Candidato bom é candidato exposto
23 agosto 2014 às 10h45
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Temas incômodos devem sim entrar na pauta de debates e entrevistadores não podem apenas ‘”levantar a bola” para entrevistados

Como há uma campanha à Presidência, não se pode perguntar à candidata Dilma Rousseff o que ela acha de seu partido, o PT, ter recriminado publicamente a condenação de companheiros dela por corrupção que ficou fartamente provada no processo do mensalão.
A argumentação passou a ser brandida por muita gente, depois da entrevista de Dilma Rousseff ao “Jornal Nacional”, na semana passada. Sob esse ponto de vista, fazer perguntas incômodas aos candidatos leva ao desvirtuamento da campanha, desviando o foco para o que realmente interessaria, ou seja, a apresentação de propostas.
A fragilidade dessa argumentação beira o fantástico, sob o ponto de vista da democracia. Há uma legião de defensores dessa tese nas redes sociais, e não por acaso, a maioria absoluta é de militantes petistas. A razão é óbvia: para Dilma a quantidade de temas incômodos é tanta que melhor mesmo é falar do que se pretende fazer, sem nenhum compromisso de cumprir.
Muito mais que o horário eleitoral gratuito, desigual no tempo de duração conforme as coligações e resultado de pura marquetagem, as entrevistas com os candidatos são a melhor oportunidade para o eleitor “sentir” o potencial dos que lhe pedem o voto. Na entrevista ao JN, Dilma tergiversou o tempo todo, fugindo das perguntas incômodas formuladas pelos entrevistadores William Bonner (principalmente) e Patrícia Poeta.
Para dar um verniz de igualdade, os que recriminam que se pergunte a Dilma sobre a grossa corrupção em seu governo, falam que também não se deveria ter abordado com Aécio Neves, o tema aeroporto de Cláudio, município no interior de Minas. A “Folha de S.Paulo” havia reportado que o aeroporto teria sido construído em área desapropriada de um parente de Aécio e fica perto de uma fazenda que pertence à família dele. Segundo a reportagem, a obra beneficia a família do tucano.
Os “inocentes” também criticam que se tenha perguntado a Eduardo Campos (PSB) sobre o grosso nepotismo que o finado candidato teria praticado em Pernambuco, arranjando a vida da parentalha em órgãos públicos, a começar pela notória influência política para nomeação da mãe como ministra do Tribunal de Contas da União.
Pois os entrevistadores do JN abordaram esses temas incômodos aos seus entrevistados. Aécio respondeu que não houve irregularidade e explanou as razões, sem fugir do tema. Eduardo Campos disse que não via problema no fato de seus parentes ganharem cargos bem remunerados sem concurso, negando que tenha influenciado para isso.
Se os telespectadores consideraram as respostas suficientes não se sabe, mas o jogo é esse mesmo. O tema tem de ser jogado na mesa, e responda quem tiver argumentos para tal. Ou fuja da pergunta quem não dá conta de respondê-la.
No caso de Dilma, quem tem mais de dois neurônios percebeu claramente que ali havia uma tática deliberada de falar e falar sem dizer nada, para que o tempo da entrevista (15 minutos, uma eternidade em TV) se esgotasse e outros temas cabeludos não fossem postos na roda.
Por exemplo, a catadupa de corrupção na Petrobrás não foi sequer citada. Nem por que a presidente construiu porto em Cuba com dinheiro dos brasileiros. Não houve tempo. A tática funcionou. Fica a dúvida se foi orientação do marqueteiro João Santana ou só a natural confusão de Dilma, que sob pressão, como era o caso, vai ao grau extremo na desconexão entre o que fala e a realidade.
É até engraçado dizer que temas incômodos não possam ser tocados com os candidatos. Em termos locais, seria assim como não poder perguntar ao governador-candidato Marconi Perillo (PSDB) sobre a questão da segurança pública em Goiás, o que ele fez e está fazendo em relação a isso. Ou sobre Carlos Cachoeira. Esses temas devem ser perguntados sim, até para que o governador os esclareça à opinião pública.
No caso de Iris, não se pode perguntar com qual recurso foi adquirido o tal avião King Air? Ou sobre uma área pública às margens da BR-153, que teria sido doada por Iris, na época em que era prefeito, a uma entidade filantrópica e depois teria sido repassada a particulares, propiciando lucros milionários para não se sabe quem. A denúncia foi feita por… Carlos Cachoeira, o que não invalida (talvez até aumente) o interesse do público em vê-la esclarecida.
Iris tem sim de ser perguntado também sobre seu aval a Paulo Garcia — para quem em 2012 pediu voto como sendo o melhor para “transformar” Goiânia — diante do desastre administrativo do petista na prefeitura da capital.
Vanderlan Cardoso também não pode ser inquirido sobre outro desastre administrativo, esse de seu apoiador Alcides Rodrigues, no governo do Estado? Ou sobre problemas com seu vice, professor Alcides, sobre quem se diz que teria sido vetado por evangélicos de aparecer ao lado do candidato? Foi vetado? Se sim, por quê?
Antônio Gomide não deve ser cobrado sobre, por exemplo, o fato de, como prefeito, sempre ter enaltecido as parcerias com o governo estadual, quando elogiava publicamente o governador Marconi Perillo, e agora, como candidato, Marconi tenha passado, segundo Gomide, a ser “perseguidor” de prefeitos de oposição?
São apenas alguns exemplos de temas incômodos Tem mais, muito mais. No Brasil, há um pretenso respeito à intimidade dos candidatos. Nessa ótica se diz que a vida privada deles não vem ao caso, pois isso não interfere na sua capacidade de gestor. Eu discordo. Como eleitor, quero saber se o candidato está envolvido em escândalos, se é que ele tem envolvimento em algum. Isso pode definir o meu voto.
A verdade é que falar de propostas é fácil. Elas estão em planos de governo que não dizem nada, na maioria das vezes são apenas palavras bem formatadinhas em Power Point, com recursos de editor de texto e gráficos. Não garantem nada. Principalmente quando não se definem as fontes de financiamento para essas propostas. Aí é jogar para a torcida.
O eleitor precisa saber quem são as pessoas que estão lhe pedindo o voto. Para isso, nada melhor que os temas espinhosos sejam perguntados. A negativa de resposta, o titubeio, o vacilo, o olhar vago que a pessoa acuada demonstra dão elementos para que o eleitor vá formando uma ideia mais precisa de quem é aquele candidato.
Perceba o leitor que estou falando de perguntas. Não de ataques infundados e acusações sem provas, material apócrifo e coisas assim. Como diz o ditado “perguntar não ofende”. Se alguém se mostra muito ofendido com uma pergunta, certamente tem culpa no cartório.
É melhor para o eleitor que o candidato seja exposto, seja desnudado politicamente. É dessa maneira que o eleitor poderá se identificar ou não com o candidato. E votar ou não nele.