A criminalidade, seja qual for, deve ser punida em suas diferentes escalas sob pena de adoecer a sociedade pela sensação de impunidade. Nesta semana, coletivos de mulheres e Ministério Público foram surpreendidos com a concessão da liberdade provisória ao prefeito de Iporá, Naçoitan Leite, bem como o retorno dele às suas atividades.

É importante rememorar 2021 e o lançamento do programa Todos por Elas, quando o governador Ronaldo Caiado defendeu que os agressores de mulheres devessem ser impedidos de manter ou tomar posse em cargos públicos. Evidentemente que o governo não pode ir contra a justiça que soltou Naçoitan – prefeito eleito pela população – mas isso não deixa de parecer algo completamente errado.

À época do lançamento do programa, Caiado foi enfático em sua posição: “O cidadão que pratica qualquer grau de violência não pode ser servidor público. A exclusão desse cidadão da função supera qualquer norma constitucional de estabilidade”. Ele ainda explicou dizendo que “até pouco tempo existia um silêncio conivente, em que as leis eram aplicadas, dependendo da condição de quem praticava a violência”. Mas, a cidade de Iporá, distante 226 km de Goiânia, parece estar padecendo desse silêncio conivente já que a justiça decidiu manter o prefeito Naçoitan Leite no cargo mesmo após ele ser acusado de atentar contra a vida da ex-mulher.

Em novembro, Leite teria invadido a casa da ex-mulher com uma camionete e atirado cerca de 15 vezes contra a porta do quarto da ex – onde estava ela e o atual namorado. Ele ficou foragido por quatro dias e se entregou no dia 23 do mesmo mês. Na última sexta-feira, 16, o juiz Wander Soares Fonseca, do Tribunal de Justiça de Goiás, revogou a prisão preventiva de Leite que desde segunda-feira,19, se reúne e despacha com secretariado. Com bastante condições financeiras, o sujeito parece estar blindado de responder por suas ações. Além da atual acusação contra a ex, o político já coleciona outras denúncias criminais na esfera política.

Em abril do ano passado, Naçoitan foi denunciado pelo Ministério Público de Goiás pela prática de incitação ao crime depois de propor, por WhatsApp, atentados conta militantes e simpatizantes do PT. Em 2022, após as eleições, ele publicou um vídeo dizendo que era necessário “eliminar Alexandre de Moraes e Lula”, o que resultou na sua suspensão pelo União Brasil.

A denúncia do MP se refere às mensagens enviadas por Naçoitan em março de 2022 nos grupos do Sindicato Rural de Iporá, do qual ele é um dos líderes. Por áudio, ele reclamou que o grupo havia aceitado a contribuição de um petista para ajuda na obra da fachada do sindicato. O prefeito xingou o doador e, segundo o MP, incitou a prática de crimes contra simpatizantes ou filiados do PT. Na mensagem, ele afirmou “PT com nós (sic) aqui agora é na botina, e se for preciso na bala, entendeu?”.

Outra polêmica aconteceu em 2021, quando o vereador de Iporá, Moisés Victor Magalhães, denunciou que teria sido agredido pelo prefeito ao filmá-lo num churrasco. Nas redes sociais, o parlamentar divulgou fotos de ferimentos nos braços, nas costas e na cabeça. O caso foi parar na polícia. Na época, o prefeito alegou que o vereador foi indagado sobre o motivo da filmagem pelos presentes e, como reação, teria atirado uma pedra no grupo. Naçoitan negou qualquer agressão e disse que se escondeu para fugir da confusão.

É a certeza da impunidade que incentiva criminosos a praticar as mais terríveis crueldades em plena luz do dia, sem que os mesmos expressem nenhum tipo de receio quanto às penalidades que possam vir a ter que cumprir perante a nossa sociedade. Espera-se que o Ministério Público (MP) consiga atuar com eficiência.

Da Comarca de Iporá, o promotor Luís Gustavo Soares Alves, reagiu à liberdade provisória que foi concedida para o prefeito Naçoitan Leite, solicitando para a Justiça, na Comarca de Iporá, que seja restabelecida a prisão preventiva decretada em seu desfavor, nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal. Subsidiariamente, caso mantida a revogação da prisão preventiva, requereu que seja aplicada ao réu a medida cautelar prevista no artigo 312, VI, do CP (suspensão da função pública, no caso, o exercício do cargo de prefeito).

Atuação do MP

No pedido, o MP menciona o comportamento do acusado, afirmando que ele é uma pessoa perigosa e que deve aguardar o julgamento sob custódia. O MP lembra ao juiz os eventos que ocorreram no momento em que a denúncia foi apresentada, afirmando que solicitou a abertura de um inquérito policial para investigar a prática dos crimes previstos nos artigos 306 do CTB e 312 do Código Penal. Isso porque o acusado dirigiu embriagado no dia 18 de novembro de 2023 e ainda utilizou a camionete da Secretaria Municipal de Assistência Social para benefício próprio.

Além disso, é lembrado que o acusado, utilizando um veículo automotor, invadiu a garagem da vítima Hayzza e disparou várias vezes com uma arma de fogo contra Hayzza e Guilherme. O crime de homicídio não foi consumado devido a circunstâncias alheias à vontade do acusado, demonstrando sua notória periculosidade.

Para justificar a volta à prisão e a periculosidade do acusado, é acrescentado que ele injuriou e tentou agredir a vereadora e Presidente da Comissão Processante da cidade, Heb Keller Fernandes de Oliveira, em 27 de novembro de 2023, após ela entregar um mandado de citação ao acusado referente ao processo de impeachment em andamento.

A Promotoria também lembra que após as tentativas de feminicídio e homicídio, o acusado retornou ao local dos fatos para subtrair um objeto que sabia ser prova de sua conduta ilícita, na tentativa de eliminar evidências. Isso resultou na imputação do crime de fraude processual contra ele.

No recurso em sentido estrito, é afirmado que, ao se apresentar à autoridade policial, o acusado foi interrogado e não colaborou com as investigações, ao contrário do que foi afirmado por sua defesa em diversos meios de comunicação. Ele não revelou a localização do objeto subtraído da residência da vítima nem forneceu informações sobre o veículo utilizado na fuga ou onde se abrigou durante esse período.

Entre diversas alegações para pedir a volta do acusado à prisão, é informado ao Juízo que uma auditoria realizada pela gestão em exercício enquanto ele estava preso concluiu preliminarmente que houve desvio de finalidades na aplicação de verbas públicas.

Também é mencionado que, ao reassumir como prefeito de Iporá, no primeiro dia útil após voltar ao cargo, ele promoveu a exclusão/arquivamento dos atos institucionais de propaganda contendo imagens/vídeos de Maysa Peres Cunha Peixoto na página oficial da Prefeitura de Iporá no Instagram, indicando prática com desvio de finalidade.