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Sou chamado a responder rotineiramente a duas perguntas. A primeira é ‘haverá saída para o Brasil?’. A segunda é ‘o que fazer?’. Respondo àquela dizendo que há três saídas: o aeroporto do Galeão, o de Cumbica e o liberalismo. A resposta à segunda pergunta é aprendermos de recentes experiências alheias. — Roberto Campos

“Castello (Branco) é que me telefonou: ‘Liga a televisão que o [Carlos] Lacerda está falando. Eu quero que o senhor responda’. Eu fiz lá um discurso meio emocional e tal — o que é raro em mim — e o embasamento econômico dele era fácil de destruir, não tinha embasamento técnico. E eu citei lá um versículo da Bíblia em latim, que dizia que todo homem odiento será punido. E aí meus assessores — uma gente boa que está hoje aí, o Wilson Figueiredo, o Walter Fontoura, o Pedro Gomes —, eles falaram: ‘Mas que desastre, você vai falar com um grande comunicador e vai me citando latim’. Eu fiquei muito deprimido.”

“Aí, um dia, andando aqui na praia com a minha mulher, em Ipanema, de repente vem um negro enorme e me levanta assim para o ar — eu imediatamente pensei a manchete do dia seguinte: ‘Ministro esbofeteado por um desempregado’ e tal. Mas ele me põe no chão e diz assim: ‘É isso mesmo, o Lacerda matou o dr. Getúlio, caga latim nele’.”

Roberto Campos e Castello Branco: o governo viabilizou a gestão de Médici | Foto: Reprodução

Os textos acima são do economista e diplomata Roberto Campos, que a esquerda chamada de Bob Field, sugerindo que era “capacho norte-americano, e ele próprio, depois da Queda do Muro de Berlim, se chamava de Robarchev (porque teria previsto a queda do gigante soviético).

Em entrevista à “Folha de São Paulo”, em 1994, Roberto Campos lembrou a briga com Carlos Lacerda logo após o golpe de 1964. Campos era ministro do Planejamento do governo Castello Branco e estava implantando o Plano de Ação Econômica do Governo (Paeg). Lacerda ficou irado, escreveu inúmeras cartas ao presidente e foi à televisão criticar o plano e o ministro. Essa briga entre os dois foi o começo do fim da aliança lacerdista com os militares. Apesar das críticas, Castello manteve o Paeg.

Roberto Campos, que nasceu em 17 de abril de 1917, foi embaixador do Brasil em Washington, inclusive intermediou o encontro entre Lacerda e o presidente John Kennedy, em 1962. Ele participou da criação do BNDE, do Banco Central, do Banco Nacional de Habitação. Ajudou Juscelino Kubitschek a fazer o Plano de Metas. Era um liberal a serviço do Estado, digamos assim. Sobretudo, tenta liberalizar o Estado, deixando-o mais enxuto.

A partir da década de 1980, Roberto Campos atuou no Parlamento sendo eleito senador por Mato Grosso, seu Estado natal (por sinal, era parente do poeta Manoel de Barros). Durante a Assembleia Constituinte de 1988 foi o único a defender a economia de mercado.

Em 1992, Roberto Campos estava hospitalizado durante o processo de impeachment de Fernando Collor de Mello e fez questão de comparecer à votação na Câmara, de cadeira de rodas, para votar pela saída do presidente.

Roberto Campos morreu em 9 de outubro de 2001, aos 84 anos.