As big techs publicam tudo nas redes sociais e plataformas de busca? Até podem publicar, mas, no geral, selecionam aquilo que os leitores e telespectadores devem ler e ver. Há, digamos, uma espécie de “censura”, talvez mais comercial do que de natureza ideológica.

Quando o Google decidiu lançar um comunicado contra a aprovação da PL das Fake News, há pouco dias, deu destaque total ao seu material editorial, e não concedeu o mesmo espaço às críticas. Deu uma de Cuba da internet. O Telegram também fez uma crítica aberta ao projeto de lei e a enviou para todos aqueles que usam o aplicativo.

É uma ilusão, mais dos incautos do que dos cautos, a ideia de que os empreendimentos das big techs são grandes centros democráticos, porque, em tese, abrem espaço para tudo. Não é bem assim. Sua censura, portanto controle, ocorre na seleção. Pode ser uma escolha interna ou aquilo que é divulgado é patrocinado por terceiros para figurar com destaque.

Uma voz quase sempre moderada, contra os excessos, inclusive os dos aplicadores da lei, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, concedeu uma valiosa entrevista ao “Correio Braziliense”.

Gilmar Mendes postula que as redes sociais devem ser responsabilizadas por aquilo que divulgam e, inclusive, selecionam como destaque. Fake news costumam a apimentar as redes sociais, como Facebook e Twitter, e, por isso, longe de serem barradas, são, por vezes, acolhidas e incentivadas.

“Não basta o Marco Civil da Internet, o artigo 19, que exige que o conteúdo — tem sido assim interpretado — só possa ser retirado mediante ordem judicial. É preciso que haja outra arbitragem nesse sentido e que a gente possa avançar”, sublinha Gilmar Mendes.

A liberdade de expressão merece defesa renhida, admite o ministro. Porém, frisa, “também na vida geral não se pode dizer tudo”. O que defende “é um modelo de liberdade com responsabilidade”. Há liberticidas que defendem liberdade total, e nenhuma censura, porém, quando sofrem o menor ataque — uma crítica mais dura —, são os primeiros a ficarem revoltados e, até, “abalados”.

É belo falar em liberdade de expressão, porque é típico da democracia. Entretanto, como o bom senso nem sempre é distribuído de maneira adequada, o excesso dos adversários (e até inimigos) deve ser contido pela lei, que, sim, é democrática, nada tem a ver com ditadura (o que não se pode é viver numa terra sem lei). Aquele indivíduo que é responsável — que expõe sua ideia com firmeza, mas sem ataques gratuitos e, às vezes, falsos — não precisa temer a pena de um juiz.

Os brasileiros, portanto o Brasil, não podem ser servos, voluntários ou não, das big techs. “Somos uma nação grande, a oitava economia do mundo, temos 200 milhões de habitantes, um imenso território, somos quase um continente. Não podemos agora ser servos dessas big techs, não podemos, por propósitos argentários delas, estar submetidos ou nos submeter a um risco imenso”, assinala Gilmar Mendes.

As big techs não querem respeitar a legislação dos países, como se fosse possível se viver num mundo que, de tão livre, prescinde de leis. O que elas não dizem, e jamais irão dizer, é que já estão fazendo o mundo jogar de acordo com suas regras — daí os bilhões de dólares de seus principais sócios (Mark Zuckerberg, Elon Musk, entre outros). Ao menos no geral, as grandes empresas de tecnologia não têm preocupação alguma com liberdade de expressão e direitos dos indivíduos. Porém, como falar em liberdade de expressão é néctar para os nossos ouvidos, seus dirigentes adotam aquele discurso que agrada as maiorias.

Nas redes sociais, ou quando se vasculha o Bing e o Google, em busca de informações, o indivíduo é livre? Não é. A inteligência artificial “varre” tudo em busca de informações para definir o que as pessoas querem ou, dependendo do que é mostrado, podem querer ver. A vida privada não existe nas redes sociais, na internet em geral. Porque está inteiramente devassada, portanto se tornou mais pública do que devia.

Gilmar Mendes diz, de maneira pertinente: “Não estamos discutindo apenas o problema dos ataques nas redes sociais, estamos discutindo democracia, porque há uma perturbação da democracia. Vimos que essa eleição de 2018, de alguma forma, foi definida nas redes sociais e, se isso continuar, esse campo de selvageria, certamente podemos reeditar esse fenômeno”. Eu acrescentaria que, apesar de se ter uma Justiça mais atenta, a eleição de 2022 não foi muito diferente da de 2018.

O ministro do Supremo avalia que as investigações sobre os atentados extremistas de 8 de Janeiro deste ano, em Brasília, não estão completas. “Tenho a impressão de que está faltando alguma coisa sobre os financiadores, porque, de fato, de novembro até 8 de janeiro, essas pessoas tiveram uma estrutura.”