Glenn Greenwald, americano, e Lula da Silva: o primeiro, jornalista quase  iniciante, parece ter sido seduzido pelo segundo, político experimentado | Erick Dau/The Intercept
Glenn Greenwald, americano, e Lula da Silva: o primeiro, jornalista quase
iniciante, parece ter sido seduzido pelo segundo, político experimentado | Erick Dau/The Intercept

O advogado americano Glenn Greenwald, um dos responsáveis por divulgar as denúncias de espionagem feitas por Edward Snowden, está impressionado com a imprensa brasileira.

Depois de entrevistar o ex-presidente Lula da Silva, que parece tê-lo influenciado, disse, no site The Intercept: “Estou chocado com a mídia aqui. Como as Organizações Globo [sic, é Grupo Globo], ‘Veja’, ‘Estadão’, estão tão envolvidos no movimento contra o governo, defendendo os partidos de oposição. Eles fingem imparcialidade, mas, na realidade, agem como a principal ferramenta de propagada. Quero discutir o papel da mídia brasileira incitando os protestos e pressionando a saída de Dilma” Rousseff.

É possível que haja excessos e que a versão do outro lado não esteja sendo exibida de maneira adequada. O mais provável é que o outro lado, ante os fatos estarrecedores, não esteja conseguindo apresentar uma versão crível dos fatos.
Curiosamente, Glenn Greenwald não fez comentários sobre a corrupção dos governos do PT.

Parece tê-las achado “normal” ou desconhece a extensão das investigações.

Glenn Greenwald parece ignorar a história de Lula da Silva e do PT. Noutros episódios, antes e depois do impeachment de Fernando Collor, ninguém “usou” a imprensa tão bem para atacar governos e políticos. O petismo “vazava” documentos e os integrantes do PT davam entrevistas bombásticas e criavam “movimentos críticos” — ótimas fontes para a imprensa — com o objetivo de descontruir seus adversários, por vezes, tratados como inimigos a serem destruídos. Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, para citar apenas dois políticos, foram atacados com virulência pelo PT.

Por não conhecer bem a história política do país, Glenn Greenwald não questiona uma fala de Lula da Silva sobre a “impressa ideal”: “Altamente democrática, que tivesse sua opinião política e ela fosse expressa num editorial, mas que fosse muito, muito fiel aos fatos. Que não tivesse versão, tivesse os fatos. Pois bem, aqui no Brasil hoje você não tem partido de oposição. Aqui no Brasil quem faz a oposição é, na verdade, a mídia”.

O que Lula da Silva diz é até bonito, mas não traduz o comportamento do PT. Quando na oposição, o petismo usava a imprensa para desancar seus adversários, expondo mais versões do que fatos (na prática, a “imprensa ideal”, do ponto de vista de Lula, é a que defende o PT, como “CartaCapital”). Grave, porém, é como o ex-presidente, com a anuência de Glenn Greenwald, omite as ações da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da Justiça Federal — concentrando sua crítica, ou raiva, na imprensa.

Glenn Greenwald sequer especula: as investigações e denúncias da Operação Lava Jato, de que o governo do PT criou uma corrupção sistêmica, são falsas? Não são e os fatos, e não as versões, estão sendo expostos em toda a sua crueza. Os fatos são chocantes, não as denúncias em si. É o busílis da questão.

O que aconteceu com Glenn Greenwald? Primeiro, não se trata de um jornalista profissional e, por isso, tende a ficar impactado com entrevistas de políticos sedutores como Lula da Silva.

Segundo, parece que está lendo e vendo pelo alto o que está acontecendo no Brasil. A corrupção do governo petista deveria impressioná-lo mais do que as críticas — verdadeiras — da imprensa. Ele deveria conversar com o juiz Sergio Moro e com pelo menos um dos procuradores federais, como Deltan Dall’Agnol. Teria uma ideia mais circunstanciada das investigações e constataria que a imprensa está divulgando as informações com o máximo de lisura e rigor.

Aos radicais, à esquerda e à direita: apesar do posicionamento pró-Lula, Glenn Greenwald é um profissional competente e íntegro.

A entrevista de Lula — interessantíssima — pode ser lida no site The Intercept.