Em 23 de novembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vetou a íntegra do projeto de lei nº 334/2023, aprovado pelo Senado Federal e que visa prorrogar por mais quatro anos a chamada desoneração da folha salarial.

A desoneração, na prática, é como um incentivo fiscal e se destina a 17 grandes setores da economia. São eles: confecção e vestuário; calçados; construção civil; call center; comunicação; empresas de construção e obras de infraestrutura; couro; fabricação de veículos e carroçarias; máquinas e equipamentos; proteína animal; têxtil; tecnologia da informação (TI); tecnologia de comunicação (TIC); projeto de circuitos integrados; transporte metroferroviário de passageiros; transporte rodoviário coletivo; e transporte rodoviário de cargas.

O benefício começou no primeiro mandato de Dilma Rousseff (PT), com a Lei 12.546/2011. Para baratear o custo das empresas com empregados, houve a retirada da obrigatoriedade de elas pagarem ao Estado sua contribuição à Previdência, calculada em 20% do conjunto dos salários dos funcionários. Esses empregadores puderam pagar um valor menor, a partir de outro cálculo: de 1% a 2% do total do faturamento da companhia. Ou seja, a empresa beneficiada deixa de pagar impostos pela quantidade de funcionários, passando a pagar pelo quanto ela ganha.

Parece algo bem sacado: afinal, em tese as empresas poderiam contratar mais, sem que necessariamente os impostos aumentassem, já que o valor pago só passaria a subir se lucrassem mais.

Na prática, não foi bem assim. O incentivo à empregabilidade parece ter saído pela culatra. Na tribuna, o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) apresentou dados que mostraram quem, nos 12 anos em que a desoneração vigora, os setores que receberam o benefício tiveram redução de 960 mil postos de trabalho. Os números, segundo ele, são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad).

Uma questão em particular incomodou o jornalista e economista Pedro Menezes: os benefícios concedidos às grandes empresas jornalísticas por meio da desoneração da folha de pagamento. Bastante ativo nas redes sociais, especialmente no X/Twitter, onde tem mais de 75 mil seguidores, Menezes fez vários questionamentos sobre a conduta dessa pauta na imprensa.

Para ele há uma questão ética nítida da profissão que está sofrendo impacto: é que, nas mais diversas reportagens que foram feitas durante a tramitação da proposta, as empresas simplesmente não deixaram o público a par de que seriam beneficiárias do processo.

Pedro Menezes pontuou que a lei vetada por Lula menciona explicitamente que o benefício vale para “as empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens”. Em sua exposição na rede social, o economista chega a citar grandes empresas que foram beneficiadas, como a Folha de S.Paulo e o grupo Globo, por meio de acesso a seus códigos no Classificação Nacional de Atividades Econômicas (Cnae).

A decisão presidencial pode – e muito provavelmente vai ser – derrubada pelo Congresso. Isso porque os afetados são basicamente os “donos” do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Sua influência política sobre deputados e senadores é enorme, tanto que alguns parlamentares já falam em “rápida” derrubada do veto. A questão que pesa aqui e fica para reflexão se engloba menos na política do que nos princípios éticos do jornalismo: até que ponto é lícito informar sobre um tema que interessa diretamente ao veículo sem expor ao público toda a questão com a maior transparência possível?