Geneton Moraes Neto começou no jornalismo impresso, mas se deu muito bem na televisão, como repórter brilhante e editor do Jornal Nacional, do Jornal da Globo e do Fantástico

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O jornalista pernambucano Geneton Moraes Neto, um dos melhores entrevistadores da imprensa patropi — um dos mais incisivos e perspicazes —, morreu na segunda-feira, 22, aos 60 anos, no Rio de Janeiro. Não resistiu às complicações decorrentes de aneurisma da artéria aorta.

Geneton Moraes Neto começou sua carreira como repórter no “Diário de Pernambuco”, na década de 1970, e trabalhou no “Estadão”. Na TV Globo, chegou a ser editor do “Fantástico”, mas era, acima de tudo, repórter. Era adepto da ideia de que, numa redação, só há uma profissão, a de repórter. Editor é cargo — não é profissão. Repórteres competentes só aceitam cargos de editor, no geral, para ganhar um pouco mais.

Na Globo desde 1985, tornou-se um hábil entrevistador, por vezes fazendo perguntas constrangedoras, mas pertinentes. Era um “agente provocador” dos mais instigantes. Dizia-se um “perguntador” contumaz. Ele foi editor do “Jornal da Globo”, do “Jornal Nacional”, editor-chefe do “Fantástico” e correspondente da rede na Inglaterra. Fez entrevistas para a Globo News.

Entre suas entrevistas mais famosas estão as dos generais Newton Cruz e Leônidas Pires Gonçalves. Ele conseguiu o que poucos conseguiram: fazê-los falar do que não queriam falar — suas ações na ditadura civil-militar. O perguntador infatigável não se intimidava com cara feia e respostas secas e duras.

Uma vez, ao entrevistar o sociólogo Gilberto Freyre, levou uma escarrada no rosto. Ficou com nojo? Ficou, é claro. Mas disfarçou e continuou a entrevista. Quase tudo que fazia tinha um tom polêmico (com uma certa gravidade), sobretudo uma espécie de assinatura, ou carimbo. Sabia-se de cara, desde o ritmo, que uma reportagem ou uma entrevista era de Geneton Moraes Neto. Eram informais, por vezes bombásticas, inventivas e atraentes. Ele não se interessava em aparecer muito, talvez porque se julgasse feio (era mesmo feio), mas seus trabalhos eram reconhecíveis — tinham identidade. Eram belos.

Profissional dos mais versáteis, dirigiu o documentário “Canções do Exílio”, para o Canal Brasil. Contém depoimentos de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jorge Mautner e Jards Macalé, que contaram histórias de quando residiram em Londres. Ele dirigiu o documentário “Garrafas ao Mar: A Víbora Manda Lembranças”, que reúne entrevistas feitas com Joel Silveira, que tinha o apelido de Víbora (posto por Assis Chateaubriand) e, pode-se dizer, foi um dos inventores do Novo Jornalismo, ou jornalismo literário, antes, bem antes, que se falasse a respeito. Inquieto, saltando de um assunto para outro, desde que o julgasse interessante, dirigiu o documentário “Dossiê 50: Comício a Favor dos Náufragos”, sobre jogadores da Seleção Brasileira de futebol que perdeu a Copa do Mundo de 1950, no Maracanã, para a seleção do Uruguai.

O documentário “Cordilheiras no Mar: A Fúria do Fogo Bárbaro” exibe e discute a polêmica gerada pelo diretor de cinema Glauber Rocha ao apoiar o projeto de abertura política do presidente Ernesto Geisel e do general Golbery do Couto e Silva, que, segundo o cineasta baiano, seria o gênio da raça. Mais divergente do que convergente, dirigiu o documentário “Boa Noite, Solidão”, que se passa numa cidade do sertão de Pernambuco. Ele relata a história de nordestinos que desistiram do Sudeste, supostamente maravilha, e voltaram para o Nordeste.

Geneton de Moraes Neto escreveu vários livros. Quando resenhei um deles, para o Jornal Opção, recebi um e-mail, no qual dizia que era a melhor resenha de seu livro.

Geneton Moraes Neto fará falta. Muita falta. O jornalismo fica mais triste e menos empolgante com sua morte.