Uma saída, já que não quer mandar repórter para o Iraque e para a Síria, é a Globo pôr Demétrio Magnoli para fazer análises sobre o que está acontecendo no Oriente Médio

Cecília Malan: repórter competente, mas correspondente internacional precisa estar próximo dos fatos
Cecília Malan: repórter competente, mas correspondente internacional precisa estar próximo dos fatos. Jornalismo de gabinete sobre o Iraque não funciona

O jornalismo internacional da TV Globo está ficando para trás e nem mesmo seu atento diretor de Jornalismo, Ali Kamel, parece perceber o que está acontecendo. Na terça-feira, 1º, o apresentador Chico Pinheiro — o mister Simpatia da maior do “Bom Dia Brasil” — noticiou que forças iraquianas, com o apoio dos Estados Unidos, lutam para retomar Mosul do Estado Islâmico. Ele convocou Cecília Malan, baseada em Londres, para narrar ou explicar os acontecimentos. A repórter relatou os fatos e a Globo apresentou imagens de outras redes de televisão. Qual o problema, então?

Ora, se era para trabalhar com imagens de outras redes de televisão e com informações de terceira, não exclusivas, era mesmo preciso Chico Pinheiro, um jornalista qualificado, passar a palavra para Cecília Malan, que, embora repórter capaz, não é uma analista refinada? Para o telespectador, aquele que quer entender os fatos de maneira mais ampla, teria sido muito mais produtivo se Chico Pinheiro tivesse convocado o analista Demétrio Magnoli, que conhece muito bem os problemas da região. Ele poderia conectar fatos e, a partir da notícia básica, alimentar o telespectador com o contexto que poucas reportagens de televisão fornecem.

Demétrio Magnoli não é nada bonito, mas explica, de maneira competente, a política internacional. É uma saía para a TV Globo, se quer mesmo fazer jornalismo de gabinete
Demétrio Magnoli não é nada bonito, mas explica, de maneira competente, a política internacional. É uma saída para a TV Globo, se quer mesmo fazer jornalismo de gabinete

Passar a palavra para Londres, para explicar um fato que está ocorrendo no Iraque, significa, insisto, que a Globo não está percebendo o que está acontecendo no mundo da comunicação. Os telespectadores brasileiros, o que têm interesse — e não precisam ter dinheiro sobrando —, têm acesso a informações internacionais de primeira linha, nos sites de alguns jornais, como “The Guardian”, “New York Times” e “Washington Post”, e por intermédio de redes de televisão de vários países, como a mais conhecida CNN. Detalhe crucial: tais publicações e redes de tevê enviam correspondentes, em geral altamente preparados, e repassam informações atualizadas e de qualidade para seus leitores e telespectadores. Ao mesmo tempo, mantêm analistas para explicar o quadro geral, porque entendem, corretamente, que um problema tem raízes, que precisam ser explicadas.

Ignorando o que está acontecendo no mundo das comunicações, que foram de fato globalizadas, a TV Globo, e não só ela, subestima seu telespectador. Acionar Cecília Malan e nada é a mesma coisa. Não porque se trata de uma repórter incompetente — longe disso, é competente (e bela) —, e sim porque, de sua redação em Londres, não consegue, por mais esforçada que seja, apresentar um painel vívido do que está acontecendo no Iraque e na Síria. A cobertura acaba sendo fria e as reportagens se tornam, com imagens alheias, mais “recortagens”.

Surpreende o fato de que a Globo está investindo em jornalismo de gabinete, apesar de sua estrutura poderosa e profissional.