Carlos Willian Leite

Especial para o Jornal Opção

O cenário global de tráfego online está navegando por mares tempestuosos, uma tempestade que tem ressonância acentuada no Brasil, onde se detecta um declínio perturbador na audiência de milhares de sites e portais. Especialistas do setor e desenvolvedores de fóruns técnicos relatam uma queda acentuado de até 82% no fluxo de audiência entre o fim de maio e o início de junho. Esse quadro tem gerado um sem-número de conjecturas e teorias tentando decifrar o enigma. E o enigma se chama Google.

Algumas dessas teorias sugerem que o Google esteja retaliando as demandas por remuneração de conteúdo feitas pelos jornais e as políticos dos países no combate às fake news (estas, em muitos casos, rendem audiência). No Brasil, especula-se que esse declínio seria uma resposta direta ao Projeto de Lei 22, que propõe regulamentações mais rigorosas para gigantes tecnológicos como Google e Meta.

Mesmo que o Google seja conhecido por realizar mudanças frequentes em seu algoritmo, a queda presenciada neste período é apontada como uma das maiores já registradas por monitores internacionais. Ainda assim, o Google não confirmou publicamente alterações ou mudanças (mas o assunto é discutido nas redações e empresas que gerem sites). Atualmente, o tráfego global depende em mais de 90% dos mecanismos de busca, com o Google dominando indiscutivelmente a área. Vence, de longe, o Bing, da Microsoft.

As alterações mais expressivas no algoritmo do Google ocorrem sem aviso prévio. Um exemplo disso ocorreu em 22 de maio deste ano, quando monitores globais do Google detectaram volatilidade indicativa de uma atualização no sistema de ranking da empresa. Frise-se que essa mudança também tenha sido negada pelo Google.

Ferramentas de monitoramento, como o Rank Ranger, vêm registrando uma série de mudanças na estrutura do Serp (Search Engine Results Page — Página de Resultados do Mecanismo de Pesquisa), o que pode fornecer uma explicação para a queda drástica na audiência dos sites e portais de conteúdo. De acordo com o mesmo Rank Ranger, o dia 6 de junho parece ter sido o ápice dessas oscilações que começaram em maio, com um aumento significativo na volatilidade e alterações nos resultados de busca e no feed do Discover.

Vários fatores poderiam ser os responsáveis por essa queda vertiginosa na audiência. Um deles pode ser a recente popularização do Discover, que começou a incluir no feed do Chrome e nos aplicativos do Google sites de menor relevância e com conteúdo duvidoso, incluindo sites patrocinados e spams. Além disso, a transição do Google Analytics Universal para o Google Analytics 4 — que acontecerá em 1 de julho —, pode ter desempenhado um papel importante, já que as métricas para medir a audiência estão em processo de mudança e ainda não foram totalmente assimiladas.

Esta situação destaca o controle quase imperativo que o Google exerce sobre os meios de comunicação, similar ao que ocorreu com o Facebook, que evoluiu de uma plataforma social para um veículo de mídia. Em 2014, quando o Facebook começou a limitar o alcance do conteúdo, jornais importantes — como “NYT”, “Folha de S. Paulo” e “Estadão” — se retiraram da plataforma. Naquela época, o Facebook era responsável por apenas 30% do tráfego de audiência no Brasil. O Google detém o monopólio de 70% de toda a audiência global.

A empresa parece seguir os mesmos passos do Facebook. Basta uma rápida visita a qualquer página de busca para notar a quantidade de conteúdo patrocinado que se destaca. Tal realidade levanta questões pertinentes sobre a monetização e a sustentabilidade dos negócios online, especialmente para aqueles que dependem majoritariamente do tráfego vindo dos motores de busca.

Inermes, jornais, revistas e blogs não querem passar recibo a respeito da queda de audiência. Por isso não estão discutindo o assunto. Comenta-se que um importante portal caiu de 80 milhões de acessos mensais para cerca de 30 milhões. Mas o problema é de todos e resulta da dependência, em termos de audiência, do Google (que se tornou uma superpotência, como se fosse um país da estirpe dos Estados Unidos e da China).

Carlos Willian Leite, jornalista e poeta, é editor da “Revista Bula”. Foi editor do Opção Cultural.