Há esquerdistas que dizem que Cuba é uma democracia. Trata-se de uma profissão de fé. Não à toa o filósofo britânico John Gray avalia o marxismo como uma religião teórica e politicamente meio bastarda, porque seus pais, o cristianismo e o positivismo, não aceitam “registrá-lo”. Na verdade, sabem os esquerdistas mais cerebrados, a ilha da dinastia Castro, Fidel e Raúl, é uma ditadura cruenta. Digamos que os jornalistas Rui Falcão e Franklin Martins morassem em Cuba e, de repente, decidissem: “Vamos lançar um jornal impresso”. Não publicariam. Primeiro, porque o governo não permite. Segundo, porque não teriam papel. O papel é controlado pelos comunistas.

O impresso e o digital são como o rádio e a televisão: coexistem e, provavelmente, o primeiro não será o novo dinossauro. Mas em Cuba aquele indivíduo que planeja publicar alguma coisa tem de pensar em termos digitais. Por isso, a jornalista e blogueira Yoani Sánchez vai editar, a partir de quarta-feira, 21, o jornal digital “14ymedio”. Será, afirma, “um espaço para falar de Cuba aqui dentro de Cuba”. Corajosa, pois enfrentar a famiglia Castro não é para qualquer um, a editora do blog Generación Y pretende ampliar a cobertura do que ocorre em Cuba. “Várias pessoas de nossa equipe de trabalho já receberam os primeiros avisos de advertência dos órgãos de segurança do Estado. Será um caminho difícil porque a propaganda oficial tentará nos satanizar”, diz a jornalista. Não custa lembrar que o serviço secreto cubano, o G2, foi treinado pela Stasi, da Alemanha Oriental (a história está no livro “O Homem Sem Rosto”, as memórias de Markus Wolf, da Stasi).

O estranho título “14ymedio” significa, relata o Portal Imprensa, o seguinte: 14 é o número do apartamento de Yoani Sánchez, local da criação do projeto, e diz respeito a 2014. “O ‘y’ refere-se ao vocábulo que a acompanhou ao longo dos anos, enquanto ‘medio’ é por se tratar de um veículo para propagar informações.”

No país em que o principal jornal, o “Granma”, é porta-voz oficial do governo e, portanto, do Partido Comunista Cubano, o jornal deveria ser chamado de “Tostão”. O “Tostão” contra o “Granma”. Uma coisa é certa: a destemida blogueira vai deixar os ditadores apavorados e os cubanos poderão, aos poucos, saborear o que é imprensa crítica, à qual não têm acesso desde 1959, há 55 anos. “14ymedio” é uma luz, ainda que tênue, que assinala que o comunismo, falido e sem autoridade (o povo é controlado pela violência institucional), não dá mais conta de segurar a rebeldia dos cubanos e esconder e maquiar a realidade.