A lista dos camponeses que foram mortos na Guerrilha do Araguaia

22 abril 2014 às 16h55

COMPARTILHAR
O jornalista e historiador Hugo Studart revela que mais camponeses participaram da guerrilha, nos Estados do Pará e de Goiás (Tocantins), do que registram PC do B e pesquisadores. A batalha talvez tenha de ser (re)vista como um movimento com maior envolvimento de populares

A tese de doutorado “Em Algum Lugar das Selvas Amazônicas: As Memórias dos Guerrilheiros do Araguaia (1966-1974)”, do jornalista e historiador Hugo Studart, apresenta o levantamento mais completo sobre os camponeses que participaram da Guerrilha do Araguaia, direta ou indiretamente. Lista-se também os que morreram, estão desaparecidos e os que sobreviveram. O documento “Dossiê Araguaia: Ultrapassando a Guerrilha”, elaborado por militares entre 1998 e 2001, “apresenta uma relação de exatos 29 camponeses que teriam entrado para a guerrilha. Até então, para o Partido Comunista do Brasil, a guerrilha teria tido a adesão de 18 camponeses”. O documento revela que nove camponeses foram mortos, três foram presos, um teria desertado e não se sabe do paradeiro de 17. A guerrilha, portanto, não foi apenas dos militantes do PC do B. A participação popular foi maior do que tradicionalmente informam o partido e pesquisadores. A tese de Studart pode ensejar uma reformulação da maneira como a Guerrilha do Araguaia tem sido interpretada.
[relacionadas artigos=”2146″]
Outro documento, aparentemente confeccionado pelo Centro de Informações do Exército (CIE), divulga “a relação de 178 camponeses que teriam prestado apoio aos guerrilheiros”. O documento informa que 36 camponeses deram “apoio forte” aos integrantes do PC do B. Studart anota que a relevância do documento tem a ver com o “detalhamento até então desconhecido sobre a participação de cada um dos camponeses na guerrilha” e arrola os nomes de 10 camponeses mortos. O documento relaciona também “142 moradores da região que teriam sido ‘apoios fracos’ da guerrilha. No total, 178 camponeses, de acordo com a avaliação dos militares, teriam de alguma forma participado da guerrilha”.
[relacionadas artigos=”2144″]
O Relatório Especial de Informações nº 6, do SNI, apresenta dados parecidos: “161 ‘apoios’ haviam sido presos até 15 de novembro de 1973 e (…) outros 42 estavam sendo procurados, totalizando 203 camponeses”.
A partir do cruzamento dos dados apresentados pelos documentos, Studart conclui que morreram “27 camponeses durante a repressão à Guerrilha do Araguaia”. As informações são “preliminares”, adverte o pesquisador. É possível que os mortos sejam 31 (ou 33), ou até mais, mas o pesquisador prefere ter cautela, ancorado em dados (sempre comparados e confrontados), sem forçá-los (ao menos não de maneira desmedida) por meio da teoria. As pesquisas, inclusive as suas, estão em andamento. A Guerrilha do Araguaia, embora cada vez mais conhecida, permanece como uma “obra aberta” — à espera de pesquisas tão rigorosas quanto a de Studart.
Mortos durante a guerrilha (casos consolidados)
Baseado nas informações de moradores da região, de militantes dos Direitos Humanos e em documentos militares, Studart lista os “mortos durante a guerrilha” — são os casos que chama de “consolidados”. Os textos a seguir são uma síntese pálida, com fartas transcrições, de um material apurado com rara excelência pelo doutor em História.
1 — Antônio Alfredo Lima — Entrou para o Destacamento A. Encontra-se na listagem dos desaparecidos do compêndio Retrato da Repressão Política no Campo. Foi morto pelas Forças Armadas, em 13 de outubro de 1973, junto com André Grabois e mais dois guerrilheiros, em combate com o grupo militar comandando pelo major Lício Augusto Maciel.
2 — Clóvis Ribeiro dos Santos — Foi preso e torturado em fevereiro de 1974. Desaparecido em 1974, no Araguaia.
3 — Jair Maciel, Zequinho — Morto em janeiro de 74.
4 — Joaquim de Souza — Desaparecido em junho de 1973, possivelmente morto pelo Exército. Seu nome constava no cartaz das vítimas da guerrilha.
5 — João Pereira da Silva — Seu pai, José Pereira da Silva, apoiou o Destacamento C da guerrilha. Pressionado pelos militares, mandou o filho, Joãozinho, levá-los aos integrantes do PC do B. O garoto de 17 anos foi morto pelos guerrilheiros (Rosalindo Cruz, Mundico, e Jaime Petit) com um tiro no peito.
6 — José Ribeiro Dourado — Foi preso e obrigado a ser guia ao Exército. Foi morto, em 1974,porque deu comida ao guerrilheiro Osvaldão.
7 — Juarez Rodrigues Coelho — Preso em 14 de agosto de 1972, morreu na Delegacia de Polícia de Xambioá. Militares dizem que cometeu suicídio.
8 — Lourival Moura Paulino — O barqueiro e lavrador era, segundo militares, “apoio” dos guerrilheiros — ligado a Osvaldão. Apareceu morto em maio de 1972. Militares disseram que cometeu suicídio. Terceira pessoa morta, depois do cabo Odilio Cruz Rosa, do Exército, e do guerrilheiro Bergson Gurjão.
9 — Luiz Vieira de Almeida, Luizinho — O camponês pegou em armas ao lado dos guerrilheiros, segundo documento militar. Morto em dezembro de 1973.
10 — Luiz Viola — Morto em 1974.
11 — Manoel Neres Santana, Batista — Aderiu aos “paulistas”, como os guerrilheiros eram conhecidos pela população. Há duas versões. Na primeira, teria sido morto em 1974, aparentemente ao lado de Áurea Elisa Valadão. Na segunda, teria sido poupado pelos militares.
12 — Pedro Pereira de Souza ou Pedro Matias de Oliveira, Pedro Carretel — Aderiu à guerrilha, em 1972, e teria desaparecido em janeiro ou fevereiro de 1974. Documento do CIE indica-o como “maior apoio da guerrilha”.
Mortos desaparecidos (casos a apurar)
Criterioso e cauteloso, Studart diz que os casos requerem mais investigação.
13 — Aluísio Nunes Ferreira — Morreu em 13 de maio de 1974. Pode ser o guerrilheiro Lúcio Petit da Silva, codinome Beto, preso em maio de 1974. Era comum os guerrilheiros presos informarem nomes falsos para despistar os militares.
14 — Amaury de Azevedo Siqueira — Morto a 27 de fevereiro de 1974.
15 — Antônio Ferreira Pinto — Morto a 30 de abril de 1974.
16 — Célia Sanches Cristie, Cristina — Morta em 8 de fevereiro de 1974. Outro caso de possível guerrilheira informando nome falso. O analista militar que elaborou o documento pode ter se confundido. Havia uma guerrilheira chamada Maria Célia Corrêa, codinome Rosa, desaparecida no início de janeiro de 1974. Há relatos de camponeses de que Célia foi vista presa na Base de Bacaba. Havia outra guerrilheira, Jana Moroni Barroso, codinome Cristina, desaparecida no início de fevereiro de 1974. Também há relatos de camponeses de que Jana foi avistada presa. As duas eram amigas e militaram juntas no movimento estudantil no Rio de Janeiro. Célia Sanches Cristie também pode ser alguma moradora da região. Ou ainda pessoa de fora da região confundida com os guerrilheiros.
17 — Chico — Morto em dezembro de 1973.
18 — Edith, ou Edite — Tropeiro de burros. Documento do CIE informa: “Edite. Morreu em 1972 junto com Helenira”. No “Diário do Velho Mário”, ao relatar a morte da guerrilheira Helenira Nazareth, Maurício Grabois informa que o Destacamento A estava preparando uma emboscada contra uma patrulha militar, quando “apareceram 16 homens, com quatro burros tropeados pelo Edith à frente”. Grabois relata ainda que, no embate, Fátima (Helenira) “fuzilou um militar”. Esse militar pode ter sido o tropeiro Edith.
19 — Hermógenes — Identificado pelos militares como “apoio forte” da guerrilha, desde 1972, foi preso em 4 de outubro de 1974. Foi torturado na Base de Xambioá e, depois, desapareceu.
20 — Joaquim de Souza Moura, Joaquinzão — Paradeiro desconhecido. Morto em 1973, segundo o CIE.
21 — João Aquino Jaime, João Goiano — Morto em 17 de janeiro de 1974.
22 — João Moacir Santiago de Mendonça — Morto a 18 de agosto de 1972.
23 — José Amaurílio Patriarca, Mané — Morto em setembro de 1974.
24 — José Antônio Botelho — Morto a 30 de abril de 1974.
25 — José Machado da Silva — Desaparecido em 1974, em Marabá.
26 — Landinho — Morto a 25 de janeiro de 1974.
27 — Levy — O Dossiê Araguaia registra apenas: “Morto”.
28 — Miguel Tavares, Cazuza — Morto a 20 de setembro de 1974.
29 — Manoel — Morto a 12 de janeiro de 1974.
30 — Paulo Mauro Rodrigues — Documento do SNI, “Subversivos que participaram da Guerrilha do Araguaia”, informa que foi morto a 25 de dezembro de 1973. O analista que elaborou o documento pode ter se enganado. Havia um guerrilheiro de nome similar, Paulo Marques Rodrigues, conhecido por Paulo, comandante do Destacamento C, falecido em 25 de dezembro de 1973.
31 — Quincas — Morto em 1974.
32 — Waldir da Costa Lima — Morto a 29 de abril de 1974.
33 — Zé Luís — Morto a 13 de outubro de 1973.