Apesar dos ufanismos à la Galvão Bueno, a imprensa esportiva brasileira está bem à frente da média dos colegas latino-americanos da mesma área de atuação, mais exagerados ainda

Mario Conti (no alto) e Juca Kfouri: jornalismo esportivo na berlinda | Fotos: Wikipedia e  Equipe Ludopédio
Mario Conti (no alto) e Juca Kfouri: jornalismo esportivo na berlinda | Fotos: Wikipedia e Equipe Ludopédio

Tempo de Copa do Mundo no Brasil é também um bom pe­ríodo para fazer um balanço sobre a quantas anda o jornalismo esportivo no País. É preciso, antes, dizer que “jornalismo esportivo” não é algo à parte do todo do ofício: um bom jornalista da área pode cobrir qualquer outra, assim como qualquer bom repórter de política ou caderno cultural pode se dar bem com esportes. Exemplos existem aos montes, tanto no movimento de ida como no de vinda.

Mas, que existe um olhar torto para os jornalistas esportivos, como se estes fossem menos capacitados do que outros, isso ainda persiste, ainda que em grau menor do que em tempos atrás. Diz a lenda que os menos capacitados eram jogados para as editorias de Polícia ou Esporte. Não é o que se vê por aí. No perfil de jornalistas brilhantes — Joelmir Betting, para citar um apenas —, a frase “começou a carreira no jornalismo esportivo” é bastante encontrada.

Por isso, muita gente da turma que trabalha dia a dia com o futebol se sentiu “vingado”, de certa forma, quando Mario Sergio Conti, nome de proa do jornalismo nacional, colunista da “Folha de S. Paulo” e durante muitos anos um exigente editor da revista “Veja”, publicou sua já histórica “barriga” — a entrevista exclusiva com o (sósia do) treinador Luiz Felipe Scolari fruto de um encontro casual dentro de um avião da ponte aérea Rio–São Paulo.

Parece, mas não é fácil fazer jornalismo esportivo. Referência do setor, Juca Kfouri — ex-editor de “Placar” e comentarista do canal fechado ESPN Brasil —, em um artigo na mesma “Folha” de Conti na terça-feira, 1º, faz um desagravo à imprensa esportiva (sem se aproveitar do “flanco aberto” pelo colega). Para argumentar, ele faz referência a um comentário ouvido de um repórter austríaco, Robert Florencio, que está no Brasil para cobrir a Copa. Florencio comparou o jornalismo esportivo brasileiro ao uruguaio, usando duas situações polêmicas: o pênalti inexistente marcado para o Brasil no jogo de estreia e a repercussão da punição a Luis Suárez pela mordida no zagueiro Chiellini, da Itália. O austríaco elogia os brasileiros pela imparcialidade ao contestar o benefício da arbitragem no lance de Fred e critica os uruguaios por defenderem o indefensável.

Juca está certo: apesar dos ufanismos à la Galvão Bueno, a imprensa esportiva brasileira está bem à frente da média dos colegas latino-americanos da mesma área no que diz respeito a isenção. Obviamente, escrever sobre futebol é bem diferente de falar sobre economia: trabalha-se também com a emoção. Mas é possível transmitir emoção e se manter fiel ao espírito do jornalismo, fazendo reportagens com seriedade e correção. Isso vale para rádio, jornal, TV e internet.

Por outro lado, ainda temos profissionais que acham que essa isenção, quando se trata do time ou seleção local, vira um item opcional. Não pode ser assim, pois o resultado é uma infantilização da essência do jornalismo. Ora, se é para quebrar com a isenção, melhor escrever crônica e não notícia — e talvez esteja nisso a raiz do termo “cronista esportivo”.

Na verdade, uma parcela do jornalismo esportivo ainda carrega o espírito de décadas passadas, onde não havia tanta tecnologia — transmissão multicâmeras, ferramentas de interação, internet, redes sociais. Conservaram um hábito antigo em tempos novos. Isso não é um privilégio brasileiro, como se vê claramente durante a Copa do Mundo. Essa parte precisa ser mais bem trabalhada, coisa que as novas gerações de profissionais da área fazem de forma mais correta.