavra alemã “bunker”, como eram chamados os abrigos subterrâneos, onde minha mãe se refugiava com a família, durante os bombardeios na Segunda Guerra Mundial. Eram lembranças muito tristes, que me marcaram para o resto da vida.
Setenta e um anos após o final da última grande guerra, esta palavra volta ao noticiário, agora no Brasil. Já certa da derrota na batalha do impeachment, Dilma começou a preparar o desembarque do Planalto e a montar um “bunker da resistência” no Alvorada, segundo relato dos repórteres Marina Dias e Valdo Cruz, na Folha desta terça-feira.
Pergunto: vai resistir para quê, resistir contra quem, quais são os seus planos?
Até onde sei, nenhuma força inimiga está preparando um bombardeio sobre o Palácio do Planalto. A guerra política é travada no parlamento e nos tribunais, com acusação e defesa citando a Constituição Federal. Não há no horizonte, até onde minha vista alcança, aviões militares, canhões ou navios de guerra.
São ambiciosos os planos de Dilma para o período em que ficará afastada do poder central. Em nada lembram a retirada discreta de Fernando Collor, quando caiu em 1992, esperando em silêncio e resignação, isolado na Casa da Dinda, pelo julgamento final. A quase ex-presidente quer montar uma estrutura de 15 assessores, mais seguranças, carros oficiais e um avião da FAB, além de manter todas as mordomias do Palácio da Alvorada.
Ao contrário de Collor, que deixou o Planalto pela porta dos fundos acompanhado apenas pela mulher, Dilma está pensando num final grandioso para a despedida, programada para o próximo dia 12, segundo o cronograma do Senado. Quer descer a rampa solenemente ao lado do que restou do ministério de seu desastrado governo que quebrou o País.
Em seus atos de desespero nos últimos dias, a ainda presidente deixou claro que pretende cair atirando, para infernizar a vida do seu sucessor constitucional (e, por tabela, a de todos nós, que pagamos a conta), como fez no 1º de Maio, ao anunciar um “pacote de bondades” que aumenta as despesas e diminui a arrecadação, no apagar das luzes, deixando um rombo perto de R$ 100 bilhões nas contas públicas.
Mesmo que o possível governo Michel Temer fracasse em sua tentativa de ressuscitar a economia brasileira, é consenso no meio político, até no PT, que não há a menor chance de Dilma voltar ao cargo no final dos 180 dias de afastamento. Então, eu só gostaria de entender: para quê tudo isso? Para continuar repetindo ao Brasil e ao mundo que ela está sendo vítima de um “golpe”, colocando em risco a estabilidade institucional?
Jânio e Jango também ficaram esperando que as multidões saíssem às ruas para pedir a volta deles. Morreram esperando.
Vida que segue.
Ricardo Kotscho