Presidente diz que disputa a reeleição mesmo sem apoio dos partidos aliados, o que é um tremendo autoengano. Se Lula não quiser, ela nem chega a ser candidata

Presidente Dilma Rousseff e ex-presidente Lula da Silva: se ele não  quiser, ela nem terá a chance de ser candidata à reeleição em outubro / Foto: Roberto Stuckert Filho/PR
Presidente Dilma Rousseff e ex-presidente Lula da Silva: se ele não quiser, ela nem terá a chance de ser candidata à reeleição em outubro / Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

A menos de dois meses da convenção e cinco meses da eleição, a presidente Dilma Rousseff está com sua pretensão de continuar no Palácio do Planalto a mercê da boa vontade de Luiz I­ná­cio Lula da Silva, seu mentor. Com a desidratação galopante nos índices de aprovação de governo e de intenção de votos, a presidente se vê ameaçada de nem ter o direito de disputar. Mui­tos integrantes do PT e de partidos aliados já verbalizam a insatisfação com Dilma e clamam volta, Lula.

Dilma tem muita culpa pela constrangedora situação que ela está vivendo. Mas não só ela. Na verdade, a presidente está pagando por uma série de malfeitos dos governos petistas na última década. Escân­dalos aos montes, mensalão, total aparelhamento do Esta­do, assalto à Petrobrás… Estava na cara que em algum momento a fatura por esse estado de coisa seria cobrada pela opinião pública. Para azar de Dilma, a cobrança está se dando agora, na pré-campanha.

Juntamente com outra cobrança, esta pela flagrante incompetência da presidente na condução da política econômica que tem deixado o Brasil na rabeira do crescimento entre os países emergentes. A inflação é uma triste realidade no Brasil e carestia é algo que o brasileiro não perdoa a seus governantes.

A difícil situação política de Dilma Rousseff chegou a tal ponto que na semana passada, a bancada do aliado PR na Câmara dos Deputados anunciou publicamente, em manifesto, apoio ao chamado movimento “Volta Lula”, que tem adeptos no PT e defende que o ex-metalúrgico substitua Dilma na disputa à eleição presidencial de outubro.

A reação da presidente mostrou que ela sentiu o golpe. Disse que gostaria de ter a base aliada próxima quando sair candidata à reeleição e que seguirá mesmo sem apoio. Especificamente sobre a manifestação de parlamentares do PR, Dilma afirmou: “Se não tiver o apoio da base (quando eu for candidata), toco em frente”.

Para infelicidade de Dilma, isso não é verdade. Mesmo porque para “tocar em frente” ela antes terá de ser a candidata do PT e da base aliada. E a verdade é que Dil­ma simplesmente não tem poder para impor sua candidatura dentro do PT. Ela depende da vontade de Lula. Se o ex-presidente achar que sim, então sim; se achar que não, então não. Exata­mente como aconteceu quando Lu­la a escolheu para ser seu sucessor: ele simplemente a impôs ao par­tido, contra a vontade de muitos.

Imagine se Dilma teria a mínima condição de disputar uma prévia ou mesmo a convenção no PT contra a vontade do ex-presidente. Na máquina partidária, Dilma Rousseff não apita nada. Aliás, muitos integrantes do partido nem a consideram petista de fato — há 34 anos, quando foi fundado o PT, ela era brizolista e trabalhava pela criação do PDT. A verdade é que o PT tem dono. Simples assim.

Lula está sendo convocado para a candidatura. Ele já disse que não há nenhuma possibilidade disso. Mas o que ele diz num dia ele pode desdizer no outro, basta que isso lhe seja vantajoso de alguma forma. Portanto, o ex-metalúrgico certamente está avaliando os prós e os contras dessa empreitada. Dilma que se cuide.

Inabilidade política foi o início dos problemas

O começo das dificuldades que a recandidatura da presidente poderia sofrer se deu há um bom tempo, desde pelo menos meados do ano passado. Isso, principalmente, por causa da mínima falta de competência como gestora, o que de cara já redundou nos resultados ruins na economia.

Mas não é apenas a economia que erode as pretensões de reeleição da presidente. Os sinais de que as coisas poderiam degringolar estavam perceptíveis na inabilidade dela para tratar das miudezas políticas. Ao longo de seu governo, ao devotar o máximo desprezo aos líderes partidários, Dilma começou a cavar o buraco onde pode ser sepultada sua pretensão (re)eleitoral.

Se a inabilidade política já é fator tremendamente negativo no sistema político brasileiro, de conchavos e tapinhas nas costas, Dilma tratou de piorar as coisas para si quando designou gente quase tão ou até mais inábil que ela para tratar da chamada articulação política.

Rememoremos um pouco essa saga. No início do governo quem fazia a articulação era Antonio Palocci, então ministro da Casa Civil, um craque nas relações pessoais, um autêntico diplomata. Aí o escândalo da multiplicação por 20 do patrimônio palocciano em quatro anos acabou estourando na gestão dilmista. Palocci sai e a função ficaria com o petista Luiz Sérgio, da Secretaria de Relações Institu­cionais. Sérgio não tinha (como não tem) a mínima noção do que seja articulação política.

Dilma convoca a senadora Gleisi Hoffmann para a Casa Civil e Ideli Salvatti nas Relações Institu­ci­o­nais. Gleisi era denominada “pitbul” do governo no Senado. Ora, um pi­tbul para conversar e pacificar parlamentares? Em muitos momentos, Gleisi acirrou ainda mais os ânimos na base aliada governista, deixando mágoas no caminho.

Idelli Salvatti, que estava ministra da Pesca — veja só! — também não tem maior aptidão para o mister. Por sinal, a escolha de Ideli para fazer a articulação política do governo com o Congresso frustrou líderes da própria bancada petista na Câmara, que reivindicavam a indicação para o cargo: Cândido Vaccarezza, líder do governo na Câmara, ou Marco Maia. Mas Dilma queria mostrar que quem mandava era ela.

Só nos últimos meses, com as pré-candidaturas de Gleisi e Ideli em seus Estados, a articulação política foi passada a Aloizio Mercadante, um pouco menos inábil que as duas anteriores, e Ricardo Berzoini.

Mas o fato é que começou ali, na articulação política, o calvário dilmista, o que permite concluir, sem muito risco de erro, que a queda de Palocci — enriquecimento hiperrápido à parte — foi a maior perda para a presidente Dilma Rousseff. Se ele tivesse continuado articulando politicamente o governo, certamente a situação no âmbito do Congresso hoje não seria tão desconfortável para a presidente.