Morre poeta negra que influenciou a família do presidente Barack Obama
28 maio 2014 às 18h53
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Uma irmã do líder norte-americano tem o nome de Maya em homenagem à poeta negra, que, ativista pelos direitos civis, atuou ao lado de Martin Luther King e Malcolm X
Ralph Ellison (criador do seminal “Homem Invisível”) e Toni Morrison (autora do excelente “Amada”) são os maiores escritores negros dos Estados Unidos. Não só. Equiparam-se aos principais prosadores do país, como Herman Melville, Nathaniel Hawthorne, Mark Twain, Henry James, Edith Wharton, William Faulkner, F. Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway, Saul Bellow, J. D. Salinger, Norman Mailer, John Udpike, Philip Roth, Thomas Pynchon, Joyce Carol Oates e Richard Ford. Mas, há claro, os autores do segundo time que nem sempre fazem feio — é o caso de James Baldwin (que aprecio e deveria ser reeditado no Brasil) e Richard Wright. Maya Angelou — que, embora famosa nos Estados Unidos, não tem a fama internacional de Ellison e Morrison — morreu na quarta-feira, 28, aos 86 anos. Ela tinha problemas cardíacos.
Defensora dos direitos civis, Maya Angelou leu poemas nas posses dos presidentes Bill Clinton, em 1993, e de Barack Obama, em 2009. Ao condecorá-la com a Presidential Medal of Freedom, a mais alta condecoração civil dos Estados Unidos, o presidente Obama disse: “Com sua poesia ascendente, sua prosa elevada e seu domínio de diversas formas de arte, a doutora Angelou falou à consciência da nossa nação. Suas palavras comoventes nos ensinaram como alcançar [o que queremos] mesmo em meio ao separatismo e honraram a beleza de nosso mundo”. O líder da maior potência econômica do globo acrescentou que a poeta havia influenciado sua família: “Quando era uma garotinha, Marguerite Ann Johnson sofreu trauma e abuso, que a levaram a ficar muda. Mas, como performer e finalmente como escritora, poeta, Maya Angelou encontrou a própria voz. É uma voz que falou a milhões, incluindo minha mãe, e esse é o motivo pelo qual minha irmã recebeu o nome de Maya”.
Ativista pela igualdade racial, Maya Angelou trabalhou com o moderado Martin Luther King e com o radical Malcolm X. No funeral de Michael Jackson, em 2009, ela homenageou o artista com o poema “We had him”. A poeta teria influenciado os cantores Steven Tyler, Fiona Apple e Kanyer West. É tida como uma espécie de mentora da apresentadora de televisão e atriz Ophah Winfrey.
Maya Angelou firmou-se como poeta e ativista, mas foi cantora, dançarina, atriz, dramaturga, compositora e trabalhou como taxista. Chegou a ganhar o Grammy. “Eu Sei Por Que o Pássaro Canta na Gaiola” foi o primeiro best seller de uma escritora negra nos Estados Unidos. Tornou-se uma obra referencial e reverencial. Ela conta, neste livro, que, aos 7 anos, estuprada pelo namorado de sua mãe, deixou de falar por cinco anos.
As duas obras mais conhecidas de Maya Angelou são “Eu Sei Por Que o Pássaro Canta na Gaiola” (José Olympio), de 1969, e “Carta à Minha Filha” (Nova Fronteira), de 2008.
Como atriz de teatro, Maya Angelou se destacou na montagem de “Os Negros”, peça do escritor e dramaturgo francês Jean Genet.
A seguir, publicamos duas poesias de Maya Angelou, “Sozinha” (tradução de Lucas Grosso) e “Labor feminino” (tradução de Alice Dias).
Sozinha
Maya Angelou
Meditando
Noite passada
Como buscar a alma uma casa
Onde a água não é sedenta
E o naco de pão não seja como rocha
A um fato vou me aproximando
Crendo não estar errada
Que ser nenhum
Senão, nenhum
Pode entender estar sozinha.
Sozinha, tão sozinha
Ser nenhum, senão nenhum
Pode entender estar sozinha.
Certos milionários com
Dinheiro que não usam
As esposas agitadas como o boitatá
Seus filhos cantando choro
Ele e seus médicos caros
Para curar corações de pedra.
Mas ser nenhum
Não, ser nenhum
Pode entender estar sozinha.
Sozinha, tão sozinha
Ser nenhum, senão nenhum
Pode entender estar sozinha.
Se escutar com atenção
Vou contar o que aprendi
Nuvens de negras se juntam
E o vento vai fluir
A raça humana em aflição
Eu ouço sua lamúria,
Porque, ser nenhum
Senão nenhum,
Pode entender estar sozinha.
Sozinha, tão sozinha
Ser nenhum, senão nenhum
Pode entender estar sozinha.
(Traduzido por Lucas Grosso)
[O texto foi extraído do link: http://asharpias.blogspot.com.br/2012/07/poema-de-maya-angelou-em-traducao.html]
Labor feminino
Maya Angelou
Possuo as crianças para cuidar
Roupas para remendar
Chão para esfregar
Comida para comprar
Frango para fritar
Bebê para limpar
Tenho companhia para me alimentar
Jardim para ervas daninhas arrancar
Neném para trajar
Lata para cortar
Esta cabana limpar
O doentes para cuidar
E o algodão para pegar
Brilhem sobre mim, raios de sol
Chova sobre mim, chuva
Caiam, lentamente, gotas d’orvalho
e refresquem minha pele, novamente.
Tempestade, sopre-me daqui
Com seu mais poderoso vento
Deixe-me nos céus flutuar
Até que eu possa descansar.
Caiam, gentilmente, flocos de neve
Cubram-me com seu glacial
palor e seu beijo congelante
Deixe-me descansar nesta noite errante.
Sol, céu, chuva
Montanha, oceanos, folha e pedra
Estrela brilhante, lua incandescente
Vocês são as únicas coisas que me pertencem.
(Poema extraído do site: http://www.literaturaemfoco.com/?tag=traducoes)