18 historinhas sobre Hélio Rocha, que poderia ter se tornado o Pedro Nava do Cerrado
05 março 2024 às 18h40
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1
Hélio Rocha era jornalista, escritor e pesquisador. Acima de tudo, jornalista. Mas parecia poeta, um poeta, digamos, da Rive Gauche.
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Hélio Rocha era uma enciclopédia, uma espécie de pré-Google. Parecia se lembrar de tudo e de todos. Jornalistas, quando queriam saber o que não aparecia no portal de buscas, ligava para o Homem -Memória, que apresentava informações precisas sobre assuntos variados. Não só. Ele adicionava histórias deliciosas, que, por si sós, rendiam reportagens extras.
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Hélio Rocha, ao visitar a redação do Jornal Opção, quando funcionava na República do Líbano, nas proximidades da Praça Tamandaré, ouviu do repórter Léo Alves: “Hélio, quem você não conhece?” Sorrindo, ele perguntou: “Na política?” Léo disse: “E na sociedade”. Hélio pensou alguns segundos e respondeu: “Acho que conheço quase todo mundo — os mortos e os vivos”. Sabia até quem, por baixos dos panos, namorou quem…
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Hélio Rocha era humanista. Daqueles que, avessos às ideologias, queria o melhor para todos. No fundo, queria que todos fossem mesmo cidadãos. Os ideólogos eram vistos como “chatos de galocha” (com seu bom humor habitual, à inglesa, o jornalista riria do palavreado antiquado) e incapazes de entender as delícias de um comentário irônico.
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Hélio Rocha era um homem doce, de voz pausada e calma. Não se irritava, mesmo quando o interlocutor planejava retirá-lo do sério. Era agradabilíssimo. O que não quer dizer que fosse sempre politicamente correto.
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Hélio Rocha não era bonitão, no estilo Marlon Brando e Paul Newman. Mas era um homem charmoso e, às vezes, encantava as mulheres. Era mais do estilo de Al Pacino e Serge Gainsbourg. Apreciava um bom uísque e até um joguinho.
7
Hélio Rocha era dotado de uma inteligência fina, delicada e mundana. Sabia boas e más histórias a respeito de políticos, jornalistas, empresários, advogados, escritores etc. Contava-as com graça infinita. Fomos vizinhos durante anos, então pude ouvir várias histórias. Quando levadas para o jornal, porque bem-contadas e bem-escritas, era uma delícia. Pessoalmente, as histórias eram mais bem apimentadas. Portanto, ainda mais deliciosas.
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Hélio Rocha era culto. Ele estava sempre com um bom livro nas mãos — de história, de literatura, de filosofia ou biografias. Numa visita em sua casa, ao lado de Herbert Moraes Júnior e Candice Marques de Lima, percebemos que estava lendo uma biografia de Abraham Lincoln. Ou talvez fosse de Franklin Delano Roosevelt. Ele tinha apreço por ambos.
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Hélio Rocha era bem-informado sobre os bastidores da política local e nacional. Chegou a trabalhar como correspondente da revista “Veja” e de “O Globo”.
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Hélio Rocha era um cidadão do mundo e suas histórias globais deveriam ter sido registradas (tal como fez, recentemente, o jornalista Marcio Fernandes). Ele conheceu dezenas de países e procurou entender os povos de maneira ampla, inclusive observando e relativizando suas idiossincrasias. Ele tinha um quê de europeu — quiçá francês — das décadas perdidas e sempre recuperadas pela memória (de Gertrude Stein, Hemingway e outros). Viajar, para Hélio Rocha, era um prazer e um santo remédio.
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Hélio Rocha foi repórter, colunista e editor de “O Popular”, durante anos. Era a sua casa. Sua segunda casa. Por algum tempo, convidado pelo empresário e jornalista Batista Custódio, trabalhou no “Diário da Manhã”. Depois, voltou ao “Pop”, sobretudo porque era amigo de Jaime Câmara, o pai de Júnior Câmara.
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Hélio Rocha escrevia a coluna “Memorando” para o Jornal Opção. Percebemos, de cara, que era muito lido (uma nota sobre a morte de um filho do governador Pedro Ludovico, num acidente aéreo, rendeu mais de 500 mil acessos únicos). Qual era o seu segredo? Notas curtas, com histórias bem contadas e, por vezes, apimentadas.
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Hélio Rocha envelheceu, com todos os problemas que a velhice acarreta, como perda da memória, mas permaneceu vivaz, cheio de vida, sempre relatando histórias deliciosas.
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Hélio Rocha era biógrafo. Não era um scholar da universidade. Escrevia com o máximo de clareza, como um cronista e com a sapiência de um Edward Gibbon. Ele escreveu sobre Pedro Ludovico e Juscelino Kubitschek. Escreveu também sobre Goiânia e Anápolis. Chegou a “biografar” o time do Goiás, o de Luvanor e Hailé Pinheiro.
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Hélio Rocha é autor de um livro que o jornalista de política precisa manter sempre ao lado: “Inquilinos da Casa Verde”. É a história dos governadores de Goiás. É uma fonte de consulta valiosa e obrigatória. Estou sempre examinando-o.
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Hélio Rocha era filho do poeta e músico Benedito Rocha. Por sinal, o pai era bom poeta e precisa ser lido com mais atenção pela crítica. A leveza do texto de Hélio Rocha, com seu fraseado poético mas não pomposo, advém, quem sabe, da poética do bardo.
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Hélio Rocha pertence a uma estirpe de jornalistas, como Reinaldo Rocha (responsável, em larga medida, pelo sucesso de “O Popular”), Ana Cláudia Rocha (minha colega no curso de Jornalismo da UFG. Ótima jornalista e, nos últimos tempos, tem se revelado uma escritora de primeira linha) e Eduardo Rocha. Todos irmãos. O jornalista Bruno Rocha, seu filho, herdou a delicadeza no trato pessoal.
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Hélio Rocha morreu na terça-feira, 5 de março de 2024. Nascido em Corumbá de Goiás, sua Ítaca, ele tinha 83 anos. A morte de sua mulher, Jane, deixou-o triste. Mas, enquanto a saúde permitiu, contou histórias. Ele era assim: um contador de histórias. Não fosse certas travas — receio de atritar-se com os poderosos da província —, poderia ter se tornado, digamos assim, o nosso Pedro Nava. Porque, como o memorialista mineiro — um francês nos trópicos, espécie de Proust de Juiz de Fora —, sabia muito dos bastidores da vida pública e da vida privada dos goianos mais relevantes. É uma pena que o Homero do Cerrado não tenha registrado suas memórias.