Escuto a frase título do artigo desde muito jovem, quando meu tio explicava diferenças na abordagem e nas investigações de crimes. Volta e meia essa constatação (poética e óbvia) vem à mente ao noticiar casos de abusos econômicos, fraudes e corrupção das máfias política e econômica do País.

Na manhã de hoje, 20, operação da Polícia Civil em Goiânia contando com a participação de 160 agentes e mais de três delegacias envolvidas conseguiu reunir provas para subsidiar investigação em licitações da Capital. De acordo com informações iniciais, a polícia estima que a fraude tenha causado prejuízo aos cofres públicos de, no mínimo, R$ 50 milhões em dois anos.

No meio do caminho, os policiais conseguiram apreender quase meio milhão de reais em dinheiro vivo na casa de um dos investigados e, em outra, dinheiro e dez armas. A procedência desses valores serão investigados.

Essa não é a primeira vez que investigações dão conta de possíveis casos de corrupção no Brasil: dinheiro na cueca, na parede, na casa, na mala… No caso da operação de hoje, é sintomático da prodridão do sistema a afirmação do prefeito Rogério Cruz de que as empresas investigadas pela polícia prestavam serviços para a prefeitura há quase vinte anos.

A indicação do tempo de serviço serve como justificativa e como escudo. Ao mesmo tempo, a prefeitura agiu rápido ao afastar os envolvidos na Comurg. A resposta rápida ainda serve ainda outra solução: desde que assumiu a prefeitura, o Executivo busca demonstrar a ineficiência da Comurg e se mostra a favor de sua privatização.

O lema “pobre rouba, rico tem esquema” pode ser ainda complementado com o discurso panfletário da década de 1980: “ladrão que ajuda ladrão ainda recebe concessão de rádio e televisão” ou, mais fácil, “recebe ajuda na licitação ou em privatização”.

Hoje, práticas clientelistas são encontradas em uma nova esfera de poder: as licitações, que fundamentam relações entre Estado e empresas. Licitações são utilizadas, na maioria dos casos de corrupção, para mascarar as relações pessoais — é o Estado personificado com os nomes dos detentores do poder, já ensinava Raimundo Faoro.

Ainda que as máfias política e econômica caminhem juntas, definitivamente a política parece ser pior. É ela que manda prender, soltar, destroi reputações, retira do poder ou reelege. A política no Brasil, historicamente e ainda hoje, nos tem demonstrado isso por meio de inúmeros casos de corrupção e até mortes nunca ou mal esclarecidas, com raras exceções.

Essa é a verdadeira máfia que, há séculos – em nome da preservação de um status quo – atua no Brasil. Para não ficar apenas nos exemplos cotidianos, dados dos órgãos de controle indicam que numa parcela significativa dos estados e municípios ainda prevalece o modelo patrimonialista, onde os interesses políticos, de grupos ou pessoais, continuam causando elevados prejuízos aos cofres públicos, que refletem na baixa qualidade dos serviços públicos ofertados à população.

Machado de Assis, em uma de suas críticas contundentes à sociedade brasileira da época, descreve no conto “Teoria do Medalhão” um diálogo entre pai e filho que acontece após o jantar em celebração aos 21 anos do jovem. Um dos conselhos que o pai transmite ao filho é que “o nome está sempre ligado à pessoa”, sugerindo que ele deveria se tornar um medalhão para alcançar fama, prestígio e poder.

O renomado autor não fez mais do que pintar um retrato da sociedade patrimonialista do século XIX, a qual ainda persiste nos dias de hoje, refletindo a cultura enraizada no Brasil, baseada na tradicional dominação pelo nome e pelo poder político.