As críticas da GloboNews ao presidente Jair Bolsonaro, do PL, são pertinentes. Porque são uma defesa da democracia — que, claro, merece proteção.

Então, se as críticas são apropriadas, porque se está defendendo a democracia e vituperando um presidente de caráter autoritário, a GloboNews está agindo de maneira correta.

De fato, a GloboNews faz jornalismo de primeira linha, com uma equipe de excelente qualidade.

Dito isto, o que está, digamos, “pegando”? O excesso de “bolsonarismo” na cobertura do jornalismo da GloboNews. Os telespectadores certamente querem reportagens e debates que retratem mais o país, sem deixar, evidentemente, de realçar os equívocos de Bolsonaro e de seu governo.

No momento, fica-se com a impressão de que a GloboNews criou a Central de Produção Bolsonaro, com vários jornais, todos com o título, informal, de “Jornal do Bolsonaro” (o “Em Pauta” deveria mudar o nome para “Em Pauta Bolsonaro”). Fala-se tanto de Bolsonaro, massifica-se tanto o seu nome, que, no lugar de destruí-lo, o que está fazendo é a sua reconstrução. Ele pode acabar com a imagem positiva do indivíduo que enfrentou a Globo e “não” foi derrotado, mesmo se perder a eleição para Lula da Silva, do PT.

Marcelo Cosme e o excelente time de jornalistas do “Em Pauta” | Foto: Reprodução

A história do falem mal, mas falem de mim parece que, de alguma maneira, agrada a Bolsonaro. Porque o mantém na imaginação popular.

Bolsonaro “apanha” do jornalismo da GloboNews — e não só do canal do Grupo Globo — e as pesquisas de intenção de voto indicam que está crescendo e que a possibilidade de segundo turno é real.

O presidente melhorou seus índices nas pesquisas não por causa do “excesso” de críticas da GloboNews, e sim por causa do Auxílio Brasil — 600 reais fazem a diferença para uma família pobre — e dado seu “empenho” na “derrubada” do preço da gasolina. Só isso? Mais isso, é certo. Mas há também uma parte dos eleitores, que nem mesmo é bolsonarista, que não quer a volta do PT ao poder. Tais eleitores, possivelmente das classes médias, são críticos viscerais da corrupção (mensalão, petrolão etc) e não estão convictos de que o governo de Bolsonaro é tão ou mais “sujo” do que os do PT.

O “Jornal Nacional” pode ensinar alguma coisa àqueles que fazem a GloboNews. O jornal apresentado por Renata Vasconcellos e William Bonner não deixa de expor críticas ao Bolsonaro, mas tem procurado mostrar o país — a vida de seus pobres, abandonados ao deus-dará. As reportagens que mostram o Brasil real são precisas e cuidadosas.

O Brasil de Bolsonaro que o “Jornal Nacional” exibe, mas a GloboNews às vezes ignora — optando, quase sempre, pela crítica política —, é terrível. Este Brasil, que existe em cada cidade mas é mais ressaltado nas ruas dos grandes municípios, precisa ser mais acentuado. Ele é bolsonarista, por que às vezes vota em Bolsonaro? Não é. Tal Brasil só quer sobreviver, tanto que, um dia, foi, não petista, e sim lulista. Fica com quem o atende.

Wilker Leão e Jair Bolsonaro: conflito entre caubóis de Marlboro | Foto: Reprodução

Falta à GloboNews evidenciar também o empobrecimento da classe média. Recentemente, o Jornal Nacional mostrou o alto endividamento dos pobres, mas não são apenas os pobres que estão endividados. Embora seja pouco ouvido, inclusive pelos eleitores, Ciro Gomes, do PDT, é o único que tem um discurso para os endividados.

A imprensa deliciou-se com o enfrentamento entre o ex-cabo Wilker Leão e o ex-capitão Bolsonaro. Mostrando coragem, além de desrespeito, Wilder criticou duramente o presidente: “Quero ver se é corajoso de sair pra conversar comigo, tchutchuca do Centrão. Você é tchutchuca do centrão”. O candidato à reeleição saiu do automóvel e agarrou o youtuber pela camisa.

Por que Wilker irritou tanto Bolsonaro? Primeiro, por sua coragem. Segundo, porque falou nos termos do presidente, com a história de “tchutchuca do Centrão”. Terceiro, mexeu com o machão, o caubói de Marlboro que há no coração do político, ao chamá-lo de covarde.

A pergunta é: por que Wilker, a quem falta consistência — de alguma maneira, é um bolsonarista irritado com o “novo” Bolsonaro, o do Centrão —, incomodou mais o presidente do que a crítica cotidiana, faca só lâmina, da, digamos, mídia? Talvez pelo excesso verbal. Mas o youtuber descobriu um ponto chave… que desestabilizada o presidente.

Ricardo Barros, Jair Bolsonaro, Ciro Nogueira e Arthur Lira: o poder “moderador” | Foto: Reprodução

O Centrão é a desgraça do país, como pensam a mídia e Wilker, o tchutchuca do jornalismo anti-bolsonarista? Talvez não seja. O mais provável é que o autoritarismo de Bolsonaro só não avançou por causa do papel moderador do Centrão. Os políticos desta federação de partidos, a única que realmente funciona, são moderados e não querem nenhuma ditadura e há, de fato, quem, ao lado do caubói de Marlboro, queira. É preferível um Centrão fisiológico, que arranca nacos de dinheiro do setor público, do que uma ditadura bolsonarista. A crítica de Wilker ao Centrão, que tanto agradou a imprensa e desagradou Bolsonaro, é menos pertinente do que parece. Por ter se tornado “tchutchuca do Centrão” é que Bolsonaro recua em relação à possibilidade de um golpe.

Retomando a crítica inicial: a GloboNews é ótima, assisto seus programas todos os dias, mas seus jornalistas precisam descobrir que o Brasil é maior do que Bolsonaro. Será que, entre tantos governadores, nos 26 Estados e no Distrito Federal, não há um que, apesar da crise, esteja fazendo um governo de qualidade, inspirador? Se não são mostrados, fica a sugestão de que o caos é geral. Portanto, se todos são ruins — por isso não são mostrados —, por que não ficar com Lula da Silva ou mesmo com Bolsonaro? Talvez seja a mensagem que está se tornando, por assim dizer, inconsciente coletivo.