Quando não há fatos não se deve apresentar fatos “alternativos” para passar a impressão de que se é bem-informado. Porém, quando apresentam fatos que não parecem fatos, e sim versões edulcoradas, o que se deve sugerir? Talvez nada.

O jornalista Matinas Suzuki Jr. saiu da Editora Companhia das Letras, uma das mais qualificadas do país, e a imprensa publicou o fato de maneira cândida, diria Voltaire. Por que ele deixou o cargo de diretor de Operações?

De acordo com Walter Porto — da “Folha de S. Paulo”, na reportagem “Matinas Suzuki deixa a Companhia das Letras após quase 15 anos na direção” —, o editor vai “se dedicar a projetos pessoais”.

Walter Porto esqueceu de fazer a lição de casa”: quais são os “projetos pessoais” de Matinas Suzuki? Não sabemos. Porque o repórter não faz questão de informar, sequer ousa dizer: “O jornalista e editor não quis revelar seus novos projetos”.

O repórter apresenta os encômios de praxe do chefão da Companhia das Letras, Luiz Schwarcz: “Matinas foi meu braço direito nesses anos todos”.

Luiz Schwarcz: editor da Companhia das Letras | Foto: Reprodução

Luiz Schwarcz acrescenta: “Sua atitude empreendedora e dedicação total à Companhia marcaram não só a vida da empresa e de sua equipe, mas a minha também, e em grande medida. Perco o convívio diário com um grande amigo, que me fará muita falta”.

A “omissão” do jornalista e do editor da Companhia das Letras nos autoriza a especular? Sim, mas não a apresentar certezas, e sim perguntas. Então, vamos lá.

A fala de Luiz Schwarcz sugere que o grupo que comprou a Companhia das Letras, mas o mantém como editor, pode ter “demitido” Matinas Suzuki? O grupo quis reduzir custos? Não sabemos. Há, nas entrelinhas da fala “cordial” do editor, um pedido de desculpas ou uma insinuação de que nada pôde fazer para manter o emprego do “amigo”? Bem, não se pode forçar nem as linhas nem as entrelinhas.

Afinal, Matinas Suzuki, criador da ótima coleção Jornalismo Literário (tenho todos os exemplares), foi demitido ou pediu para sair? A palavra “deixa” – ou seja, “deixa a Companhia das Letras” – é tanto vaga quanto ambígua. E, novamente, o repórter Walter Porto, por sinal, faz uma cobertura de cultura de qualidade, dormiu no ponto – aparentemente pisando em ovos. Porque, infelizmente, não se sabe.

Matinas Tupinambá Suzuki Júnior, de 70 anos, será substituído, em 2025, por Mariana Zahar Ribeiro, que dirigiu a Editora Zahar por 20 anos.

Mariana Zahar Ribeiro pertence a uma família de editores. Jorge Zahar, falecido, foi um dos maiores editores brasileiros. Ele fundou a notável Zahar.

Segundo a “Folha”, cujo jornalismo é feito de lacunas, como indica a reportagem de Walter Porto, Mariana Zahar Ribeiro atuará ao lado dos fundadores Luiz Schwarcz e Lilia Schwarcz, dos publishers Julia Schwarcz e Otávio Marques da Costa e das diretoras de Operações Financeiras, Ana Paula Rocha, e de Comunicação, Mariana Figueiredo.

Por fim, mais uma pergunta, claramente especulativa, quer dizer, não amparada em fatos: o grupo que comprou a Companhia das Letras (associada à Penguin) planeja, a médio ou longo prazo, substituir o admirável editor Luiz Schwarcz? Não sabemos. Mas o bem-informado Walter Porto – quase sempre seguro – poderia escarafunchar um pouco, como repórter que é (editor não é profissão – é cargo), e nos dizer o que realmente está acontecendo nos bastidores de uma das melhores editoras brasileiras.