Se Kamala Harris for eleita, Elon Musk planeja substituir Trump como chefão da direita americana?
08 setembro 2024 às 00h00
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Processos judiciais: fortuna garante boas defesas
Elon Musk, dono do X (ex-Twitter) e da Tesla, aprecia processar, mesmo quando parece não ter razão, e, dada sua imensa fortuna, não receia ser levado à Justiça. Suas empresas movem vários processos contra “rivais” comerciais nos Estados Unidos. De acordo com uma reportagem do “New York Times”, o bilionário procura até juízes mais “acessíveis”, em jurisdições nas quais não deveriam ser movidas as ações.
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Elon Musk: chefão da direita nos Estados Unidos?
Disputas judiciais à parte, o que quer, realmente, Elon Musk? Ganhar dinheiro, muito mais dinheiro? Também, mas não só. É bem provável que, se Donald Trump for derrotado por Kamala Harris — o que deve retirá-lo da política americana, em termos de disputas presidenciais —, Elon Musk possa substitui-lo como líder da direita americana radical. O X pode ser sua principal plataforma de campanha. Talvez já esteja sendo usado para isto. (Ele não pode ser candidato a presidente, por não ter nascido nos Estados Unidos, mas pode liderar a direita americana.)
Pode ser que Elon Musk não migre para a política, em termos de disputa, mas já está militando pró-Trump. Ao contrário do que diz o marketing do X, o empresário não tem a mínima preocupação com liberdade de expressão. Quer aumentar a conta bancária e, sobretudo, abrir espaço para a direita se expressar, nos termos mais radicais e anti-humanistas possíveis, livremente. Por quê? Insistindo: talvez porque tenha um projeto político pessoal. Para Trump, no momento; para si, no futuro (talvez queira o “título” de chefão da direita americana).
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Liberdade de expressão só para Elon Musk e aliados?
O “Estadão” republicou a reportagem “X: Musk tira sede social de São Francisco e autoridades estão ‘aliviadas’ com mudança”, assinada pelas repórteres Kate Conger e Heather Knight, do “New York Times”.
Ao se instalar em São Francisco, o Twitter obteve redução de impostos. A prefeitura considerou que, se a empresa fosse mantida na cidade, poderia gerar mais empregos e, ao mesmo tempo, contribuir para atrair novos empreendimento, o que ocorreu.
Porém, ao comprar o Twitter, transformando-o em X, Elon Musk promoveu uma série de demissões — desconsiderando o acordo que havia sido feito pelos gestores anteriores. Os funcionários que ficaram, bem menos do que antes, estão sendo transferidos, dos bairros do centro, “para escritórios em Palo Alto e San José, na Califórnia”. O empresário vai instalar uma nova sede no Texas.
Além dos impostos, Elon Musk é crítico da “tolerância” das autoridades políticas de São Francisco com as políticas de gênero. Em julho, de acordo com o “Times”, anunciou “que mudaria a sede do X para Austin, no Texas, depois que a Califórnia aprovou uma leia que proíbe os distritos escolares de exigir que os professores notifiquem se seus filhos mudarem sua identificação de gênero”. Afinal, cadê o indivíduo “liberal” que defende a liberdade de expressão?
O fato é que a prefeita de San Francisco, London Breed, depois de se encontrar com Elon Musk, decidiu que não vai se dobrar às suas pressões. “Ela disse que não ofereceu nada ao X para que ficasse”, relata o “Times”. A gestora municipal frisou, na síntese do jornal, “que a agenda política de Musk o havia expulsado de São Francisco”. De novo: o príncipe tecnológico só defende a liberdade de expressão para si e para a direita extrema que tem língua de punhal?
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Posição antissemita de Elon Musk afasta anunciantes
No dia 15 de novembro de 2023, Elon Musk postou, no X, que a teoria da conspiração “de que os judeus apoiavam a imigração de minorias para substituir as populações brancas era ‘a verdade real”. Publicar mentiras, de maneira deslavada, faz parte de uma defesa racional e civilizada da liberdade de expressão? Claro que não.
Por causa do post antissemita, segundo os repórteres Kate Conger e Ryan Mac, do “New York Times” (a reportagem foi traduzida pelo “Estadão”), o X perdeu milhões de dólares em anúncios. Integral ou parcialmente, se afastaram do Twitter IBM, Apple, Disney, Amazon, Coca-Cola, Microsoft, Airbnb, Netflix e Uber. “A publicidade na plataforma nos Estados Unidos caiu quase 60%” em 2023, frisa o jornal americano.
Alguns clientes do X migraram para o LinkedIn e para o TikTok. Elon Musk acusa o grupo de vigilância de mídia Media Matters, de esquerda, de prejudicar sua empresa na absorção de anúncios. O “Times” sublinha que o Media Matters “mostrou que anúncios no X de empresas como IBM e Apple apareciam ao lado de posts que promoviam conteúdo nacionalista branco e nazista”.
(Se Elon Musk perdeu dinheiro com o X, pelo qual pagou 44 bilhões de dólares, qual é, então, o seu verdadeiro jogo? Talvez se tornar político. Consta que, se Trump for eleito presidente, poderá ter um cargo de conselheiro ou secretário [ministro] no governo.)
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Livro mostra como Elon Musk destruiu o Twitter
Dois repórteres do “Times”, Kate Conger e Ryan Mae, escreveram um livro, “Limite de Caracteres — Como Elon Musk Destruiu o Twitter” (Todavia, 488 páginas, tradução de Bruno Mattos, Christian Schwartz, Marcela Lanius e Mariana Delfini), que será lançado no Brasil em outubro deste ano (já pode ser encomendado no site das livrarias).
O editor da Todavia, Flávio Moura, afirma que “os autores fizeram uma reportagem exemplar, com detalhes minuciosos sobre a conduta de Musk desde que comprou o Twitter e o colocou a serviço do extremismo político e da desinformação”.
O livro dos repórteres americanos, considerado seminal para entender como Elon Musk está transformando o X numa plataforma política — com amplo espaço para a direita e a extrema-direita globais (e também outras correntes ideológicas, à esquerda). O leitor, segundo a editora, poderá acompanhar, lendo a obra, “o caos que se instalou quando o bilionário assumiu a empresa com sanha revolucionária, na companha de seu time de advogados, investidores e banqueiros impiedosos e bajuladores”.
Num breve comentário, a “Folha de S. Paulo” diz que “o título da obra, ‘Character Limit’, é um jogo de palavras que se refere tanto à limitação de um tuíte [nota do Jornal Opção seria agora “xiite”?] quanto uma alfinetada no caráter do empresário”.
Release da editora Todavia informa: “Com base em documentos e horas e horas de entrevistas, os autores reconstituem o clima irrespirável das reuniões, as demissões sumárias, os rompantes de vaidade, o desprezo pela moderação de conteúdo, a ascensão do extremismo político, o caos, enfim, que se instalou quando o bilionário assumiu. Em pouco tempo, o Twitter perdeu mais de metade de valor de mercado e desapareceu para dar lugar ao X, um projeto com a cara e a alma do novo dono”.
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Alexandre de Moraes não fere a liberdade de expressão
Democracia é isto: dizer o que se quer, de preferência com responsabilidade e civilização. Mas as redes sociais contribuem para retirar do interior de milhares de indivíduos, ligados ou não a organizações políticas, de esquerda ou de direita, uma espécie de monstro. Este “ser”, que avalia que pode dizer qualquer diatribe sobre outros indivíduos, precisa, eventualmente, ser contido. Por aqueles que aplicam as leis: juízes, desembargadores e ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF).
Ao exigir que o X tenha uma sede no Brasil, para que possa ser responsabilizado por aquilo que divulga — quem divulga é corresponsável pelo publicado —, o ministro Alexandro de Moraes, do STF, não está cobrando muito. Está exigindo pouco. Está cumprindo as leis de seu país.
Quando o leitor for atacado no X, com os maiores impropérios, a quem vai recorrer? Claro, à Justiça. Mas como o tentáculo do Judiciário poderá alcançar uma empresa que não tem representação no Brasil? Há indivíduos que defendem a liberdade de expressão absoluta, sem limites legais, até serem criticados com extrema virulência ou ser vítima de fake news.
A Embaixada dos Estados Unidos ousou fazer críticas à ação de Alexandre de Moraes, que só está defendendo democracia com responsabilidade. A história mostra que, em defesa dos interesses políticos e econômicos de seu país, embaixadores americanos participaram ativamente dos golpes militares no Brasil e no Chile. De alguma maneira, os Estados Unidos são corresponsáveis pelas ditaduras dos generais brasileiros e do general chileno Augusto Pinochet.
Recentemente, com seu conhecimento e coragem, Alexandre de Moraes e quase todo o Supremo Tribunal Federal (Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux) colaboraram, de maneira decisiva, para impedir que o bolsonarismo — que defende Elon Musk (o Kissinger das big techs) — derrubasse a democracia e instalasse uma ditadura no Brasil.