Em uma entrevista para a página Universa, do portal UOL, Gal Costa começou a ser interpelada pela repórter:

—  Você é super-reservada com relação a sua afetividade e a sua sexualidade…

A cantora, que estava com o rosto carrancudo desde antes, interrompe imediatamente:

— Sou. Ponto final.

A entrevistadora, entre desconcertada e insistente:

— Posso terminar a pergunta?

— Não.

O ano era 2018. Gal estava já com 73 anos e parecia, no momento, da entrevista uma pessoa muito amargurada. Menos pela aparência física do que pela aura, nem de longe lembrava a artista de brilho próprio que se destacou durante décadas no primeiro time da música brasileira.

Nos anos 80, ela ganhou de muitos o título de voz mais bonita do Brasil e, de outros – alguns entre os primeiros, – também o de as pernas mais bonitas da MPB. Ambas com merecimento. Mas o que irradiava, de fato, era sua luz. Na época, ela estava no auge e era feliz em sua união com Lúcia Veríssimo. Não parecia haver, ao contrário da ríspida negativa no diálogo acima, nenhuma disposição de esconder um amor que fosse considerado “não convencional” aos padrões normativos.

Agora, menos de um ano depois de sua morte inesperada, em novembro, a revista Piauí entrega ao conhecimento público, com a história de um relacionamento longo, mas muito mais abusivo do que amoroso, o que pode ser o motivo da aura triste dos últimos tempos da cantora.

Em 26 páginas, o jornalista Thallys Braga construiu a reportagem “A viúva de Gal Costa: as astúcias da misteriosa Wilma Petrillo – e o impacto na carreira da cantora”. Ele entrevistou 13 pessoas do círculo da intérprete: um parente, seis amigos e seis ex-funcionários. Sobre esse material, ele traçou o perfil da companheira das últimas três décadas de vida de Gal e o resultado expõe, de forma indireta, o relacionamento abusivo de que ela foi vítima.

O relato, na verdade, volta no tempo para reconstituir quem era Wilma Petrillo muito antes de sua união com a cantora. E desde muito o relato não é bom.

Os testemunhos expostos da matéria mostram que Gal foi consumida em vida atrelada a uma personagem de caráter, no mínimo, doentio. Ou, como um dos entrevistados chegou a adjetivar, uma pessoa “psicótica”.

Uma reportagem que vale a pena ser lida na íntegra para mostrar que relacionamento abusivo é coisa que pode se instalar em qualquer ambiente, não importa se em um barracão da periferia ou numa cobertura de frente para o mar.

Depois da leitura, a impressão que fica é que, na vida de Gal, Wilma foi uma Lúcia Veríssimo reversa: o que uma ajudou a cantora a construir, a outra se esmerou em dilapidar. Uma canção sombria de letra triste.