No último domingo, 25, manifestantes se reuniram em nome de Deus, da família e da liberdade em São Paulo. Carregando bandeiras do Brasil e de Israel, apoiadores do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL) lotaram a Avenida Paulista. Apesar da Polícia Militar de São Paulo ter estimado a presença de 750 mil pessoas, a Universidade de São Paulo (USP) calculou a presença de 185 mil manifestantes.

O ato reuniu figuras políticas e governadores de Estado, como Ronaldo Caiado (Goiás), Tarcísio de Freitas (São Paulo), Romeu Zema (Minas Gerais) e Jorginho Mello (Santa Catarina). No vídeo convocando os manifestantes, acuado, o ex-presidente baixou o tom e pediu que todos comparecessem “trajando verde e amarelo” e mais que isso, que não levassem “qualquer faixa e cartaz contra quem quer que seja”. O pastor Silas Malafaia foi o financiador do evento, que contou com 2 trios elétricos.

Bolsonaro busca um afago após ser alvo da Operação Tempus Veritatis (Hora da verdade), deflagrada pela Polícia Federal (PF) no dia 8 de fevereiro. A intenção dele é utilizar a manifestação como cortina de fumaça para se defender das acusações de que teria participado da tentativa de golpe de Estado, no fim de 2022, após ser derrotado nas eleições presidenciais. A divulgação da reunião entre Bolsonaro e sua equipe ministerial, no dia 5 de julho, elucidou os planos do ex-presidente, por meio de seu linguajar chulo, em dar um golpe na democracia.

“Como é que eu ganho uma eleição, um fodido como eu? Deputado do baixo clero, escrotizado dentro da Câmara, sacaneado, gozado, uma porra de um deputado”, esbravejou Bolsonaro na reunião. O presidente, ministros, assessores e chefes das Forças Armadas se mobilizaram para evitar a qualquer custo a eleição de Lula (que já era prevista) e, posteriormente, a posse do novo governo. O 8 de janeiro simboliza a tentativa fracassada de um golpe que se iniciou em 2016.  

Durante a operação da PF, foi encontrado um documento na residência do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, que propunha a instalação do Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O documento ficou conhecido como “minuta do golpe”. Segundo as investigações, o golpe de estado só não ocorreu porque o Bolsonaro não teve o apoio das Forças Armadas.

O dia 25 de fevereiro representa a tentativa de anistiar todos que participaram do golpe ao Estado Democrático de Direito. É tolerável, em uma democracia, que um ex-presidente use sua força política para atacar uma investigação sobre um golpe de Estado?

Na obra “Como as democracias morrem”, os autores mostram como a democracia pode e é frequentemente subvertida por dentro, pelas mãos de líderes e atores de tendência autoritária que, navegando por meio de suas mesmas instituições e poderes, terminam por transformá-la em um regime distinto e autocrático, sem necessariamente precisar utilizar das forças armadas ou de um golpe de Estado clássico. Para Daniel Ziblatt e Steven Levitsky, a morte da democracia ocorre por meio de medidas anunciadas com nobres intenções, tais como combate à corrupção ou segurança nacional, e coberta de vernizes democráticos, frequentemente avalizadas por instituições como parlamentos ou cortes de justiça.

Golpes no decorrer da história

O Brasil passou por diversos golpes e tentativas de golpe ao longo de sua história. Alguns dos mais significativos incluem:

  • Golpe da Maioridade (1840): ocorreu quando o imperador Dom Pedro II foi declarado maior de idade aos 14 anos, encerrando o período de regência e consolidando seu poder.
  • Proclamação da República (1889): Liderado por militares e políticos republicanos, resultou na deposição do imperador Dom Pedro II e na instauração do regime republicano no Brasil.
  • Golpe de 1930: Conduziu Getúlio Vargas ao poder, marcando o fim da República Velha e o início da Era Vargas.
  • Golpe de 1937 (Estado Novo): Getúlio Vargas dissolveu o Congresso Nacional, instituiu um regime ditatorial conhecido como Estado Novo, inspirado no modelo fascista europeu.
  • Golpe Militar de 1964: Liderado por militares, depôs o presidente democraticamente eleito João Goulart e instaurou um regime militar que durou até 1985.

Choques elétricos, afogamentos e muita violência deixaram marcas eternas nas vítimas do Regime Militar, que perdurou no país até 1985. Além desses golpes mais conhecidos, houve outras tentativas e conspirações ao longo da história do Brasil.

“Déficit cognitivo” dos manifestantes

De acordo com a pesquisa realizada pela USP entre os participantes da manifestação pró-Bolsonaro, 94% dos manifestantes acreditam que o Brasil vive uma “ditadura”. Para mais de 40% dos manifestantes, por exemplo, Bolsonaro deveria ter decretado uma espécie de golpe, seja decretando uma GLO (garantia da lei e da ordem) ou invocando o artigo 142.

Durante o questionário, a maioria esmagadora dos participantes, 92%, se identificou como “direita”, enquanto 78% se descreveram como “muito conservadores”. Entre os manifestantes, apenas 1% afirmou ser de “esquerda”, 3% não se encaixam nas opções fornecidas e 1% não soube definir seu posicionamento político.

Pesquisa USP sobre ato bolsonarista. | Foto: Divulgação