Os críticos literários e bibliófilos Iuri Rincon Godinho e Marcelo Franco costumam escrever que gostariam de viver 250 anos para ler todos os livros sobre a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Porém, como sabem que se trata de uma tarefa de Sísifo, porque o tema é tão inesgotável quanto Jesus Cristo, conformam-se em viver 100 anos — com saúde e serelepes.

Rincon e Franco, assim como eu, estamos sempre lendo algum livro novo sobre a Segunda Guerra Mundial, nas horas “vargas”, como dizia Pio, o poeta. O diabo é que, às vezes, temos de deixar preciosidades de lado. Agora, surge mais um, quem sabe, livraço (ou livralho?), “Bilionários Nazistas — A Tenebrosa História das Dinastias Mais Ricas da Alemanha”, de David de Long. Trata-se de uma publicação (tudo indica que séria, e não sensacionalista) da Editora Objetiva, com tradução de Otacílio Nunes e 400 páginas de muita pesquisa e interpretação.

Joseph Goebbels e Adolf Hitler: nazistas tinham “ótima” relação com empresários | Foto: Reprodução

Ditadura é assim: em geral tem um líder, e, quando cai, é o mais execrado. Adolf Hitler — o cabo austríaco que pintou uns quadrinhos de baixa qualidade — e mais alguns pares, como Himmler e Goering — além dos notórios Josef Mengele (o cruel médico de Auschwitz) e Adolf Eichmann —, ficaram com a carga pesada, pesadíssima, do nazismo (6 milhões de judeus foram assassinados de maneira brutal, por exemplo. E, nas batalhas e fora delas, morreram cerca de 80 milhões de pessoas, entre civis e militares). Mas e aqueles que ganharam dinheiro com o nazismo, e que, depois, trabalharam para cancelar a história suja, colocando em seu lugar outra história, agora “limpa”? Pois é: muita gente ganhou fortunas com o nazismo e não foi penalizada depois da guerra. “Reintegrou-se”, numa boa, na sociedade democrática.

Sinopse da Editora Objetiva

“Um livro inquietante que reconstitui os mecanismos de violência e corrupção que estão na origem da riqueza de várias das dinastias empresariais mais poderosas do mundo. Bilionários nazistas é uma prova de que o resgate da memória histórica sobre esse sinistro período continua relevante e necessário.

David de Jong: jornalista e historiador | Foto: Reprodução

“A história do nazismo na Alemanha é inseparável das biografias dos industriais e financistas que ajudaram Adolf Hitler a conquistar o poder absoluto e lucraram milhões com as atrocidades do Terceiro Reich — são nomes como os Von Finck, Porsche, Oetker e Quandt. Aduladores e inescrupulosos, eles ampliaram seus impérios através do roubo de propriedades judaicas e da exploração do trabalho forçado de vítimas da barbárie nazista, além da fabricação de armas e munições. A brandura do julgamento de seus crimes no pós-guerra possibilitou a continuidade de suas dinastias empresariais, cujos herdeiros acumulam fortunas e administram marcas mundialmente famosas até hoje, como Volkswagen, Dr. Oetker, BMW e Allianz. E por que, depois de tantas décadas, eles ainda estão fazendo tão pouco para reconhecer os crimes de seus antepassados?

“Debruçado sobre milhares de documentos e fontes originais, além de abrangentes pesquisas historiográficas, o jornalista e historiador David de Jong — holandês de origem judaica — disseca as origens obscuras das fortunas multiplicadas a ferro e fogo entre 1933 e 1945. Neste livro, seu trabalho de estreia, o autor faz um chamado ao resgate da memória do genocídio nazista, tarefa primordial em tempos de ressurgência do extremismo antidemocrático.”

A sinopse não cita a francesa Renault, que colaborou, alegremente, com Hitler e o nazismo.

Quatro opiniões sobre o livro de David de Jong

Adam Tooze, professor de Columbia, escreveu sobre o livro: “O desafio, como De Jong nos lembra, é reatualizar essa história para continuamente encontrar novas maneiras de trazê-la para o presente”.

O “Daily Telegraph” assinalou: “Depois de ler este livro você nunca mais dirigirá um Volkswagen, fará um seguro residencial com a Allianz ou comprará uma pizza Dr. Oetker no mercado sem um certo mal-estar. De Jong, com o talento do bom jornalista que é, permite que os fatos falem por si mesmos. E nos deixa impressionados com o poder da ganância.”.

Samuel Moyn disse: “Com seus relatos meticulosamente construídos de indivíduos e famílias alemãs, incluindo judeus que foram expropriados, Bilionários nazistas sugere que até hoje as reparações dos lucros que alguns colheram em uma era de horror não foram feitas”.

Bradley Hope acrescentou: “O fato de algumas das maiores fortunas da Alemanha estarem profundamente entrelaçadas com as ignomínias do Terceiro Reich deveria ser muito mais conhecido – e, graças a este livro, será.”.

Mestre por Columbia e London School of Economics

Holandês de Amsterdam, David de Jong é formado em ciência política e mestre em história pela London School of Economics e por Columbia.

Como jornalista, é especializado em economia e finanças. Escreveu no Boomberg News, “New York Times” e “Wall Street Journal”. É correspondente do jornal holandês “Het Financieele Dagblad”, em Tel Aviv.