Discurso ‘nós contra eles’ é pretexto para viabilizar gastos no orçamento

06 julho 2025 às 12h52

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Na última semana, o governo de Lula da Silva (PT) investiu na comunicação divisiva, “nós contra eles”, em busca de apoio entre os mais pobres. Nesta fatia da população, a popularidade do presidente está em queda, segundo a última rodada do Datafolha. Em vídeos feitos com inteligência artificial publicados pelo PT e em declarações de Haddad na Convenção Tributária da ONU, o governo defendeu a taxação BBB (bilionários, bancos e bets). Nada mais justo. Mas…
Mas o discurso pode render efeito contrário ao esperado. Devido às “taxas das blusinhas” e aumento do IOF (ambos tributos serão pagos por todos, ricos e pobres), o governo é percebido como um que cobra muito e entrega pouco. Se a aprovação de novas taxações para as camadas mais ricas não significar alívio para os mais pobres, haverá sentimento de que o eleitor foi vítima de um engodo.
O discurso é ainda uma simplificação — culpar inimigos abstratos como os bancos é manobra antiga. Tendo o PT se tornado parte do establishment por ter estado no poder em cinco mandatos, a tentativa de se colocar ao lado do cidadão como vítima de injustiça tributária não é convincente. Ninguém irá defender bilionários, mas é possível que o eleitor entenda que eles foram apenas um inimigo imaginário usado como pretexto para viabilizar o arcabouço fiscal, com seus mecanismos estimuladores de gastos.
Em entrevista à Folha de S.Paulo publicada neste domingo, 6, o ex-presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que o atual governo vende a ideia de que o Estado é essencial para corrigir desigualdades, mesmo que isso prejudique a economia. “O crescimento é feito com dívida e aumento da carga tributária sobre as empresas. Isso reduz o investimento privado, limita a oferta futura de bens e serviços, e gera inflação estrutural, juros altos e baixa produtividade”, analisou.
Roberto Campos Neto tem razão ao dizer que, no longo prazo, essa abordagem leva à inflação e ao “Estado inchado, setor privado atrofiado e dívida pública insustentável”. A retórica de divisão — “ricos contra pobres” — para justificar medidas fiscais ainda tem o efeito de enfraquecer a credibilidade de órgãos como o Banco Central.