Jogos narrados por Fiori Gigliotti tinham 22 atletas em campo e um craque do lado de fora. Pode-se falar em dois espetáculos

Livro resgata a história de uma das grandes vozes da narração esportiva no rádio patropi | Foto: Divulgação

Sou “filho” do rádio e apaixonado pela narração esportiva de Jorge Curi (1920-1985), Waldir Amaral (1926-1997, nascido em Pilar de Goiás), Antônio Porto, Fiori Gigliotti, e José Carlos Araújo (em Goiás, há o incontornável Edson Rodrigues). Portanto, parem as máquinas! Ah, não há mais máquinas?! Pois bem: parem os computadores — que, sim, são máquinas. Porque vou me concentrar para ler, numa só sentada, o livro “Fiori Giglioti — O Locutor da Torcida Brasileira” (Onze Cultural, 304 páginas), de Mauro Beting e Paulo Rogério.

Nunca me esqueço de que, no rádio, o futebol ganha duas “caras” ou “cores”. Porque o rádio esportivo é jornalismo, teatro e entretenimento. O narrador e o comentarista, para além do jornalismo, são verdadeiros atores. Na verdade, exageram, para emocionar o ouvinte e convidá-lo a ser um participante — o que não significa que mentem. Ouvir Jorge CurI, Waldir Amaral, na Rádio Globo, e Fiori Gigliotti, na Rádio Bandeirantes, era um êxtase. Os três eram fabulosos. Na Rádio Globo havia também o comentarista de arbitragem, Mário Vianna (1902-1989) — com dois “enes”, é claro. Ouvi-lo gritar que o árbitro — nós falávamos “juiz” — era ladrão (“lamano”) ou dizer “Gol le…gal” era impagável. Mário Vianna havia sido árbitro e chegou a apitar em Copa do Mundo (a Fifa o rifou porque fez denúncias apontando corrupção). Não dá para não citar João Saldanha — o João Sem Medo.

Fiori Gigliotti: o craque que brilhava fora do campo e jogava com a voz | Fotos: Reproduções

Fiori Gigliotti (1928-2006) era um narrador clássico, falava bem, raramente errava. Dizia “abrem-se as cortinas e começa o espetáculo”. E era verdade: eram dois espetáculos — o jogo em si e sua narração tão emocionante quanto precisa. Se a partida estivesse enrolada, ele falava “e o tempo passa…, torcida brasileira”. Quando estava ouvindo, quase como se estivesse assistindo, lembro-me que assentia com a cabeça. Eu e meus amigos, amantes de futebol — chegávamos a torcer para times de vários Estados e a pregar posters dos clubes nas paredes de nossos quartos —, não percebíamos que a pronúncia do sobrenome era “Giliotti” e falávamos como estava escrito, pronunciando o “g”.

Narração de Santos x Corinthians em 1964

Leia a sinopse da editora: “‘Fiori Gigliotti — O Locutor da Torcida Brasileira’ é uma obra literária sobre a vida e carreira da lenda do rádio esportivo. Escrito por Mauro Beting e Paulo Rogério, o livro tem prefácio de Milton Neves. Passados 13 anos do falecimento, este livro pretende eternizar a memória do dono dos bordões mais conhecidos pelos fanáticos por futebol: ‘o tempo passa’, ‘crepúsculo de jogo’, ‘abrem-se as cortinas e começa o espetáculo’ e outras frases marcantes que faziam parte das suas transmissões. Os dourados anos de Bandeirantes, a tentativa de eleger-se deputado e o recomeço na Record são alguns assuntos abordados pelos autores. O início da carreira, os amores e as histórias de pescaria são ingredientes extras que certamente aproximarão os fãs do saudoso ídolo. Recebeu mais de duzentos títulos de cidadão honorário, principalmente pelo interior de São Paulo, trabalhando como locutor desde 1947 atuou nos prefixos da Rádio Clube de Lins (São Paulo), Rádio Cultura de Araçatuba (São Paulo), Rádio Bandeirantes, Rádio Panamericana (atual Jovem Pan), Rádio Tupi e Rádio Record. Seu último trabalho foi como comentarista na Rádio Capital de São Paulo. Foi na transmissão da Rede Globo da partida inaugural da Copa do Mundo de 2006, Alemanha vs. Costa Rica, um dia após a sua morte, que o mestre Fiori recebeu homenagem de Galvão Bueno, que iniciou a narração com a inesquecível frase do grande Fiori: ‘Abrem-se as cortinas e começa o espetáculo’”. (E-mail: [email protected])

Fiori Gigliotti narrando jogo Santos x Milan