Como seria uma eleição disputada entre um humano e uma inteligência artificial?

27 junho 2024 às 18h41

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Você já imaginou uma eleição sendo disputada entre uma inteligência artificial e um humano? É sobre essa possibilidade que Flávio Izhaki nos convida a pensar no livro “Movimento 78”. O livro foi escolhido para o Clube de Literatura Contemporânea da Palavrear pela escritora Paula Fábrio¹, que também tem obras lidas no Clube.
A atual literatura brasileira nos permite pensar cenários prováveis (e improváveis) e nos coloca para questionar o mundo que vivemos e vamos deixar. Por isso, acredito na força e na necessidade de clubes de leitura. Pensar nossa sociedade do ponto de vista contemporâneo significa elaborar soluções mais eficazes para problemas imediatos e futuros.
Devemos ler os livros dentro daquilo que o autor nos propõe. Em “Movimento 78”, por exemplo, Flávio Izhaki não se propõe a achar uma resposta para o problema das inteligências artificias, tais como seu controle ou regulamentação. Também não se propõe a encontrar quem está por trás das inteligências artificiais ou até mesmo quais problemas futuros elas poderão causar.
O que Flávio Izhaki se propõe aqui (e a meu ver, cumpre bem) é mostrar que, para além de toda tecnologia e automação, nada poderá substituir os afetos humanos, nossa memória e capacidade de criar e manter vínculos.
Vários pontos são abordados para refletir sobre o uso dessa inteligência: no esporte, na medicina, nas eleições. A proposta do autor não é se aprofundar dar um desfecho para o drama dessa assustadora eleição. Nem espere por respostas ao ler o livro.
Sua proposta é fazer refletir sobre esse estranho mundo que estamos habitando e que vamos deixar. Izhaki questiona e cobra pela utilização indevida que está aí, a bel-prazer dos detentores do dinheiro e poder. O autor se propõe a nos fazer questionar sobre esses usos indiscriminados, onde tudo e todos podem ser substituídos e onde tudo e todos passam a ser produto.
O personagem principal, Kubo, luta para demonstrar como pode ser perigoso um governo baseado em equações matemáticas e inteligência artificial, e os riscos que isso possa causar. No livro, Flávio Izhaki nos faz pensar sobre como seria um mundo futuro em que a maioria dos humanos já estão em uma espécie de extinção e o mundo quase todo dominado e comandado pela inteligência artificial.
Trazendo para o real, já temos uma geração bem diferente da nossa, que não sabem como era o mundo antes do advento do celular, computadores e tablets. E como será a geração futura? Esse futuro já está acontecendo. A maior varejista do mundo já é um exemplo claro e assustador: comprar um livro “baratinho” ali não é apenas uma compra, e sim o uso indiscriminado de seus dados.
Esse presente hiperconectado, onde as pessoas acabam por desumanizar-se, é mostrado através de Kubo, cujo objetivo de vencer a eleição contra a IA, é uma última e desesperada possibilidade de reumanizar a sociedade.
É uma leitura válida quando nos faz pensar sobre questões contemporâneas a nós. E com uma escrita simples, ágil, mas reflexiva, é uma leitura que irá nos conduzir em uma tarde.
Nas sutilezas da escrita de Flávio que vemos como essas inteligências artificiais talvez nunca conseguirão substituir o que temos de mais humano: nossas confusões mentais, nossas alegrias, lembranças afetivas, ansiedade, medo, recuo, coragem e amor.
Aquilo que nos faz mais humanos: a afetividade. Isso nada, nunca, poderá substituir.
O autor nos faz refletir sobre o que nos torna humano: nossa capacidade de guardar memórias, nossas afetividades. Nossas escolhas com base nos afetos.
E é isso que o Clube de Literatura pode trazer hoje: as experiências de troca com seus pares sobre um livro como esse.
Então vem participar de um encontro com a gente. Tenho certeza que o algoritmo da grande varejista jamais vai conseguir substituir o afeto que você vai encontrar aqui.
O Clube de Literatura Contemporânea da Palavrear acontece sempre na última quarta feira de cada mês, a partir das 18h30, e fica meu convite para você participar.
¹O livro “Estudos sobre o fim: bangue-bangue à paulista”, de Paula Fábrio, foi um livro que chamou a atenção pelas possibilidades de interpretações para questões sociais tão corriqueiras no Brasil.