Um dos romances do escritor americano foi inspirado em livro de Machado de Assis

Do escritor Philip Roth, que morreu aos 85 anos, de insuficiência respiratória — cáustico, diria: “Na verdade, de velhice”, que, como assinalou, “é um massacre” —, pode-se dizer que escreveu excelentes romances. O que não se pode sugerir, por certo, é que tenha produzido romances ruins. Menores, sim; ruins, não.

Philip Roth: um dos autores do Grande Romance Americano

No panteão certamente figuram “O Complexo de Portnoy”, “O Teatro de Sabbath”, “Pastoral Americana. Pelo primeiro, chegou a ser atacado como “filonazista”. O romance não tem paixão alguma pelo nazismo, só não trata o mundo judaico — Roth é judeu — de maneira idílica. É um retrato fidedigno e nuançado das relações numa família de judeus — sem contemplação. Vale ler na sequência do “Complexo…” outro de romances, “Lição de Anatomia” (tão divertido, ferido e inteligente quanto).

Os apressados avaliam que “O Teatro de Sabbath” aproxima-se, por vezes, da literatura erótica e, até, pornográfica. Nada a ver. Michey Sabbath é um personagem tão fabuloso — gente como a gente (a diferença é que não fomos descritos de forma tão ampla e, quiçá, impiedosa) — quanto Leopold Bloom. São homens comuns e, apesar disso, acabam, na construção de Roth e James Joyce, se tornando incomuns. A habilidade literária de Roth, sua mestria narrativa, resulta num verdadeiro encantamento. Pode-se constatar que há “leitores de Roth”. São fieis, uma confraria. São quase fãs.

Philip Roth: autor da obra-prima “O Teatro de Sabbath”

“Pastoral Americana” é um de seus romances mais bem construídos (leia sobre o livro no linK: https://www.jornalopcao.com.br/colunas-e-blogs/imprensa/complexidade-das-ideias-e-da-linguagem-da-literatura-de-philip-roth-e-avessa-ao-cinema-98787/). A palavra sensacional talvez seja tímida para defini-lo.

Entre os romances menores, digamos assim, incluiria o importante “Homem Comum”. É sobre todos nós, os que estão velhos, os que estão envelhecendo e os que vão envelhecer. Todos vamos morrer, mas ninguém, mesmo se desmanchando pelo caminho, quer morrer. O economista brasileiro Roberto Campos, o Robarchev, dizia que “a velhice é um naufrágio”. Roth segue na mesma seara: “A velhice é um massacre”.

Em “A Marca Humana”, levado ao cinema com Nikole Kidman e Anthohy Hopkins — o filme é mediano (o romance é complexo demais para uma adaptação mais fiel; precisaria de uma série) —, Roth discute (e denuncia ao seu modo — firme, sereno e reflexivo) o moralismo dos tempos de Bill Clinton e Monica Lewinsky.

Philip Roth: não ganhou o Nobel e, mesmo assim, se tornou famoso| Foto: Richard Drew/AP

“Indignação” conta a história de um homem que morre jovem. Quer dizer, o narrador é o morto. A forma é claramente inspirada no romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, mas a história não é tão irônica quanto a de Machado de Assis. É mais dolorosa.

Os suecos perderam ao não nobelizá-lo. Mas não se lembraram também de Proust, Joyce, Fernando Pessoa, Carlos Drummond de Andrade, Guimarães Rosa e Jorge Luis Borges. Ele está em companhia.

Boa notícia

Roth está sendo biografado por Blake Bailey, o mesmo biógrafo de John Cheever. A pesquisa sobre Cheever é uma verdadeira bíblia sobre o autor e sua obra. Espera-se que o autor faça o mesmo com Roth.