Apontado como autor regionalista, peças do gaúcho João Simões Lopes mudam avaliação de sua criação artística

Imagem: Reprodução
João Simões Lopes Neto (1865-1916), um dos mais celebrados escritores gaúchos, é conhecido sobretudo como regionalista. “Contos Gauchescos” e “Lendas do Sul” são obras-primas da literatura regional. Mas uma pesquisa de dois acadêmicos, João Luis Pereira Ourique e Luís Rubira, da Universidade Federal de Pelotas, sustentam que sua dramaturgia muda em parte a avaliação sobre o autor, que passa ser certo vezo urbano.
João Ourique e Luís Rubira colocam em circulação novos textos de Simão Lopes Neto, que não haviam sido publicados em livro, como “Mixórdia!…”, “Coió Júnior” e “A Fifina”. O volume que estão lançando, o primeiro, inclui também as peças “O Boato”, “Os Bacharéis”, “O Bicho” e “A Viúva Pitorra”. Consta do livro ensaios críticos. Em 1990, o crítico teatral Cláudio Heemann havia editado “O Teatro de Simões Lopes Neto” (pelo Instituto Estadual do Livro). Trata-se de uma antologia pioneira, com parte da dramaturgia do escritor. A “Obra Completa”, organizada pelo escritor Paulo Bentancur, saiu em 2003. Os “Bacharéis”, comédia-opereta, foi editada pelos pesquisadores Cláudia Antunes e Márcio de Souza e levada ao palco por Elcio Rossini, em Pelotas e em Porto Alegre.
Na quarta, 13, o repórter Fábio Prikladnicki, do jornal “Zero Hora” (“Livro resgata peças teatrais de Simões Lopes Neto”), publicou uma excelente entrevista do professor João Luis Pereira Ourique.
João Ourique assinala que “toda a literatura dramática” de Simões Lopes “é urbana, ambientada no espaço da cidade e discute questões de época importantes para compreendermos não somente a cidade de Pelotas, mas a ideia de uma identidade nacional perceptível a partir de suas relações culturais com o ambiente urbano das grandes cidades brasileiras”.
O exame do teatro prova, segundo João Ourique, “Simões Lopes é um escritor antes de ser um regionalista, sendo a sua obra regionalista (mesmo se constituindo como a mais importante) parte de sua produção”. O professor frisa que “a crítica à sociedade da época, ao comportamento social, à burocracia da administração pública—mediados por uma linguagem que insere expressões, gírias e termos que auxiliam a entender melhor uma cidade que ainda permanece fechada no imaginário, salvo algumas imagens e registrados apresentados de forma fragmentada”.
O teatro de Simões Lopes tem qualidade? João Ourique diz que sim. “O teatro de Simões Lopes se destaca e merece novas leituras para abordar melhor essa parte de sua produção.” A peça “O Bicho”, do século 19, é comparada pelo professor a um conto de Machado de Assis. Os dois abordam o jogo do bicho. “A peça de Simões Lopes discutiu essa questão oito anos antes de Machado, o que sustenta tanto o seu olhar atento às questões do seu tempo.” O mestre sublinha o objetivo não é criar um “culto” em torno do autor, e sim de considerá-lo como dramaturgo.
Mas as peças são efetivamente bem feitas? João Ourique assegura “que todas apresentam um cuidado de quem conhecia linguagem do teatro. Desde a sua primeira peça — ‘O Boato’ —, a construção de personagens e situações se alicerça em todos os pontos necessários para que o espetáculo se realize, para que o teatro possa tomar a sua forma: da pena ao palco”.
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