Comentarista esportivo comporta-se como torcedor e não como analista. Casagrande é exceção?
29 setembro 2024 às 00h00
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Comentarista esportivo comporta-se no Brasil mais como torcedor — emoções à flor da língua — do que como analista objetivo e distanciado.
O ex-jogador Tostão (Eduardo Gonçalves de Andrade), de 77 anos, é um dos poucos analistas que não se comportam como torcedor. Seus artigos, publicados na “Folha de S. Paulo”, são exemplos de comentários pertinentes e lógicos. É uma pena que o ex-craque do Cruzeiro e da Seleção Brasileira não tenha se tornado comentarista de futebol na televisão.
Porque nas emissoras de televisão, como a Globo, comentaristas e narradores — que se arvoram também a comentaristas (o ex-global Galvão Bueno é o exemplo notório) — são, quase sempre e quase todos, torcedores fanáticos. Criticam jogadores, técnicos e árbitros de maneira excessiva — às vezes, até abusiva. Os elogios também são excessivos. Jogadores medianos, quando fazem uma bela partida, se tornam craques quase do nível de Pelé, Garrincha, Zico e Sócrates.
Em jogos da Seleção Brasileira, sobretudo da masculina, os comentaristas parecem enlouquecidos — à beira de um ataque de nervos, se o time joga mal. O craque de ontem, se não jogar bem uma partida, é tratado como perna de pau. Se é mediano, mas jogou bem, é apresentado como cracaço.
Os brasileiros hoje parecem menos passionais e, pelo que tenho visto, muitos nem torcem para times de futebol. Porém, os narradores e comentaristas continuam vivendo no passado — o de torcedores. O mais provável é que os leitores e telespectadores queiram muito mais análises sóbrias e bem-informadas.
É certo que se vive no mundo do espetáculo, então narradores e comentaristas trabalham como se, atores, estivessem atuando, entretendo.
Como torcedor — do Santos, do Fluminense e do Goiás — e apreciador do bom futebol, não tenho apreço algum por narradores e comentaristas que gritam e julgam, de maneira acerba, jogadores, técnicos e árbitros. Gostaria que fossem menos emocionais e mais precisos.
Não estou sugerindo que não podem julgar. Podem e devem. Estou propondo tão-somente que sejam mais lógicos e objetivos na avaliação dos profissionais diretamente envolvidas com o futebol, como jogadores, técnicos e árbitros.
Casagrande: estrela da análise esportiva no YouTube
O arrazoado acima tem a ver com a contratação (li a notícia no “Lance!”) do comentarista esportivo Walter Casagrande pelo canal esportivo Desimpedidos (no YouTube), da empresa NWB.
Casagrande, o Casão, entende muito de futebol. Portanto, quando quer e não é convocado para exceder-se — ao lado de Galvão Bueno, se tornava um poço de emoções incontroláveis —, comenta muito bem as partidas. Ex-jogador de futebol, era um atacante de primeira linha — não um cracaço da estirpe do centroavante Reinaldo, do Atlético Mineiro —, fez muitos gols no Brasil e no exterior.
(O fato de ter usado drogas não me abala em nada, nem mesmo no tratamento que dou ao cidadão Walter — que respeito. O discurso moralista em relação ao vício não ajuda em nada a combatê-lo. Aquilo que parece “caso de polícia”, talvez seja mais uma questão de saúde e, ao mesmo tempo, cultural, quiçá geracional.)
Corajoso, quando não está sob controle de determinadas orientações, Casagrande é um comentarista que diz o que pensa, e o faz com qualidade, sempre se posicionando de maneira direta, firme e precisa. Oxalá, portanto, que brilhe no Desimpedidos (nome, por sinal, interessável), como força a natureza que é.
Casagrande vai integrar a equipe do quadro “Live de Quinta”. Ele trabalhará ao lado do influenciador Bira e do criador de conteúdo Bruno Ryan. As reportagens serão de responsabilidade de Danilo Soto.
A estreia da nova programação, com os recém-contratados, se dará na quinta-feira, 3 de outubro. De acordo com o “Lance!”, o objetivo “é promover entretenimento em um modelo de revista eletrônica esportiva”, na qual “a equipe irá selecionar os 11 melhores assuntos do período para trabalhar. Cada assunto será abordado de” maneira “dinâmica, com opiniões e conversas com o público e o povo na rua”.
Casão trabalhou 25 anos na Globo, ao lado de Galvão Bueno, Cleber Machado e Arnaldo César Coelho.
A voz de Walter Casagrande, o Casão
“Já fiz várias estreias na minha carreira, tanto como jogador, comentarista esportivo, entrevistador e até como ator tive uma estreia. Agora, terei mais uma que é tão importante como todas as outras. Aquele friozinho na barriga sempre aparece e é uma delícia. Chego no Desimpedidos com tudo, para ter opiniões diretas como sempre, para contar histórias, mas, o mais importante, cheguei para divertir. Agora, é só vestir a camisa e ir para o jogo!”