Nos últimos tempos, Vera Magalhães ficou marcada como a jornalista agredida por Jair Bolsonaro e seu clã. No debate dos candidatos ao Planalto promovido pela TV Cultura, no ano  passado, recebeu uma resposta mais do que rude do então presidente, ao questionar as informações falsas sobre a cobertura vacinal contra a Covid-19 – e, é preciso lembrar, o questionamento nem a ele era direcionado, mas a Ciro Gomes (PDT).

Mas a profissional, de competência reconhecida – haja vista os veículos por que passou e as funções que desempenhou em sua carreira –, já havia ficado “célebre” nas redes sociais anos antes, por causa de um comentário que fez acerca do então juiz Sergio Moro, quando a Operação Lava Jato ainda surfava nas ondas da alta popularidade.

“Foi uma jogada de enxadrista do juiz Sergio Moro. Eu tenho a impressão que ele, todo dia, quando chega do trabalho em Curitiba, ele põe aquele paletó preto, a camisa preta, a gravata preta que o Andreazza [Carlos Andreazza, jornalista e então colega de programa] adora, num canto e vai para um tabuleiro de xadrez e estuda qual vai ser o próximo passo do oponente dele e aí ele dá uma encurralada.”

A fala de Vera foi em seu período como comentarista da Jovem Pan e ocorreu provavelmente entre 2016 e 2017. Moro, obviamente, ainda era juiz e a Lava Jato ainda estava em seu auge, procurando “abater” seu principal alvo, o então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Mais do que um comentário político, a declaração da jornalista exala fascinação pelo personagem. Imagens que, confrontadas hoje com a realidade de um Sergio Moro entregue à política como senador do Paraná, depois de fracassar como ministro de Jair Bolsonaro, como pré-candidato à Presidência e como postulante ao Senador por São Paulo, só poderiam se tornar o que viraram: um meme clássico.

E o meme se fez pela desconstrução do “mito” Moro, principalmente depois de se envolver com o “mito” original, Jair Bolsonaro, a quem o então juiz beneficiou diretamente desde a pré-campanha de 2018, ao mandar prender Lula, o favorito nas pesquisas às eleições presidenciais.

Largou a carreira de juiz e tornou-se ministro da Justiça do próprio favorecido, de quem se tornaria desafeto anos depois, em 2020, por não aceitar a demissão do chefe da Polícia Federal, seu aliado, Maurício Valeixo. Moro se demitiu, disse que apresentaria provas irrefutáveis da interferência de seu ex-chefe na PF.

“Provas” nunca foram o forte de Moro, e isso se mostrou mais uma vez no episódio envolvendo Bolsonaro. Mas a imagem do ex-juiz e ex-ministro já estava chamuscada definitivamente desde o vazamento de suas mensagens com procuradores da Lava Jato, no ano anterior, que colocaram em xeque sua imparcialidade na condução da operação. Na imprensa, o escândalo, apelidado de “Vaza Jato”, foi explorado bem aquém de seu potencial destruidor.

Não era novidade, assim como continua não sendo. A grande mídia brasileira parece se recusar a fazer uma crítica séria sobre Sergio Moro. Pelo contrário, a maioria dos veículos de comunicação parece sempre predisposta a aplaudi-lo e promover sua imagem. Isso, apesar de todos os fracassos colecionados pelo cidadão Sergio Moro, que com seu comportamento antiético na Justiça e errático na política, amealhou uma série de inimigos que poderiam fazer dele nada mais do que um enfeite no Senado Federal.

Se assim ocorresse, não seria o fim – desde que o personagem tivesse tenacidade e brilho político suficiente para dar a volta por cima. Moro, como juiz, foi um ídolo com pés de barro, embora sua trajetória tenha sido indubitavelmente marcante, já que pôs um ex-presidente da República na cadeia, ainda que com um “modus operandi” bem peculiar. Como político, o desastre que foi sua pré-campanha à Presidência e o fato de só ter tido o Senado por seu Estado como “prêmio de consolação” servem de evidências da falta de perspectiva nesse cenário.

Quem pode salvar Moro? Exatamente quem sempre o “salvou”: a grande imprensa, que, ainda que em decadência, tem seu poderio. Antipetista por vocação e antibolsonarista por sobrevivência, ela parece continuar vendo no ex-juiz uma tábua de salvação. Não há outra explicação para tanta condescendência com o tipo.