Autor do livro “Cadeia de Comando” afirma que o criador da Al-Qaeda estava inválido e que agentes do Paquistão, interessados no prêmio de 25 milhões de dólares, facilitaram o acesso à sua casa

A história do assassinato de Osama bin Laden, o criador da Al-Qaeda, apesar dos livros escritos por jornalistas, ainda é uma história oficial. Não se tem informações precisas, sobretudo nuançadas, sobre o que de fato aconteceu. É isto que permite a contestação de Seymour M. Hersh [foto acima], Prêmio Pulitzer de 1970 e jornalista respeitado — não é controlável pelos múltiplos tentáculos do Estado —, publicada na revista “London Review of Book”. A fonte de Hersh é anônima — seria “um aposentado oficial da inteligência”, mas o repórter garantiu que ouviu outras pessoas —, o que não desqualifica, por si só, o texto. Segundo o jornalista, Bin Laden “já era um prisioneiro ‘inválido’ das forças paquistanesas desde 2006, tendo sido mantido refém para forçar a interrupção das atividades dos extremistas no Paquistão e no Afeganistão” (usa-se texto do UOL).

Interessados em parte da premiação de 25 mil dólares, oferecida pelo governo americano, agentes paquistaneses teriam relatado o paradeiro de Bin Laden, em Abbottabad, no Paquistão, onde foi localizado e morto, em 2011, por tropas especializadas dos Estados Unidos. Americanos e paquistaneses teriam encoberto a história da parceria. A energia da casa do terrorista teria sido cortada pelos paquistaneses.

O assassinato de Bin Laden, segundo Hersh, teria sido “absolutamente premeditado”. Os militares americanos tinham ordens expressas para matá-lo. “A verdade é que Bin Laden era um inválido”, disse o repórter, reproduzindo a versão de sua fonte. Ele não estaria mais no comando da Al-Qaeda. “A Casa Branca teve de dar a impressão de que Bin Laden ainda era importante operacionalmente. Senão, por que motivo matá-lo?”, anota Hersh.

Contestação da Casa Branca

A repercussão internacional levou a Casa Branca, por intermédio de seu porta-voz,  Ned Price, a reagir rapidamente. “Há muitas incorreções e afirmações sem fundamento nessa história para esclarecer cada uma. A noção de que a operação que matou Bin Laden [foto acima] não foi uma missão unilateral norte-americana é falsa. Como dissemos na época, o conhecimento dessa operação foi restrito a um pequeno grupo de oficiais veteranos dos Estados Unidos. O presidente logo decidiu não informar nenhum outro governo, incluindo o do Paquistão, que não foi avisado até depois da operação. Éramos e continuamos a ser parceiros do Paquistão no nosso esforço conjunto para destruir a Al-Qaeda, mas aquela foi uma operação americana do começo ao fim”, contra-atacou Ned Price.

O UOL diz que “Hersh é alvo de críticas pelo uso de fontes anônimas” em suas reportagens. Como o governo americano joga pesado contra funcionários públicos que passam informações “secretas” a jornalistas, é muito difícil, em alguns casos impossível, não usar fontes anônimas. O que se deve questionar é se as informações divulgadas por Hersh, durante sua longa carreira, são verdadeiras ou falsas. Um repórter, mesmo quando dos mais qualificados, às vezes erra; porém, se erra sempre, o caso é grave. É o caso de Hersh? Não é. Sua média de acertos é muito superior. “Cadeia de Comando — A Guerra de Bush do 11 de Setembro às Torturas de Abu Ghraib” (Ediouro, 400 páginas) é um dos livros mais celebrados de Hersh.

Autor do livro “Procurado — Do 11 de Setembro ao Ataque a Abbottabad, os Dez Anos de Caça a Osama bin Laden” (Manole, 384 páginas) e analista de segurança da CNN, o jornalista Peter Bergen disse que a reportagem é “sem sentido, desmentida por várias testemunhas, fatos inconvenientes e simples senso comum”. O general paquistanês aposentado Assad Durrani, citado por Hersh e consultado por Bergen. Durrani, sugere que não há “qualquer evidência” de que o governo do Paquistão soubesse que Bin Laden “estava escondido” no país. Mas admitiu que a informação revelada por Hersh é “plausível”.

Uma coisa é certa: governos mentem; em alguns casos, mentem muito. Hersh pode até errar, eventualmente, mas não é um cascateiro.