Notícias falsas sobre Jean Wyllys ligam deputado a enriquecimento ilícito e facada em Bolsonaro

27 janeiro 2019 às 00h00

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Que muitas pessoas têm usado as redes sociais para reforça aquilo que gostariam que fosse verdade todo mundo já sabe, mas a desumanidade na divulgação de informações falsas não tem limites

O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) anunciou na quinta-feira, 24, pelas redes sociais e em entrevista à Folha de S.Paulo que não pretende assumir seu terceiro mandato na Câmara e se mudará do Brasil porque recebeu ameaças de morte contra ele e sua família. Em reação, uma rede de sites e redes sociais começou a divulgar informações falsas que dizem ser Jean Wyllys investigado como mandante do atentado a faca sofrido pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) durante a campanha, em 6 de setembro.
Outra notícia falsa que surgiu logo depois que o parlamentar do PSOL do Rio disse que se sente ameaçado de morte e deixaria o País foi a de que Jean Wyllys seria investigado por desvio de recursos públicos e enriquecimento ilícito. As duas pseudonotícias foram desmentidas pela agência de checagem de informações Aos Fatos.
Leia o que diz uma das publicações no Facebook: “Existem rumores de que a renúncia ao mandato do deputado federal Jean wyllys nada tem a ver com as falsas ameaças de morte que o deputado anunciou em entrevista. A verdade é que: as ‘investigações da PF’ encontraram provas robustas de desvios que ultrapassam mais de 100 milhões em projetos sociais, entre outras irregularidades onde o deputado está envolvido ativamente, algo que poderá incriminá-lo. São desvios de verbas públicas destinadas à “movimentos sociais e recebimentos irregulares” nos quais envolveu, MST, CUT, UNE, estes movimentos estão no esquema que é um escândalo desde 2006!!!”.
Como tem gente que acredita em tudo que lê ou se faz de inocente para crer no que lhe convém, é bom explicar, como foi apurado pela Aos Fatos, que as notícias usadas na imagem da publicação são de assuntos que nada dizem sobre a superdenúncia feita sem qualquer embasamento, a não ser a vontade de prejudicar alguém com base em um crime, o de calúnia, previsto no artigo 138 do Código Penal. Isso se não for enquadrado como difamação, artigo 139 da mesma Lei.
“Os posts são embasados por notícias antigas que não guardam qualquer vínculo entre si nem provam a acusação contra o parlamentar: uma é sobre uma representação feita contra Wyllys ao Conselho de Ética da Câmara por suposta apologia às drogas, já arquivada; e outra é referente aos R$ 60 milhões que teriam sido repassados pelo governo Lula a movimentos sociais, como a CUT e a UNE, em 2006, quando o psolista ainda nem era deputado”, explica a Aos Fatos. Clique aqui e leia a notícia do G1 usada contra o parlamentar na publicação.
O mesmo caso citado pela imagem postada com o título da matéria do G1, é um caso que foi arquivado pelo Conselho de Ética da Câmara – clique aqui. Ainda há a acusação de enriquecimento ilícito que estaria em investigação pela Polícia Federal, com citação a MST, CUT e UNE. A notícia é de 2006, quando Jean Wyllys nem candidato a cargo eletivo era e não tem envolvimento com o deputado federal. Clique aqui para ver o conteúdo original da publicação. Jean Wyllys só foi eleito deputado federal em 2010, com duas reeleições em 2014 e 2018.
Só a publicação da página “Sou Patriota Acima de Tudo” recebeu mais de 2 mil compartilhamentos até a tarde de sexta-feira, 25, mesmo quando a informação já havia sido desmentida. A agência Aos Fatos verificou na Polícia Federal e Supremo Tribunal Federal se há ações ou investigações por enriquecimento ilícito ou desvio de verba pública abertas contra Jean Wyllys.
A única ação movida contra o deputado, mas que nada tem a ver com as falsas denúncias, tem como autor o presidente Jair Bolsonaro, por calúnia e difamação. Depois de o caso ser arquivado, a defesa de Bolsonaro recorreu da decisão (clique aqui).
Envolvimento no atentato a Jair Bolsonaro
Viralizaram nas redes socias e no WhatsApp mensagens com links de notícias falsas (clique aqui) e vídeos (clique aqui) que atribuem a Jean Wyllys a autoria do atentado a faca contra Jair Bolsonaro durante a campanha. O deputado do PSOL é tratado como investigado na condição de mandante do crime. O conteúdo é chamativo e tenta convencer o leitor ou a pessoa que vê as imagens de existem ligações que seriam óbvias entre um parlamentar que cuspiu no presidente da República e a tentativa de assassinato do mesmo político.
As três frases a seguir, usadas na internet para atribuir o crime a Jean Wyllys são falsas: 1) “Parece que os novos deputados que assumem no dia 1º de fevereiro perdem a imunidade parlamentar”; 2) “Esse cara [Adélio Bispo] frequentava o gabinete do deputado federal Jean Wyllys lá em Brasília”; e 3) “O Rodrigo Maia escondeu a informação de quem fez a inscrição, quem fez a entrada”.
A pessoa que aparece no vídeo e é identificada em alguns links de notícias falsas como jornalista é na verdade Regina Villela, candidata não eleita em 2018 pelo PSL ao cargo de deputada federal no Ceará e é dona da empresa RvNews Comunicação Ltda. Regina diz no vídeo que o político do PSOL renunciou ao mandato porque a partir de 1º de fevereiro, na nova legislatura, não contaria com imunidade parlamentar. Temos aí Flávio Bolsonaro reivindicando foro privilegiado no STF para provar que isso não é verdade.
Os membros do Congresso continuam a contar com garantias constitucionais para exercer o mandato. O que mudou foi o fato de o direito se restringir aos crimes cometidos durante o tempo que estiverem no cargo e forem relacionados à atuação como parlamentar. Outra ligação tratada como óbvia parte do fato de o autor da tentativa de homicídio, Adélio Bispo, ter sido filiado ao PSOL até 2014. Não há evidência de que o preso tenha visitado Jean Wyllys. O autor do crime foi à Câmara apenas uma vez, no ano de 2013.
Outra informação falsa é a de que tentaram forjar um álibi para Adélio com registro de entrada do autor do crime no dia do atentado contra Jair Bolsonaro. O diretor da Polícia Legislativa da Câmara, Paul Pierre Deeter, informou que uma recepcionista cometeu um erro ao consultar o histórico de visitação de Adélio no sistema quatro horas depois do caso ter ocorrido.
O primeiro inquérito da Polícia Federal chegou à conclusão de que Adélio bispo agiu sozinho por discordâncias políticas com o então candidato a presidente. Está em andamento outro inquérito para saber a origem dos recursos que pagam a defesa do autor do crime. O vídeo da ex-candidata a deputada pelo PSL no Ceará foi postado no YouTube e depois republicado em páginas no Facebook.
Blog do Cleuber Carlos, 1News, República de Curitiba e outras páginas compartilharam o conteúdo com informações falsas contra Jean Wyllys. O vídeo continua a ser compartilhado, mesmo depois de ser verificado que as informações contidas em sua narrativa são falsas. Regina Villela diz no vídeo, que foi publicado no YouTube na quinta-feira, sugere que o responsável pela facada por trás de Aélio Bispo seria o deputado do PSOL. Mas as informações são falsas.
Até o presidente Jair Bolsonaro disse em entrevistas a informação falsa de que Adélio teria tido sua entrada registrada no Congresso no dia do atentado que sofreu, que foram esclarecidos, como citado no texto. Quando Villela diz em seu vídeo que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), escondeu a “informação de quem fez a inscrição, quem fez a entrada”, não há qualquer dado ou informação apresentado no vídeo que comprove o que a ex-candidata alega.
Testemunha de defesa
Jean Wyllys não foi convidado ou intimado pela Polícia Federal a depor sobre o caso e não foi tratado como suspeito no inquérito já concluído sobre a autoria da tentativa de homicídio. O advogado de Adélio, Zanone Manuel, indicou o deputado do PSOL como testemunha de defesa para falar sobre “o discurso de ódio de Bolsonaro, que, segundo o próprio Adélio, foi o que motivou seu ato”.
Outros indicados pela defesa como testemunhas foram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a deputada Maria do Rosário (PT-RS) e a cantora Preta Gil, que seriam alvos corriqueiros dos apoiadores de Bolsonaro. A decisão do advogado do autor do crime segue o que diz o Código Penal: “Toda pessoa poderá ser testemunha”. Em entrevista na sexta-feira, o vice-presidente, general Henrique Mourão (PRTB), descartou qualquer envolvimento de Jean Wyllys no caso.
A lista publicada pelo Blog do Cleuber Carlos é a mesma que o presidente Jair Bolsonaro postou em seu Twitter na manhã de sexta. Mas, no caso do presidente, não houve citação ao nome de Jean Wyllys no tweet.
Alguns passos de Adélio Bispo, ex-filiado do PSOL, o criminoso que tentou matar Jair Bolsonaro: pic.twitter.com/xU6VeTlWW5
— Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) January 25, 2019
À Aos Fatos, a assessoria de Jean Wyllys disse que não falará mais sobre o fato de ter desistido de ser deputado federal e resolver mudar do Brasil e citou a entrevista concedida à Folha de S. Paulo como suficiente para explicar os motivos que levaram o deputado a tomar a decisão. “Todo o resto é boato”, afirmou.