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Nilson Gomes

Especial para o Jornal Opção

Dois ótimos minimandatos de dois anos cumpridos por vices que assumiram após impeachment dos titulares estão na ordem do dia, para usar o linguajar dos quartéis, de onde os integrantes das Forças Armadas não deveriam sair para assumir funções políticas e diante dos quais golpistas pagam mico com a camisa Canarinho, manto de craques imortais, hoje ostentada por quem nos mata de vergonha. Ao fim da análise se conclui o que este jornal já noticiou em título de Editorial: o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal, é o homem do ano de 2022. Sua indicação foi obra de um mandato-tampão. A vida na Terra agradece.

À boa dupla:

Itamar Franco — Os melhores dois anos do Brasil desde JK foram os do mandato de Itamar Franco. Que começaram com inconstitucionalidade de sessão do Senado comandada pelo presidente do STF.

Itamar Franco: fez um grande governo em dois anos | Foto: Reprodução

Continuava errado o que começou errado. O Brasil escorregou ao eleger Fernando Collor de Mello, chamado assim, com o nome completo, pelos mais fanáticos, como os futuros sem-teta chamam Jair Messias Bolsonaro. Collor foi cassado ilegalmente, pois renunciou antes da votação que amputaria seu período no Palácio do Planalto.

Da árvore envenenada nasceu um fruto aproveitável, o governo de seu vice, Itamar Franco. Com o Plano Real, Itamar dizimou a inflação e começou a estabilidade econômica felizmente ainda em cena, mesmo apedrejada no palco por malfeitores que lucram com o caos. Itamar nomeou os dois melhores ministros do Pós-Guerra, Fernando Henrique Cardoso e Ciro Gomes, que cuidaram do Real.

Michel Temer: ex-presidente da República l Foto: Reprodução

Michel Temer — Igual a Collor, Dilma Rousseff foi derrubada por se recusar a adquirir o Centrão, o grupo de congressistas do baixo clero construtor de duas obras para Bolsonaro:

1) livrou-o do impeachment certo, capaz de sair de qualquer um dos centitantos pedidos sobre os quais os parlamentares repousam no sono dos injustos;

2) recolocou-o na disputa quando a reeleição já havia estacionado no brejo ao aprovar num relâmpago o Auxílio Brasil de R$ 600, mesmo reservando apenas o trovão de R$ 400 para 2023.

Em lugar de Dilma Rousseff assumiu Michel Temer, de quem não se esperava mais que o óbvio:

a — concluir milhares de obras iniciadas nos 14 anos de PT;

b — manter em dia os salários e os repasses para Estados (FPE) e municípios (FPM);

c — equilibrar o Real, conservando a estabilidade com a qual o País estava acostumado;

d — escapar das cascas de banana espalhadas no Plenário da Câmara dos Deputados e não cair.

Temer se desincumbiu do quarteto. Porém, assim como Itamar e Ciro são as grandes vitrines de Itamar, a maior conquista do povo brasileiro com Temer foi indicar ao Senado a nomeação de Alexandre de Moraes para o STF.

Os bolsonaristas gritam em redes sociais e portas de quartéis o temor de o Brasil virar uma Venezuela. Ou seja, um país em forma de escombros capitaneado por tirano. Ocorre o oposto do que apregoam os fanáticos bolsonaristas: graças ao STF e ao TSE o Brasil não se tornou escombros em forma de país gerido por um tirano.

Nas duas cortes há diversos heróis, com destaque para o desassombro de um componente de ambas, ele mesmo, Alexandre de Moraes.

Quem o conhecia apenas como autor de livros de Direito Constitucional reconhece que, na prática, o doutrinador é muito melhor que nos impecáveis textos jurídicos.

Bolsonaristas & quejandos (ao dicionário, diria Millôr Fernandes) reclamam de um tal ativismo judicial dos ministros de STF e TSE. Só se o contrário fosse o passivismo, a omissão.

Ladram: não poderia ter prendido um brucutu com mandato no Congresso que gravava vídeos esculhambando negros e membros do STF. O valentão, que se gabava de ter matado 12 pessoas e depois se viu que nem para assassino servia, tentou ser senador pelo Rio de Janeiro com a única bandeira de ter sido encarcerado por Moraes.

Caso o racista com mandato não tivesse sido contido por Moraes, quantos outros parlamentares estariam por aí xingando minorias impunemente?

Militantes do Direito que desejem discutir a legalidade dos atos do ministro poderiam começar a conversa enumerando os estudos de Constitucional publicados nos últimos anos.

Em WhatsApp, Telegram, Insta, Face e TikTok, todo mundo é constitucionalista, eleitoralista, criminalista, cientista social, veterinário que cura bicheira em pata de fanático machucada pela ferradura.

Difícil, então, rebater Moraes no conhecimento. Resta falar sozinho ou na linguagem das fake news, essa praga combatida por Moraes em inquéritos que são verdadeiras capelas sistinas.

Líderes de campanhas difamatórias contra TSE e STF no geral e seu comandante-em-chefe em particular tiveram a resposta nas urnas.

Bolsonaro conheceu o Silas. E não foi Malafaia, foi o se lascou.

O matador fake de 12 foi trucidado para senador no Rio de Janeiro.

Roberto Jefferson, o condenado no Mensalão que responde por homicídio tentado contra quatro policiais federais, lançou a presidente um padre-laranja que no Brasil inteiro obteve 0,07% dos votos válidos.

A enxurrada de delitos contra a honra de Moraes deve ter feito transbordar o mar de lama do bolsonarismo.

São monstruosidades tão absurdas que descrevem quem as posta.

Os componentes da horda estão desprovidos da capacidade de raciocinar. Autômatos, agem segundo as ordens e o progresso do Gabinete do Ódio numa escalada de maldades cujo apogeu se dará no Escritório do Crime.

Moraes não está condenando um grupo político, mas uma milícia carioca espalhada pelo País.

O nome disso é coragem pessoal encarnada em defesa da cidadania, da democracia, da civilização.

Ao frear as atrocidades de Bolsonaro & Cia., Moraes cumpriu seu papel de guardar a Constituição e, em consequência, ajudou a salvar o planeta. Claro, não somente porque sem essa bandalha no poder até o ar fica mais limpo.

Moraes higienizou a galáxia.

Celebrizou o perdão que livrou Daniel Silveira de seus 105 meses de xilindró. Aí, sim, Bolsonaro mostrou à população que o crime compensa. Todavia, indulto prejudicial pra valer mesmo têm sido os 45 meses de boiada passando sobre a Amazônia:

1) hediondas vistas grossas ao pisoteio na floresta por madeireiros e produtores rurais inescrupulosos;

2) destruição dos mananciais por garimpeiros e traficantes internacionais de drogas;

3) execução de defensores do meio ambiente e dos povos originários (novo nome dos índios, ops!, indígenas).

Águas, fauna e flora sob ataque de predadores colocam em risco a sobrevivência da raça humana e do planeta. Bichos e árvores têm uma “pandemia” por ano.

Alexandre de Moraes ganhou dimensões globais e nos livrou desse mal. Sim, da extinção. Também não é exagero afirmar que quem conserva a Amazônia salva a Humanidade.

Óbvio, a gestão de Bolsonaro não é inteiramente barbárie. Tomou agradáveis iniciativas, como acabar com o horário de verão e ficar dois anos sem lotear a administração. O problema é o lado oculto da lua. O mesmo homem risonho, de hábitos simples, contador de anedotas politicamente incorretas, que desfila com os mantos sagrados dos nossos times, é o ser abjeto que venera personificações do demônio como Pinochet e Ustra.

O Brasil é grande e maravilhoso demais para ser presidido por um áulico do horror.

Valdemar Costa Neto, o Roberto Jefferson do PL, prometeu a Bolsonaro cargo decorativo no partido. Taí um posto à sua altura. Terá sala, salário e advogado pagos pelo imundo Fundão Partidário. Vai precisar.

A lista de acerto de contas é imensa.

Mortos e sequelados pela Covid são milhões.

Os nove crimes apontados pela CPI da pandemia.

A meia dúzia de inquéritos que tramitam no STF e vão descer para a primeira instância.

As barbáries cometidas antes, durante e após a derrota, incursão completa por infrações previstas nos Códigos Eleitoral e Penal, além de leis especiais.

O Supremo, inclusive para exemplo a juízes e desembargadores, precisa parar de prender, a menos que seja em flagrante ou após o trânsito em julgado. Será uma glória domesticar o ímpeto dos magistrados para prisão cautelar. Por isso, deve-se torcer contra o encarceramento de Bolsonaro não por sua bravata de dizer que jamais seria preso: é pela inutilidade da preventiva impotente porque previne de exatamente nada.

O réu pode cumprir medidas diversas. Sugestão: estudar as de fato excelentes obras de Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. Só com os manuais vai remir uns dois dos trocentos anos que terá pela frente.