É mais saudável, para a democracia, escancarar o apoio do que fingir que não apoia o pré-candidato do PT

“A ABI é uma entidade apartidária, mas dessa vez não vai ficar imparcial. Estaremos ao lado do povo brasileiro e do ex-presidente Lula para derrotar o governo fascista de Bolsonaro”, afirma o novo presidente da venerável Associação Brasileira de Imprensa, Octávio Costa.

Dois jornalistas enviaram mensagens sugerindo que, na coluna Imprensa, eu condenasse a manifestação de Octávio Costa.

Não há o que condenar. Na coluna Imprensa, sempre me insurgi contra o mito da imparcialidade, mas sugerindo que, ao reportar os fatos, o jornalista deve buscar ser o mais objetivo possível. Ademais, os profissionais de comunicação, como qualquer cidadão, têm o direito de expor suas ideias e expressar suas opiniões políticas.

Nos Estados Unidos, para citar um exemplo, os jornais manifestam suas preferências político-eleitorais. Na eleição passada, o “New York Times” e o “Washington Post” apoiaram a candidatura de Joe Biden, do Partido Democrata, contra a de Donald Trump, do Partido Republicano. Foi uma aposta na civilização, representada por Biden, contra a barbárie, representada por Trump.

Não há escândalo algum em se tomar posição em relação a um candidato. Ruim mesmo é quando se apoia um postulante, mas se finge de imparcial. A revista “Carta Capital”, dirigida por Mino Carta, sempre anunciou apoio, em editorial, aos candidatos do PT a presidente, como Lula da Silva, Dilma Rousseff e Fernando Haddad. A publicação está correta ao não esconder suas preferências políticas.

Octávio Costa, presidente da Associação Brasileira de Imprensa | Foto: Octacilio Barbosa/ABI

Durante anos, parte da imprensa apoiava o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, abertamente, mas sem dizer que apoiava, sugerindo uma “neutralidade” que nunca existiu.

Então, a ABI, sob Octávio Costa, não erra em admitir que vai apoiar a candidatura de Lula da Silva para presidente. Ele está explicitando sua adesão e da entidade que dirige ao projeto do PT. É mais saudável do que aderir e fingir que não aderiu.

Octávio Costa estaria errado, porém, se tentasse “obrigar” possíveis jornalistas bolsonaristas, filiados à ABI, a apoiarem Lula da Silva. O presidente da instituição certamente não fará isto. O dirigente da entidade também não pediu que os jornalistas fechem os olhos para possíveis equívocos políticos do petista.

No comentário de Octávio Costa há uma impropriedade política e histórica. O presidente Jair Bolsonaro pode até ser autoritário — de fato, é (seu enfrentamento com o Supremo Tribunal Federal, tentando enquadrá-lo, resulta de uma mente autoritária) —, mas não é fascista. Para combatê-lo, sugerindo que é pior do que é, “vale” o rótulo de fascista.

Entretanto, se Bolsonaro fosse de fato fascista, o presidente da ABI não teria como criticá-lo. Iria para a cadeia, como o filósofo Antonio Gramsci (morreu aos 46 anos), e poderia até ser assassinado.

Mas não há dúvida de que Bolsonaro é autoritário e não aprecia o contencioso democrático. E é por isso que Octávio Costa, como presidente da ABI, decidiu apoiar Lula da Silva. Resta saber se, no poder, o petista-chefe vai se comportar como democrata. Acredito que, assim como as instituições — Judiciário, Legislativo (bem ou mal, tem funcionado) e Imprensa — estão funcionando no sentido de “segurar” o autoritarismo de Bolsonaro, certamente funcionarão se um governo do PT arvorar a se comportar de maneira semelhante, à esquerda.

Se eleito, Lula da Silva terminará o governo com 81 anos. Político inteligente, dotado de imensa astúcia, o petista provavelmente não vai querer ficar na história como um presidente vingativo e autoritário. Na verdade, é mais moderado, ao menos nos seus dois governos, do que sugere sua fala.

Lula da Silva, se eleito, sabe que enfrentará um ambiente político hostil, com possíveis ataques públicos do bolsonarismo. As Forças Armadas, em parte bolsonarizadas, certamente estarão de olho nas decisões do governo. Portanto, a tendência é que o petista faça um governo moderado e tolerante.