Livraria Cultura fecha suas duas unidades de Brasília e Iúri Rincon lamenta

03 fevereiro 2021 às 17h07

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Em processo de recuperação judicial, com uma dívida de mais de 200 milhões de reais, a empresa da família Herz está fechando algumas unidades
O escritor, jornalista e publicitário Iúri Rincon Godinho é habitué de Brasília. Ou melhor, ao menos uma vez por mês vai até a capital construída por Juscelino Kubitschek, Lucio Costa (ele frisa: sem acento no “u”), Oscar Niemeyer e milhares de candangos anônimos para comprar livros na Livraria Cultura, a do shopping Casa Park, a maior, e a do shopping Iguatemi, ambas com ótimo acervo (nem tanto, ultimamente) e com cafés de relativa qualidade.

No último fim de semana, Iúri Rincon esteve em Brasília para visitar sua amada Livraria Cultura. Entrou no Casa Park, lépido — sempre caminha rápido —, e subiu a escada e quase esbarra na porta de vidro da casa dos livros — que, sim, estava fechada.
De lá, Iúri Rincon, com sua lista de livros, a sua e a dos amigos, como Marcelo Franco — os dois são leitores vorazes e colecionadores de obras antigas e livros autografados —, e o múlti Chico Paes Landim, decidiu ir ao Iguatemi, à espera do pior, é claro.
Sim, a Livraria Cultura do Iguatemi também estava fechada.
Em processo de recuperação judicial, com uma dívida considerada impagável — para quem vende livros, notadamente com o país em crise —, a Livraria Cultura está fechando parte de sua rede, inclusive pontos de alta qualidade, em vendas, como o da Casa Park, em Brasília.

Em comunicado, ao mesmo tempo que lamenta a crise provocada pela pandemia, os executivos sugerem que a Livraria Cultura poderá abrir uma nova loja em Brasília, talvez menor, com aluguel mais barato. (Frise-se que a crise da Cultura antecede a Pandemia, assim como a crise da Livraria Saraiva.)
Os que amam livros querem isto: uma Cultura renascida, onde se possa comprar bons livros e, sim, filmes (a Versátil continua vendendo bem). Nos bons tempos, era possível encontrar na rede da família Herz livros editados em Portugal, sobretudo de poesia, em edições caprichadas da Assírio-Alvim. Mas o realismo — e realismo em demasia não é prazeroso — sugere outra coisa: dificilmente a Livraria Cultura, para a infelicidade de seus leitores, que adoram visitá-la, terá condições de sobreviver.
Os novos tempos, no campo dos livros, são mais apropriados ao negócio digital de uma Amazon, cujos preços sugerem dumping. Cabe a ressalva de que a Martins Fontes, a Travessa e a Leitura, com livrarias físicas, vão bem. Registre-se ainda o fato de que as livrarias de rua, que estão retornando, com acervo menor mais de qualidade, dão mostras de que vão resistir ao pantagruelismo amazônico.
Homem do Cerrado, quase sessentão (ele costuma dizer: “Passei dos 18”), Iúri Rincon finge que as lágrimas nada furtivas que escaparam de seus olhos eram motivadas pela poeira. Mas, lembrando-se da Biblioteca de Alexandria, finalmente admite: “Saí triste de Brasília. Para não voltar lá tão cedo”.
Recentemente, em visita ao México, Iúri Rincon também percebeu que o negócio do livro também está em crise no país de Octavio Paz, o poeta e ensaísta, e Carlos Fuentes, prosador.
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