“Jornal do Meio Dia” virou um programa policial a mais
26 julho 2014 às 09h57
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A audiência é um alvo a ser buscado a qualquer custo? Em princípio, nada deveria ser, porque toda finalidade por ela mesma conduz a resultados nada agradáveis — e é por isso que resumir Maquiavel à sentença “os fins justificam os meios” é uma injustiça cruel com o mestre italiano. A TV Serra Dourada sempre teve um jornalismo de base popular e seu sucesso nessa área mudou o padrão da concorrência: a gigante TV Anhanguera teve de adequar seu jeito editorial sisudo de ser para conseguir se recuperar. Hoje os repórteres estão mais descontraídos e, ainda que no início do processo isso soasse artificial — até por não ser o costume da emissora, seus profissionais tendiam a ficar travados —, hoje eles parecem ter chegado a um tempero ideal, mesmo que tudo possa (e deva) passar constantemente por reavaliações e melhorias.
Voltando à TV Serra Dourada, que ocupa o 1º lugar em audiência em seu horário desde 2012, a linha editorial parece ter se concentrado totalmente em sustentar a hegemonia. Mais grave: a sensação que se tem é de, por vezes, estar sintonizado em uma réplica local do que produzem Marcelo Rezende e José Luiz Datena em rede nacional. A maioria das chamadas e dos destaques aponta para notícias policiais e outras misérias, principalmente na periferia de Goiânia e cidades vizinhas.
Jordevá Rosa e Luciana Finholdt, a dupla de jornalistas no comando do telejornal pelo menos há uma década, prendem o público pelo carisma e empatia que transmitem. Mas estão prejudicados pela linha editorial. Não combina com o profissionalismo de Jordevá nem com a sobriedade de Luciana (poderia inverter os substantivos qualificadores de ambos sem prejuízo da veracidade) apresentar um jornal de caráter tão policialesco a ponto de parecer estar assistindo a um artigo do gênero, somente com mais elaboração técnica.
Na verdade, o “Jornal do Meio Dia” põe o pé em duas canoas para sustentar sua liderança há dois anos: seus concorrentes são, ao mesmo tempo os telejornais do Grupo Jaime Câmara e da TV Record e os programas “Chumbo Grosso” (TV Goiânia/Band) e “Balanço Geral” (Record). Investe cada vez menos em pautas editoriais convencionais (cobrir política, economia, cultura etc.) e mais prestação de serviços (o que é válido) e notícias de acidentes e misérias, atropelamentos e assassinatos. Ainda que não haja coincidência total de horários com os programas policiais propriamente ditos, a busca é satisfazer também esse mercado de espectadores ávidos por consumir violência.
Diziam de certos impressos, muitos deles ainda resistentes à internet, que “se torcer sai sangue”. Restam questões: um telejornal que “se torcer sai sangue” colabora com uma visão mais ampla de cidadania? Até que ponto, nesse sentido, o viés adotado pelo jornalismo da TV Serra Dourada não tem contribuído também para esse aumento da sensação de insegurança e para a naturalização dos casos de violência? Para pensar.