Bernardo Sayão: o engenheiro que foi decisivo na construção da Belém-Brasília e de Brasília

13 agosto 2023 às 00h01

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“Junto com a estrada, a gente tem de deixar alguma coisa para o povo começar a vida. Primeiro, a instrução. Eu acho que posso dar tudo para o povo, mas, se não deixei uma escola, não deixei nada.” — Bernardo Sayão
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Brasília e Belém-Brasília: refundação do Brasil
A construção de Brasília provocou polêmica e parte do país, notadamente o Sudeste — leia-se São Paulo e Rio —, levantou-se contra o presidente da República, Juscelino Kubitschek.
O Sudeste é uma espécie de metrópole e os demais Estados, a maioria, são colônias. Basta que desenvolvam as áreas que produzem matérias-primas. A industrialização fica para o Sul. Brasília é uma bela capital, com sua arquitetura moderna — um feito de Lucio Costa, Oscar Niemeyer e outros menos famosos. Porém é mais do que uma questão estética, ou uma cidade-escultura.
JK era um homem inteligente, um ás político, mas não era dado a firulas teóricas. Entretanto, ao construir Brasília, sabia que estava mexendo nas estruturas chaves do desenvolvimento do país. Ao edificar a nova capital no Centro-Oeste, contribuiu para desconcentrar, ao menos em parte, o crescimento-desenvolvimento do país.
Brasília transformou o Centro-Oeste e o Norte do país. Puxou crescimento econômico e, corolariamente, desenvolvimento.

A expansão econômica do país continuou (e continua) desigual, mas em menor escala. O Brasil teve de olhar para si próprio, compelido a aceitar um novo descobrimento. Pode-se sugerir, portanto, que, como capital, Brasília refundou, de alguma maneira, a nação patropi. Então, o médico de Diamantina é o novo Pedro Álvares Cabral — com a diferença de que não chegou para explorar, e sim para desenvolver e conviver.
Para enfrentar a insolência verbal do país — com Carlos Lacerda na comissão de frente —, Juscelino teve de contar com homens obstinados, construtores do presente e advogados do futuro. Entre eles devem ser incluídos alguns neo-bandeirantes: o engenheiro-agrônomo Bernardo Sayão Carvalho Araujo (sem acento), Ernesto Silva, o engenheiro Joffre Mozart Parada, o engenheiro Waldir Bouhid (parente de Aline Bouhid, editora do Jornal Opção Online), o engenheiro Atahualpa Schmitz, o marechal José Pessoa, os arquitetos Lucio Costa e Oscar Niemeyer e os abnegados candangos (trabalhadores que saíram de suas cidades em vários Estados do Centro-Oeste, do Norte e do Nordeste).

Tendo estudado em São Paulo e Minas Gerais, onde se formou engenheiro-agrônomo — a impressão que se tem é que era mais engenheiro do que agrônomo —, Bernardo Sayão, antes de articular a Belém-Brasília (que os goianos chamam de BR-153 — e, oficialmente, deveria ser Rodovia Bernardo Sayão) e de contribuir na construção de Brasília, fundou, em 1941, no governo do presidente Getúlio Vargas, a Colônia Agrícola Nacional de Goiás, em Ceres. Apesar de o governo ser conservador, a Cang era próxima (não igual) das ideias socialistas ou dos kibutzim de Israel.
Neste texto, vou me concentrar em dois aspectos: a morte de Bernardo Sayão, em 19 de janeiro de 1959 — há 64 anos —, no Maranhão, e como o engenheiro foi “narrado” pela pena de jornalistas, escritores e políticos. Uma visão geral do construtor de estradas e cidades pode ser conferida no excelente livro “Bernardo Sayão — Caminhos, Afetos, Cidades (Edição do autor, 257 páginas), de Sérgio de Sá. O livro será lançado na segunda-feira, 21, às 10h30, no Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, na Casa Rosada da Praça Cívica. A obra do jornalista, crítico literário e professor-associado da UnB é a base deste texto. Trata-se de uma valiosa e ampla pesquisa, a respeito da qual recolhi apenas alguns detalhes. A edição é primorosa e contém fotografias significativas.

Quando recebi um exemplar, das mãos do jornalista e historiador Jarbas Silva Marques, torci, de cara, o nariz. Ao saber que Sérgio de Sá é neto de Bernardo Sayão, comentei com meus neurônios: “Deus, mais uma hagiografia!”. Mas Jarbas, que leu o livro numa sentada, atravessando a madrugada — os pés chegaram a ficar frios —, garantiu: “Não tenha preconceito. Sérgio não é hagiógrafo”. Não deveria contar como tive acesso à obra, mas jornalista é obrigado a relatar a verdade, ainda que seja inconveniente.
(Sérgio de Sá autografou o livro para Jales Guedes, o doutor em História que remodelou o Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, mas, ao fazê-lo, escreveu “para Paulo Guedes”, o Posto Ipiranga que o ex-presidente Jair Bolsonaro transformou em Posto Tabajara. Constrangido, Jarbas Marques cortou a dedicatória, com tesoura, mas não entregou o exemplar ao presidente do IHGG — deu-o a mim, que, até então, era membro do Movimentos dos Trabalhadores Sem Livros — MTSL. Jurei ao Jarbas Marques, amigo há quase quatro décadas, que não contaria a história. Porém, pensando em Bernardo Sayão, que apreciava a verdade, decidi contá-la. Espero que o Jales Guedes, um gentleman, não exproprie o exemplar, que, a rigor, é dele.)

Como não leio tão rápido quanto Jarbas Marques, demorei dois dias para concluir a leitura. De pronto, digo e afirmo: não se trata de uma hagiografia. Pelo contrário, embora não seja uma biografia exaustiva e convencional (talvez seja mais um perfil, vazado num maneira que distancia-se para aproximar-se e aproxima-se para distanciar-se), trata-se de uma pesquisa rigorosa e, importante, nuançada. Sérgio de Sá conseguiu estabelecer um texto que, embora não seja frio e seco, não perde, em nenhum momento, a objetividade. Sobretudo, é muito bem escrito, vazado numa prosa de escritor. Há prosa, há poesia e há rigor factual.
Quando se trata de expor os inquéritos contra Bernardo Sayão, Sérgio de Sá não promove sua defesa, não adjetiva o texto, optando por deixar que verbos e substantivos de terceiros decidam a parada. Não, leitor, o engenheiro das estradas e das cidades não era corrupto. O que fazia, por vezes, era retirar recursos financeiros de uma área e alocar em outra, ou seja, onde eram necessários. No lugar de construir uma casa para o diretor, ele mesmo, investia em estrada e escola.

Bernardo Sayão não morreu “mendigo”, mas, para um construtor de cidades e estradas, além de vice-governador de Goiás — na gestão de Juca Ludovico (José Ludovico de Almeida), não legou riquezas aos parentes. Faleceu pobre. A família — inclusive a viúva Hilda Fontenelle Cabral — teve de trabalhar firme para sobreviver. Chegou a contar com a ajuda de amigos, como Jorge Yunes, o Gaúcho.
Homem bonito, forte (apreciava exercícios físicos, e foi um grande remador), alto (1,84m), Bernardo Sayão chamava a atenção das mulheres. JK chegou a dizer que, quando aparecia, as mulheres deixavam, digamos assim, de cortejá-lo. Ficavam próximas do carioca que a vida tornou goiano-candango. Misto de Clark Gable (ou Gary Cooper) e John Wayne, era de uma elegância natural — não trabalhada. Tinha porte de nobre. Mas era um aristocrata de mãos grossas de chefe-trabalhador, o que Juscelino percebeu logo ao convocá-lo para ajudar na construção de Brasília e o colocou como diretor da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap). Ele liderava a multidão de trabalhadores mais pelo uso da palavra, pelo exemplo pessoal — pegava no pesado, dirigia trator, atravessava rios a nado —, do que pelo grito. Sua palavra era uma espécie de lei para os homens calejados de sua equipe.

Criativo, Bernardo Sayão fez uma ponte estranha sobre o Rio das Almas. A ponte era feita “de tambores de óleo diesel que deveriam ser devolvidos ao fornecedor de combustível e que ele apelidou carinhosamente de Carmen Miranda: balançava muito”.
A primeira visita de Bernardo Sayão ao Estado de Goiás se deu em 1939. Em Jaraguá foi ciceroneado pelo poeta Augusto Ferreira Rios (a história é contada na página 48). E morou numa casa que pertencia a Mário Félix de Sousa. “Sayão fundou a Colônia Agrícola morando em Jaraguá”, anota Iracema Félix.
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Morte de Bernardo Sayão: árvore foi a pedra no caminho
Bernardo Sayão estava construindo a Belém-Brasília — a rodovia que ligou o país — “quando o enorme galho de uma árvore teve a ousadia de cair-lhe sobre o corpanzil”, relata Sérgio de Sá. “O galho de uma árvore de supostos 40 metros cai sobre o ‘bandeirante moderno’, dilacerando mais do que seu corpo viril: um projeto pessoal de nação, traçado sobre a vontade de abrir infinitas estradas país adentro.”
Não se sabe com precisão qual a espécie da árvore que matou Bernardo Sayão. Sérgio de Sá sugere que pode ter sido um “jatobá em seu auge de crescimento. Para fraturar o crânio a partir o ombro, não um pedaço qualquer de madeira. Tora”. Na página 189, numa citação de Francisco Manoel Brandão, volta-se a falar no “último jatobá a ser posto em baixo pelas possantes máquinas”.
Há versões diferentes para o que ocorreu. Com um mapa nas mãos, para verificar o que deveria ser feito, Bernardo Sayão sentou-se numa rede. Gustavo Fialho conta que, de repente, “alguém grita: ‘Olha o pau!’” As pessoas correram, mas o engenheiro-agrônomo “não teve tempo de tirar a perna”. Ele ficou preso na rede.

O repórter Antonio Callado apresenta outra versão: “Esse chefe da Bandeira sentou-se um instante a uma mesa de campanha, examinando um mapa, à beira do picadão. Lá no topo de uma árvore de 40 metros de altura, abalada pelos estradeiros, um galho estalou imperceptivelmente. Pesado, sua extremidade ramalhuda agravou logo o esgarçamento das fibras de madeira, da casca, estalou um pouco mais alto no silêncio da floresta ainda mal desperta do meio-dia bruto — e caiu”.
Na versão de Léa Sayão, filha do bandeirante — estribada em relato do engenheiro Gilberto Salgueiro e do topógrafo Jorge Dias —, Bernardo Sayão e os dois traçavam planos dentro de uma barraca. Várias árvores gigantescas estão sendo derrubadas e alguém grita: “Cuidado, a árvore!”
Gilberto Salgueiro nada sofreu, mas Jorge Dias ficou com um braço machucado. “Ainda se vê Sayão de pé, ‘com uma enorme fratura exposta na perna esquerda’. Braço esquerdo completamente esbagaçado, uma enorme fratura na cabeça”, diz Léa Sayão. “O lado esquerdo esvai-se em sangue.”
Bernardo Sayão “geme e leva a mão à cabeça” e toma coramina.
Há outras versões, como as do jornalista Arnaud Pierre e do ex-prefeito de Ceres Valter Melo, autor do livro “Um Ceresino”, de 2012.
“Não houve tempo para o socorro que veio de helicóptero e, depois, de avião”, relata o biógrafo. O helicóptero era pilotado pelo major Henrique Alberto Peçanha Thomaz. “Sob as hélices, lá no alto, mais perto do sol que cega, Bernardo Sayão morreu. Abaixo, a floresta dava seu último adeus a quem ousou desafiá-la”, conta Sérgio de Sá.
Para construir estradas, era precisa derrubar centenas de árvore, mas, de acordo com Léa Sayão, Bernardo Sayão não gostava de cortá-las. “Este jatobá não podem derrubar. Quando eu morrer, quero ser enterrado debaixo desta sombra”, disse.
Ao operar a demarcação do Cemitério Campo da Esperança, em Brasília, Bernardo Sayão perguntou: “Quem será o infeliz que vai inaugurar este cemitério?” Acabou sendo ele. E, ao saber que o chefe havia falecido, o motorista Benedito Segundo sofreu um infarto e morreu. “Foi o segundo a ser enterrado” no cemitério da capital.
O povão compareceu ao enterro de Bernardo Sayão — o caixão não foi aberto, a viúva não queria que sua cabeça esfacelada fosse exibida — e chorou.

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Bernardo Sayão “trouxe” o mundo para Goiás e Brasília
Com sua personalidade ímpar, de homem que fazia e acontecia, Bernardo Sayão atraiu o interesse do Brasil e do mundo para Goiás e Brasília. E aqueles que vieram por causa dele contribuíram para divulgar, de maneira mais objetiva, o que se fazia no Centro-Oeste e no Norte. Perceberam uma espécie de refundação do país.

Em 1948, antes da construção de Brasília, o escritor americano John Dos Passos (que foi um dos melhores amigos de Hemingway, por um certo período) visitou o Brasil e se encontrou com Bernardo Sayão, em Ceres. Ele trabalhava para o grupo Time-Life.
“Dos Passos incrementou o texto do encontro com Sayão em Ceres, para incluí-lo no livro ‘Brazil on the Move’, lançado no Brasil pela primeira vez no começo de 1964, com o título de ‘O Brasil Desperta’”, anota Sérgio de Sá.
“De todos os homens que conheci, nenhum tinha maiores qualidades de chefe do que Bernardo Sayão. Construir estradas era para ele divertimento e obsessão”, escreveu, entusiasmado, John Dos Passos. O americano chamou-o de “o construtor de estradas”. O escritor apreciava “sua energia e sua determinação”.
Bernardo Sayão explica seu objetivo a John Dos Passos: “O que precisamos é de uma colonização em faixas, ou seja, construir estradas e colonizar a terra de ambos os lados”.
Observador arguto, John Dos Passos diz sobre Bernardo Sayão: “Quando ele fala da estrada sua voz assume um tom afetivo como se estivesse falando de um dos filhos”.
Em 1958, John Dos Passos esteve em Recife, onde conversou com a jornalista Isnar de Moura sobre Bernardo Sayão. De acordo com a repórter, o engenheiro “até parecia ter um único desejo: povoar e unir ao resto do Brasil o seu coração adormecido como se esperasse com isso dar vida finalmente ao velho gigante a ressonar em berço esplêndido”.
A construção de uma rodovia com 2.194 quilômetros foi a obsessão de uma vida. Ele disse à irmã Dulce que era difícil “vencer as burocracias emperradas” do país. Ele queria “juntar uma ponta à outra, conectar os pontos cardeais, abrir picada para o progresso”, assinala Sérgio de Sá.

Numa crônica de 1959, publicada na revista “O Cruzeiro”, a escritora Rachel de Queiroz apresentou Bernardo Sayão como um desbravador “sem medo de onça, sem medo de índio, sem medo de nada, derrubando árvores, subindo serra”. A um sobrinho, que tratava como neto, disse a respeito do carioca que se goianizou: “A vida do belo gigante que tinha o gosto de abrir estradas e criar cidades, que atravessava a nado um rio enorme, e saía no seu trator por dentro da mata”.
A jornalista americana Virginia Prewett Mizelle, encantada, escreveu que Bernardo Sayão era o “homem que abriu o Brasil”. Na revista “Seleções do Reader’s Digest”, a repórter publicou o perfil “Meu tipo inesquecível” no qual escreveu: “Ele não era descomunalmente alto, mas a figura desempenada, o tórax largo e o gosto pelos empreendimentos grandiosos que irradiava de seu simpático rosto quadrado e de seus olhos castanhos e perspicazes davam-lhe um ar de gigante”. Por sinal, para o Brasil, era, sim, muito alto.
Segundo Virginia Prewett, citada por Sérgio de Sá, “Bernardo Sayão é o comandante de um exército de desbravadores com os quais estabelece uma hierarquia moral, nunca imposta no grito”.
Relata Virginia Prewett: “Logo depois do nosso primeiro encontro, um lavrador bêbado atacou outro homem, ameaçando esfaqueá-lo. Sayão atravessou-se na frente, fixou no homem aqueles calmos olhos castanhos e disse: ‘Deixe ver sua faca’. O homem obedeceu, e pouco depois ele e ‘Doutor Sayão’ estavam rindo juntos”.

No comando dos trabalhadores, Bernardo Sayão costumava dizer: “Vamos embora! Vamos pra frente! Vamos acabar com isso!” Virginia Prewett diz, quando chegava num lugar, era notícia de imediato. Ele não usava armas. Porque acreditava “em cada um dos brasileiros”.
Mesmerizada por Goiás, Virginia Prewett “comprou terras perto de Ceres e lá ficou por três anos”, informa Sérgio de Sá.
Em abril de 1947, a “Time” publicou a reportagem “Boom in the Backland”. A revista tinha dois correspondentes no Brasil, William White e Connie White, mas, segundo Antonio Callado, a matéria teria sido escrita por Hernane Tavares de Sá. A publicação americana versava sobre a Colônia Agrícola Nacional de Goiás: “A Colônia, uma das sete criadas por [Getúlio] Vargas em 1941 e a mais bem-sucedida, é um experimento em socialismo agrário. Para os homens pobres ela traz a promessa da terra livre, casa, segurança”. O agente do governo é apontado como um homem “robusto” e “bronzeado”.
Em 1948 estuda-se a possibilidade de instalação de trabalhadores italianos na Colônia de Ceres.
Napoleão Lopes Filho, repórter do “Correio da Manhã”, diz que o diretor da Colônia Agrícola, Bernardo Sayão, “encarna um novo tipo de bandeirante — o homem culto e enérgico que luta por incorporar ao patrimônio nacional as terras que foram rastreadas pelos paulistas nos séculos 16 e 17”.
Em maio de 1949, Antonio Callado publica a reportagem, no “Correio da Manhã”, “Uma cidade que nasce no centro do Brasil” e conta a respeito da plantação de trigo filipino em Ceres.
Antonio Callado conversou longamente com Bernardo Sayão. “A ‘ideia fixa’ é prolongar a [estrada] Anápolis-Ceres até Belém do Pará.”
Mencionando Antonio Callado, Sérgio de Sá escreve: “Sayão pensa como matuto: estrada boa, legítima, é estrada aberta, para caminhão e automóvel, com ‘terra bem batida debaixo dos pneus’”.
No romance “Quarup”, de 1967, Antonio Callado transformou Bernardo Sayão no personagem Rolando Villar. O registro figura da página 119 à página 123.

A atriz americana Joan Lowell — trabalhou com Charlie Chaplin no filme “Em Busca do Ouro” — escreveu um livro, “Terra Prometida”, de 1952, no qual cita Bernardo Sayão. Sua conexão com o brasileiro está relatada nas páginas 99, 100 e 101.
Juscelino Kubitschek escreveu que “Sayão era um pioneiro nato. Fizera surgir do chão uma cidade, e ela progredia, sendo alvo da admiração dos que se aventuravam por aquelas paragens. Quando lancei a ideia da mudança da capital, fora dos primeiros a se alistarem na cruzada. Cooperou na construção do Catetinho e na ereção de muitas das barracas e galpões que abrigaram os primeiros engenheiros e trabalhadores”.
Uma das melhores cronistas de Brasília, a jornalista Conceição Freitas assim define o engenheiro: “Bernardo Sayão é a cara da aventura genial e incansável chamada Brasília. (…) O engenheiro era homem de campo aberto, das torrentes, das ventanias, um desbravador — não era um aventureiro que pretende encher os bolsos, ou que vagueia em busca do sentido da vida”.
No romance “Cidade Livre”, do escritor e diplomata João Almino, Bernardo Sayão aparece como personagem.
A historiadora Heloisa Starling, de acordo com Sérgio de Sá, “lê Sayão como aquele que sempre desejou que os trabalhadores não fossem embora depois de concluídos os trabalhos. Por isso, em oposição a Israel Pinheiro, lutou pela transformação da Cidade Livre em Núcleo Bandeirante. Queria a instalação definitiva do que era para ser apenas acampamento, coisa provisória, com terrenos em comodato e construções em madeira. Afinal de contas, Sayão se identificava como um dos trabalhadores e pretendia permanecer”.
Heloisa Starling e Lilia Schwarcz, autoras do livro “Brasil: Uma Biografia” (Companhia das Letras, 808 páginas), ressaltam que a ação de Bernardo Sayão “interligou por estrada de rodagem os Estados de Goiás, Maranhão e Pará, inseriu a Amazônia no mercado brasileiro e forneceu uma nova alternativa para atenuar desequilíbrios regionais”.
Paulo Dantas e Bernardo Élis escreveram sobre Bernardo Sayão, o “herói estradeiro”, no dizer no primeiro. O segundo escreveu: “Os heróis de Goiás e Mato Grosso são heróis anuladores do espaço-tempo, são abridores de estradas, de vias de comunicação e transporte, a começar pelos Bandeirantes”.
No romance “O Fantasma de Luis Buñuel”, de Maria José Silveira (filha do médico e político José Peixoto da Silveira), o narrador diz: “Sayão fazia o que fosse preciso: zombava da burocracia, desobedecia orçamentos, desrespeitava ordens. (…) O que importava era a estrada a ser feita. Sem ele, Brasília não teria sido construída no tempo recorde que foi. E o herói da estrada morreu na estrada, construindo a Belém-Brasília, abatido por uma árvore, um dos lados do crânio destroçado, o rosco desfigurado”.
No livro “Flor do Cerrado: Brasília”, a escritora Ana Miranda frisa que Bernardo Sayão é “o grande herói de Brasília”. Pedro Tierra, Jô Oliveira e Dinah Silveira de Queiroz também escreveram sobre o engenheiro.

Quando deputado federal, o goiano Daniel Vilela, hoje vice-governador de Goiás, apresentou um projeto de lei para inscrever ‘o nome de Bernardo Sayão Carvalho Araujo, o Bandeirante do Século XX”, no Livro dos Heróis da Pátria. Apesar do esforço do jovem político, que nasceu em Jataí, a iniciativa deu em nada.
A grande rodovia mantém dois nomes: Belém-Brasília e BR-153. É uma injustiça que não seja conhecida como Rodovia Bernardo Sayão.
Primo da cantora lírica Bidu Sayão, que brilhou nos Estados Unidos, Bernardo Sayão arranhava alguma coisa no violão, adorava cinema e era preocupado com a educação do povo pobre. “Junto com a estrada, a gente tem de deixar alguma coisa para o povo começar a vida. Primeiro, a instrução. Eu acho que posso dar tudo para o povo, mas, se não deixei uma escola, não deixei nada”, disse o engenheiro. E apreciava criar galinhas e brincar com os seis filhos — Laís Sayão (casada com o diplomata Hugo Gouthier), Léa, Fernando, Bernardo, Lia (mãe de Sérgio de Sá) e Lillian.